CONJUNTURA

Governo aposta na retomada

Ministério prevê alta de 8,3% do PIB no 3º trimestre e reduz estimativa de retração da economia em 2020. Injeção de R$ 110 bilhões com o auxílio emergencial e outros programas devem manter impulso à atividade no início de 2021

O Ministério da Economia melhorou as projeções para o Produto Interno Bruto (PIB) neste ano, mudando a expetativa de queda de 4,7% para 4,5%, e manteve em 3,2% a estimativa de crescimento em 2021. A pasta ainda minimizou as preocupações do mercado com o risco de uma segunda onda de covid-19, como a que vem atingindo a Europa.

As novas previsões da SPE estão em linha com as estimativas do mercado, que projeta queda de 4,6% no PIB deste ano. A pasta ainda prevê avanço de 8,3% no PIB do terceiro trimestre sobre os três meses anteriores, puxado por indústria (com alta de 11,3%) e serviços (8%). A projeção do órgão para a inflação deste ano passou de 1,8% para 3,13%. Para o ano que vem, a previsão é de 3,23%.

Na avaliação do secretário de Políticas Econômica, Adolfo Sachsida, “a retomada (da economia) está bastante endereçada”, porque há R$ 110 bilhões em recursos de auxílios emergenciais e de preservação de emprego que devem ser injetados na economia até janeiro de 2021. “Temos valores suficientes para garantir a tração e a retomada econômica”, disse. “Nossos dados mostram que vamos retomar em meados de dezembro a patamares pré-covid”, acrescentou.

Críticas
Os dados da SPE sobre o PIB e a declaração de Sachsida minimizando os riscos de uma segunda onda da covid-19 chamaram a atenção de especialistas, que sugeriram mais cautela. “É difícil afirmar que não vai ter segunda onda. E não existe base política para o país voltar aos níveis de isolamento de março e de abril. A sociedade não aceitaria. Basta andar pelas ruas e ver que muita gente não respeita as restrições atuais”, alertou o economista-chefe do Banco Alfa, Luis Otávio de Souza Leal. Para ele, o que vai determinar uma retomada mesmo é o avanço da produção de vacinas.

Na avaliação de Leal, o mais preocupante é a questão fiscal, que se resume no governo concluir o debate do Orçamento de 2021, que ainda nem começou no Congresso, que vai ou não permitir o rompimento do teto de gastos. “O risco fiscal é um ou zero. Não vai ter meio termo. Ou o governo faz um orçamento equilibrado, respeitando o teto, ou vamos ter uma nova crise financeira”, alertou. Para ele, o mercado ainda não está precificando o estouro do teto, mas “um aumento da possibilidade de isso acontecer”. “Caso isso ocorra, o dólar em R$ 6 vai ser o piso”, avaliou.

Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), considerou o cenário do governo “muito otimista”. “Os riscos são elevados. Há um problema que começa a preocupar no balanço de pagamentos, no câmbio e no lado fiscal. A inflação não alarma, por ora. Mas a questão da retirada de estímulos precisa ser melhor explicada”, afirmou.

Para Salto, o governo precisa ser mais claro sobre que rumos pretende tomar para evitar um cenário em que a dívida pública bruta continuará crescendo e ficando acima de 100% do PIB, pelo menos, até 2030. “O essencial é que se anunciem duas coisas: o que será feito do orçamento no ano que vem, com transparência, é um plano para reequilibrar a dívida a média prazo. Isso não há até agora. A situação se agrava de maneira preocupante”, destacou.

BC admite risco fiscal

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, reconheceu, ontem, que a piora nas contas públicas é um dos principais fatores de risco para a recuperação da economia daqui para frente. E também um dos motivos de desconfiança dos investidores, pois o Brasil é o país que tem uma das maiores taxas de dívida pública em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) entre os emergentes.

Durante evento realizado pela Federação Brasileiro de Bancos (Febraban), Campos Neto admitiu que a percepção de risco de investidores estrangeiros que saíram do país aumentou devido à questão fiscal, especialmente, diante dos ruídos políticos durante a pandemia e do questionamento sobre a manutenção do teto de gastos — emenda constitucional que limita o aumento das despesas à inflação. “O Brasil, claramente, sofreu uma deterioração devido às incertezas de que o teto não vai ser respeitado”, admitiu. “A saída de estrangeiros ficou mais concentrada na Bolsa, mas é preciso fazer com que esse movimento de entrada volte”, defendeu.

De acordo com o ministro, o aumento dos juros de títulos públicos de longo prazo mostra que o mercado vem cobrando cada vez mais prêmios de risco diante da piora do quadro fiscal. “O que preocupa o mercado é o volume de rolagem muito concentrado e o fato de o Tesouro ter de encurtar a dívida”, afirmou.

Ele reconheceu que a diminuição das incertezas depende de medidas para o controle efetivo do aumento dos gastos públicos. O aumento no desequilíbrio fiscal colocou o Brasil no grupo dos países em que o câmbio foi mais desvalorizado, ao lado de Turquia, África do Sul, México, Índia e Colômbia. “Esse grupo não teve uma recuperação muito boa e um dos fatores de diferenciação com os demais é exatamente o endividamento”, disse Campos Neto, lembrando que a dívida pública bruta do Brasil deve ficar entre 90% e 95% do PIB neste ano. (RH)