El Salvador

O que Bukele busca com a prisão midiática dos 261 deportados por Trump?

El Salvador recebeu 261 supostos criminosos deportados pelos Estados Unidos.

Esta foto de folheto divulgada em 16 de março de 2025 pela assessoria de imprensa da Presidência de El Salvador mostra a chegada de supostos membros da organização criminosa venezuelana Tren de Aragua ao Centro de Confinamento do Terrorismo (CECOT) na cidade de Tecoluca, El Salvador. Os Estados Unidos enviaram mais de 200 supostos membros de uma gangue venezuelana para serem presos em El Salvador, disse o presidente Nayib Bukele no domingo, depois que o homólogo americano Donald Trump invocou autoridades de guerra para expulsar migrantes.
       -  (crédito: EL SALVADOR'S PRESIDENCY PRESS OFFICE / AFP)
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Esta foto de folheto divulgada em 16 de março de 2025 pela assessoria de imprensa da Presidência de El Salvador mostra a chegada de supostos membros da organização criminosa venezuelana Tren de Aragua ao Centro de Confinamento do Terrorismo (CECOT) na cidade de Tecoluca, El Salvador. Os Estados Unidos enviaram mais de 200 supostos membros de uma gangue venezuelana para serem presos em El Salvador, disse o presidente Nayib Bukele no domingo, depois que o homólogo americano Donald Trump invocou autoridades de guerra para expulsar migrantes. - (crédito: EL SALVADOR'S PRESIDENCY PRESS OFFICE / AFP)

Com mãos e pés acorrentados, ajoelhados, empurrados por policiais e soldados fortemente armados: em uma exibição impressionante, El Salvador recebeu 261 supostos criminosos deportados pelos Estados Unidos.

O que o presidente Nayib Bukele busca ao prendê-los em sua megaprisão?

Golpe midiático 

Três aviões aterrissaram no domingo em El Salvador com 238 venezuelanos, supostos membros da organização criminosa Tren de Aragua, e 23 supostos integrantes salvadorenhos da gangue Mara Salvatrucha (MS-13).

Um vídeo de três minutos com trilha sonora de filme de ação, divulgado pela presidência, mostra o traslado dos detidos para a prisão de segurança máxima construída por Bukele em Tecoluca, a 75 km de San Salvador, entre flashes de câmeras oficiais e um grande aparato de patrulhas.

"São as mesmas produções a que o governo de Bukele já nos acostumou, transformando em espetáculo midiático suas violações de direitos humanos", afirmou à AFP Juan Pappier, subdiretor para as Américas da Human Rights Watch (HRW).

Desde que assumiu o poder em 2019, Bukele, um publicitário hábil na gestão de imagem e redes sociais, comunica as ações de seu governo com golpes de efeito. E ainda mais desde sua reeleição há um ano, no auge de sua popularidade devido à "guerra" contra as gangues, que reduziu a violência a mínimos históricos.

"A encenação é a instalação do medo para dissuadir", afirmou à AFP Marta Lagos, diretora da Latinobarómetro, com sede no Chile.

Os detidos vestiam shorts, camisetas e meias brancas. Guardas os forçaram a se agachar e inclinar o torso para entrar na prisão.

Já no passado, muitos dos 15 mil membros da MS-13 e da gangue rival Barrio 18 presos na megaprisão foram exibidos da mesma forma, em visitas planejadas para a imprensa.

Para Ingrid Escobar, diretora da ONG Socorro Jurídico Humanitário, a encenação equivale a uma demonstração de poder. "Bukele se vendeu ao mundo como 'o salvador' do país, quer se mostrar como o homem forte capaz de receber os piores criminosos", comentou à AFP.

"Grande amigo dos EUA"

Para enviar a El Salvador aqueles que chamou de "inimigos estrangeiros", o presidente Donald Trump invocou uma lei de guerra de 1798, embora um juiz tenha bloqueado a deportação pouco antes.

Sarcástico, Bukele publicou no X um emoji de riso, acompanhado da frase: "ops... Tarde demais".

Receber supostos membros do Tren de Aragua serve para "se mostrar como um aliado próximo dos Estados Unidos e obter o reconhecimento de Trump", opinou o politólogo Napoleón Campos.

Ao anunciar a chegada dos detidos, Bukele escreveu no X: "Seguimos avançando na luta contra o crime organizado. Mas desta vez, além disso, estamos ajudando nossos aliados".

As imagens foram "tendência mundial nas redes sociais", afirmou o especialista em criminologia Ricardo Sosa. E mostraram que os Estados Unidos reconhecem "a efetividade e eficiência do 'método Bukele'".

Ao agradecer a Bukele, o secretário de Estado americano, Marco Rubio, declarou que o salvadorenho "não apenas é o líder mais forte em segurança" na região, mas também "um grande amigo dos Estados Unidos".

"Bukele busca a validação de seu método extraconstitucional", que outros governantes poderiam querer replicar "se for aprovado por Trump", considerou Lagos.

- "Guantánamo centro-americano" -

Bukele fez sua oferta surpresa de receber "criminosos perigosos" enviados pelos Estados Unidos quando, em fevereiro, recebeu Rubio em sua casa, à beira de um lago.

Pappier considera "vergonhoso" que Bukele atue como "carcereiro de Trump" e estabeleça "uma espécie de Guantánamo centro-americano".

"É uma violação dos direitos humanos. Estamos diante de um momento de projeção internacional do pior para El Salvador, cuja imagem foi reduzida a uma prisão", afirmou Campos.

O Centro de Confinamento do Terrorismo (Cecot), construído para 40 mil detentos, é o símbolo da "guerra" de Bukele contra as gangues. Seus críticos afirmam que cerca de 8 mil inocentes estão entre os mais de 86 mil detidos desde 2022 sem mandado judicial, segundo organismos humanitários.

Segundo Campos, o que El Salvador e os Estados Unidos apresentam como "cooperação" é, na realidade, "uma compra de serviços carcerários".

Washington pagará 6 milhões de dólares (R$ 34,1 milhões) a El Salvador para manter cerca de 300 deportados encarcerados por um ano, uma "tarifa muito baixa" para os padrões americanos, disse Bukele. Mas isso ajudará a tornar "autossustentável" o sistema prisional salvadorenho, que custa cerca de 200 milhões de dólares anuais (R$ 1,13 bilhão), acrescentou.

"Qualquer país pode vir e dizer que quer fazer negócios com Bukele em relação às prisões. É um Estado carcerário", comentou Miguel Montenegro, presidente da ONG Comissão de Direitos Humanos de El Salvador (CDHES).

AFP
postado em 18/03/2025 20:09