Calvário lusitano

Lisboa — Quem pensa que, em países do primeiro mundo, o atendimento do setor público ao cidadão é top de linha deve viver a experiência de passar ao menos uma manhã num posto da Seguridade Social de Portugal. O órgão corresponde ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) do Brasil. Filas, gritos, confusões e polícia são frequentes nas agências. Não foi diferente ontem, no posto de Almada, região metropolitana de Lisboa.

Antes das 9h, horário em que as agências abrem, as filas já são enormes. Os que conseguiram quebrar as barreiras operacionais do site da Previdência para marcação de atendimento entram rápido, ainda que, a partir daí, a burocracia e o mau-humor da maior parte dos funcionários se tornem um teste de paciência e resiliência. Do lado de fora, os que não conseguiram ajuda da tecnologia levantam a voz e pedem o mínimo de compreensão. Têm coisas urgentes a resolver.

Dependendo de quem estiver fazendo a triagem na porta dos postos, o bom-senso prevalece e a entrada é liberada. Nada, porém, garante que as pendências serão resolvidas. Se o funcionário que estiver no balcão encrencar com qualquer vírgula, nada vai adiante. A desculpa é sempre a de que o regulamento não prevê aquilo. Portanto, que se marque um novo atendimento quando for possível.

No saguão de espera dentro da agência de Almada, o burburinho é grande. Queixas por todos os lados. Uma mulher com a filha de dois anos reclama que as senhas de prioridade acabaram. "Isso é um absurdo. Chame a chefe do posto que quero falar com ela", diz, em voz alta ao segurança. "Estive internada por quatro meses, preciso resolver a minha vida", enfatiza, batendo forte no balcão.

Discussão

Dois minutos depois, a chefe do posto aparece e pede que a mulher baixe o tom de voz. Neste momento, um policial chega e pede calma. Depois de muita discussão, a chefe do posto diz à mulher que abriria uma exceção e que ela seria atendida assim que possível. A mulher agradece, mas pede o livro de reclamações. Quer deixar registrado todo o seu descontentamento. A queixa vai se perder na burocracia.

O governo português reconhece que tem muito a melhorar no atendimento da Previdência Social, que perdeu um grande número de funcionários nos últimos anos. Apesar de todas as promessas, o reforço de pessoal ainda não se tornou realidade. Enquanto isso, cenas como a do posto de Almada continuarão corriqueiras. Os cidadãos que tenham paciência. É o que lhes resta.