O projeto de lei complementar que cria o Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag), o PLP Nº 121/2024, de autoria do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), está deixando especialistas em contas públicas de cabelos em pé. Além disso, alguns governos estaduais que começaram a analisar o texto mais a fundo reconhecem que a proposta não é tão boa quanto o esperado, como é o caso de Goiás.
O PLP 121/2024 revisa os termos das dívidas dos estados e do Distrito Federal com a União firmadas desde 1997 para a inclusão do Propag, onde governadores poderão utilizar ativos, como as estatais, para abater o estoque da dívida. A proposta também prevê a criação de um fundo de equalização federativa que não está muito bem explicado e corre o risco de favorecer mais ainda os estados que não pagam em dia seus débitos.
De acordo com especialistas em contas públicas, o projeto jogará uma bomba fiscal considerável no colo do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, devendo enterrar de vez qualquer chance de equilíbrio das contas públicas no atual governo e nos futuros. Entre os problemas apontados, está a falta de contrapartida dos estados em relação ao ajuste fiscal e o fato de que alguns ativos estaduais podem gerar mais despesa para a União do que receita, se não forem privatizados.
Haddad tem evitado fazer comentários sobre o assunto, oficialmente. O chefe da equipe econômica apenas tem afirmado que o projeto "é diferente do que foi apresentado pela Fazenda e que é preciso conhecer melhor a proposta". Fontes da Esplanada, no entanto, reconhecem que a forma como Pacheco apresentou a proposta gerou mal-estar na pasta, porque o texto não passou pelo crivo da Fazenda, logo, não tem como tramitar no Congresso do jeito que está. Um economista próximo ao Senado destacou ainda que existe um risco de o governo, que está bastante desarticulado no Congresso, não conseguir barrar o avanço desse projeto.
Pelos cálculos de Felipe Salto, economista-chefe da Warren Investimentos, o impacto do Propag será de 2,4 ponto percentual do Produto Interno Bruto (PIB) sobre a dívida pública até 2023, ou seja, algo o equivalente a R$ 462,2 bilhões.
Saldo
Conforme dados do Tesouro, o saldo devedor dos 27 entes federativos é menos do que o dobro disso, pois somava R$ 772,3 bilhões. Apenas quatro estados (São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul) respondem por 89,4% desse montante. E o estado que deverá ser o mais beneficiado é o governado pelo bolsonarista Tarcísio de Freitas (Republicanos), com o maior volume de dívida com a União, de R$ 282,3 bilhões (36,5% do total).
"Esse programa está sendo para esses quatro estados", destacou o economista Manoel Pires, coordenador do Centro de Política Fiscal e Orçamento Público do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre). Ele reconheceu que essa proposta pode gerar insatisfação do ponto de vista dos estados, devido à questão do risco moral. "Quem paga em dia ou não tem dívida, não tem benefício", destacou.
Na avaliação da especialista em contas públicas e uma das autoras da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) Selene Peres Nunes, o projeto de Pacheco beneficia apenas o estado de São Paulo, que é o maior devedor da União, mas tem mais condições financeiras de arcar com as parcelas da dívida do que os outros superendividados e que estão com o pagamento dos juros suspensos pelo Regime de Recuperação Fiscal (RRF), como RJ, MG e RS. "A proposta é muito ruim e só ajuda quem não precisa ser ajudado e pode pagar mais, como é o caso de São Paulo. O texto do PLP consegue ser ruim até para os estados que estão no RRF. Parece que Pacheco leu o texto que os governadores enviaram para ele, mas não entendeu e não fez uma regra para atender o problema dos estados superendividados e que não conseguem se manter no Regime. Isso é ruim para o Tesouro Nacional também, é verdade, e ainda existe o risco moral nisso, porque tem a possibilidade de os juros serem zerados no Propag, que é uma possibilidade remota para quem está no Regime", afirmou Nunes.
Em nota, o governo de Goiás informou que "a proposta, em sua forma atual, não atenderá plenamente às necessidades do estado".
Procurada, a assessoria de Pacheco apenas disse que o senador mineiro "tem apoio de todos no estado (dele)".
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