Distrito Federal

Prejuízo mantido em segredo

BRB oculta números relativos à operação BRBCard, que acumula alta inadimplência. Especialistas veem manobra contábil

Os milhares de cartões de crédito concedidos pelo BRB a torcedores do Flamengo, por meio de a subsidiária integral da instituição, a BRBcard, se transformaram em um manancial de prejuízos. Dados mais recentes levantados pelo banco, mas que ainda não se tornaram públicos, apontam que o calote já passa de 50%. Ou seja, de cada dois clientes que têm os cartões com as marcas BRB e Flamengo, um está inadimplente. O banco, controlado pelo Governo do Distrito Federal, está sendo obrigado a cobrir os prejuízos.

Os dados, porém, estão guardados a sete chaves pela diretoria do BRB para não dar transparência ao péssimo negócio que foi a parceria fechada com o clube carioca, que recebeu adiantados da instituição, em forma de patrocínio, R$ 32 milhões. As informações vêm sendo questionadas por dois acionistas minoritários do BRB, a Associação dos Empregados do Banco de Brasília (AEBRB) e a Associação Atlética Banco de Brasília (AABR), conforme registros na ata das Assembleias Geral e Extraordinária realizadas em 29 de abril deste ano.

Segundo os minoritários, o BRB fechou o balanço de 2021 sem detalhar os números da BRBcard e da BRB Seguros. Por lei, a consolidação dos números é obrigatória, até para que se possa ter clareza da saúde financeira do grupo como um todo. Os mesmos acionistas questionaram o fato de os resultados do banco não terem passado pelo crivo dos auditores internos da instituição e pelo tema ter merecido um registro formal, mas lacônico, por parte da empresa de auditoria externa, a EY.

Maquiagem

A estratégia do BRB para não dar transparência aos números da BRBcard passou por uma manobra contábil que afastou os minoritários da estrutura acionária da empresa de cartões de crédito. Tanto a AEBRB quanto a AABR eram acionistas da BRBcard, que, por sua vez, controla a BRB Seguros. O comando do BRB propôs, então, que esses minoritários entregassem as ações que detinham na companhia de cartões e, em troca, receberiam papéis do banco. Essa operação fez com que o BRB passasse a deter 100% da BRBcard e, assim, ser desobrigado de prestar contas das informações relacionadas aos cartões, que só dão prejuízos.

"Trata-se de uma operação típica de quem não quer dar transparência a algo que está errado", diz um ex-dirigente do BRB. Ele ressalta que, como a parceria entre o banco e o Flamengo foi feita às pressas, não houve o controle necessário para que o negócio se desenvolvesse de forma tranquila. "Na ânsia de mostrar um sucesso que não existe, a BRBcard distribuiu cartões sem critério, sem avaliação correta do perfil dos clientes. Não à toa, os prejuízos estão se acumulando e ninguém sabe ao certo o tamanho das perdas", acrescenta.

A falta de transparência também incomoda no lado do clube carioca. Marco Assef, membro nato do Conselho Deliberativo do Flamengo, afirma que a operação é mal-sucedida. Ele lembra que a parceria não cumpriu a meta de lucro variável - no valor de R$ 64 milhões. Assef lembra que o time de futebol recebeu apenas R$ 32 milhões anuais, a título de patrocínio. "O banco digital é um fracasso", afirma Assef. Segundo ele, o negócio BRB-Flamengo constitui uma "prática antiética que falta com a transparência".

Na avaliação de um ex-participante do Conselho de Administração do BRB, se apresentasse as contas do BRBcard com clareza em seu balanço, certamente o resultado final do banco seria menor do que o anunciado. "A explicação é simples: como a inadimplência nos cartões é muito elevada, o BRB teria que aumentar muito as provisões para devedores duvidosos. E isso teria de ser abatido no lucro", explica. "Esse é o tipo de estratégia usada por empresas que querem maquiar os resultados", afirma. O ex-conselheiro ressalta, ainda, que, pelas regras do sistema financeiro nacional, a demonstração financeira da BRB Card no resultado do BRB é obrigatória. "A Comissão de Valores Mobiliários precisa ver isso", recomenda.

Quem acompanha de perto toda a parceria do BRB com o Flamengo garante que, da forma como o negócio está estruturado, não há como dar certo. Além do pesado índice de calote nos cartões, a conta digital se tornou alvo de fraudes com o Pix. Clientes de má fé perceberam as falhas nos sistemas de controle e começaram a realizar uma série de transações sem lastro. Eles faziam Pix programados para o dia seguinte. Mesmo sem ter a efetivação da transferência dos recursos, o BRB liberava o dinheiro nas contas dos beneficiários. Estima-se que as perdas com os falsos Pix ultrapassem os R$ 63 milhões.