Diplomacia econômica

BC suspende serviço após alta procura

Aceno da direção da entidade é comemorado pelo governo brasileiro, mas questões como corrupção, direitos humanos e política ambiental são obstáculos

No mesmo dia em que a Transparência Internacional lançou o ranking mundial de corrupção, em que o Brasil caiu duas posições — de 94ª para 96ª — e permaneceu com a pontuação de dois anos atrás, o ministro da Economia, Paulo Guedes, anunciou que a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) aceitou iniciar as negociações para o ingresso formal do país na entidade.

"Eles reconhecem a nossa importância em todas as negociações, e eu sempre enfatizava isso: nós vamos sempre ajudar, mas queremos também a ajuda de vocês. E esse reconhecimento vem agora", ressaltou Guedes, no Palácio do Planalto, ao lado do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, e o das Relações Exteriores, Carlos França.

"Estamos há mais de 30 anos tentando esse acesso. Mais de um terço dos requisitos legais foram preenchidos. Isso é expressivo. Nós já estávamos como uma grande potência emergente nos Brics, estávamos no G20, mas faltava essa dimensão, que estávamos perseguindo há muito tempo", afirmou o ministro da Economia. As negociações para o efetivo ingresso do país na organização, no entanto, devem durar alguns anos, segundo analistas.

Aa solicitação de entrada na entidade aconteceu em 2017, no governo de Michel Temer. Para ingressar na OCDE é exigido o alinhamento a 215 instrumentos de governança e o Brasil já atendeu a 103, apenas 37 no governo Bolsonaro.

De acordo com Richard Back, analista político da XP Investimentos, governos de esquerda não são propensos a entrar na OCDE, preferindo fazer parte de outras entidades, como a Organização Mundial do Comércio (OMC). "O governo de antes não queria e não fazia questão. Os governos que queriam se adaptaram e fizeram o lobby. O Brasil teve outros ganhos em relação à pauta econômica, teve uma presidência dentro da OMC, por exemplo. Preferia trabalhar para outras organizações. A continuidade na negociação veio da continuação do Marcelo Guaranys (secretario executivo da Economia] no governo", analisou.

Reformas

Ao anunciar o início das negociações, Guedes se comprometeu com a redução gradual da tributação do Imposto de Operações Financeiras (IOF) sobre fluxos internacionais. "Mandei uma carta à OCDE na semana passada, dizendo que cumprimos os últimos dois requisitos — econômicos — que faltavam. Eram a Lei Cambial, que o Congresso aprovou no ano passado, e a Receita Federal se comprometendo a reduzir o IOF sobre as operações financeiras", disse.

A advogada Anna Bastos, especialista e mestranda em direito e políticas públicas, observa que o país tem uma participação ativa na instituição como não membro, e desde 2017 pleiteia a sua inclusão efetiva. "O país é visto como um ator importante na economia globalizada e desempenha papel importante nas discussões sobre grandes temas internacionais, porém ainda precisa se adequar a alguns instrumentos legais da OCDE", pontuou.

De acordo com Bastos, para que o Brasil seja aceito como membro da OCDE deve haver, além do atendimento a instrumentos legais, um alinhamento de posições sobre os grandes temas internacionais. "Como exemplo, podemos citar a adoção de políticas ambientais mais rígidas com controle efetivo dos impactos causados ao meio ambiente e a consequente mitigação desses, e as questões tributárias, como a simplificação do sistema de cobrança de impostos. Além da estruturação e manutenção de instituições fortes e independentes capazes de investigar, julgar e punir de forma autônoma crimes de corrupção", explicou.

A Transparência Internacional mostrou que dentre os 126 países analisados quanto ao nível de corrupção, a pontuação do Brasil no tema é de 38, abaixo do G20 (média de 44) e de localidades da América Latina e Caribe (média de 41). Uma das principais justificativas para o resultado foi a postura do governo Bolsonaro.

"O Brasil passa por um processo de desmanche dos marcos legais e institucionais, que são leis que o país levou décadas para estabelecer", detalhou Bruno Brandão, diretor executivo do Transparência Internacional Brasil.

Para Brandão, o anúncio foi um gesto político e pragmático da OCDE. "O processo real de adesão é muito mais criterioso, e a conduta do governo afasta qualquer aprovação. A falta de proteção ao meio ambiente, dos direitos humanos afronta todos os valores e princípios da carta de adesão da entidade", disparou.