Andriy Yernak, chefe de gabinete de Volodymyr Zelensky, foi incumbido pelo próprio presidente da Ucrânia de comandar um plano para resgatar as milhares de crianças sequestradas pelo Exército da Rússia desde o início da invasão à ex-república soviética, em 24 de fevereiro de 2022. A tarefa será complexa. Muitas delas sofreram o começo de um processo de aculturação e tiveram até mesmo novas identidades, depois de adotadas por famílias russas. Nesta terça-feira (14/1), Yernak foi entrevistado por um grupo de jornalistas brasileiros, por meio do aplicativo de videoconferência Zoom. O Correio entrevistou o assessor de Zelensky, que falou sobre o plano conhecido como "Bring Kids Back UA" ("Tragam os garotos de volta à Ucrânia"), sobre as crianças sequestradas e deportadas e sobre a guerra. Leia os principais tópicos abordados por Yernak.
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GUERRA ALÉM DAS FRONTEIRAS
"Esta guerra trouxe muito sofrimento para vários ucranianos e suas implicações vão muito além de nossas fronteiras. A guerra foi complicada pelos regimes do Irã, da Rússia e da Coreia do Norte. Sabemos que esses conflitos regionais fazem parte da guerra contra a democracia. Essas ambições imperialistas, essas agressões, também estão prejudicando o fornecimento de grãos ao mundo. Por isso, eles precisam do Irã e da Coreia do Norte."
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AS CRIANÇAS DA UCRÂNIA
"As crianças da Ucrânia são as que mais sofrem nas mãos desses agressores. A Rússia está destruindo as casas e roubando as crianças e a infância delas. Crianças também estão morrendo. São 1.736 crianças mortas. Mais de 3,8 mil escolas foram danificadas. Crianças foram deportadas à força. Há deportações e até mesmo execuções. Em territórios ocupados, a Rússia muda a cidadania e os nomes das crianças, falsificando suas origens. Como, por exemplo, Margarita Prakaperka, que foi roubada, adotada por um político e recebeu um novo nome. As crianças têm medo de perder acesso à infância. É uma tentativa calculada de apagar a identidade nacional. Essas crianças estão, também, sendo privadas de seu idioma e de sua cultura."
COMO MAPEAR AS CRIANÇAS DESAPARECIDAS
"Nós não sabemos exatamente o número de crianças que foram deportadas. Estamos conversando com diferentes fontes. Pelo menos 20 mil crianças foram deportadas, de maneira ilegal, da Ucrânia durante esses três anos. Pelo menos em 90% dos casos os russos tentaram mudar a identidade das crianças. Infelizmente, este é um problema do mundo. Não temos organizações internacionais capazes de compartilhar essa informação e que saibam como fazê-lo. Precisamos que essas crianças retornem à Ucrânia. Por isso, estamos criando um grupo de especialistas de diferentes níveis para termos recomendações que possam ser utilizadas pelo mundo. Há outros países passando por essa mesma situação."
CONCESSÕES TERRITORIAIS
"O presidente Zelensky nunca fará nenhuma negociação para reconhecer territórios ocupados. Isso é 100% certo de que não acontecerá. Mas o que sempre dissemos... Compreendemos que essa guerra leva dez anos. Devolver todos os territórios imediatamente não é realista. Mas nunca reconhecemos nenhuma ocupação ou anexação."
Saiba Mais
O PAPEL DO BRASIL
"O Brasil é um dos líderes globais na manutenção da paz e da justiça. Esse compromisso é reconhecido mundialmente. As decisões que são tomadas e a dedicação para manter a lei e a justiça... Infelizmente, o Brasil não convidou o nosso presidente para ir a Brasília. E acho que isso foi erro não convidá-lo para a cúpula do G20, no Rio. O Brasil tem papel vital na proteção dos direitos humanos. Para assegurar a estabilidade mundial. Isso inclui trazer de volta, para a Ucrânia, as crianças roubadas. Muito concretamente, o que o Brasil pode fazer? Pode engajar em mediação com os russos para nos ajudar para que as crianças voltem para suas casas. Também fazer parte da coalizão Bring Kids Back UA. A voz do Brasil é importante para lidar com a Rússia. E tem oportunidade de mostrar liderança por conta do que ocorre no mundo. Há uma fórmula da paz, apresentada pelo presidente Zelensky há mais de dois anos, durante a cúpula do G20, em Bali. O apoio do Brasil nesse esforço humanitário é extremamente importante. Finalmente, a liderança brasileira pela paz e pela justiça pode impactar não apenas a Ucrânia, mas também essa luta pela democracia e os direitos humanos. Unidos, podemos proteger as crianças no mundo todo contra as agressões. Respeitamos muito o seu país. Queremos ter amigos parceiros, uma relação com o Brasil. Este é o momento de trabalharmos nessa relação. O Brasil é uma das maiores democracias do mundo e respeita a Carta da ONU. A nossa fórmula da paz se baseia no direito internacional."
TRUMP E A GUERRA NA UCRÂNIA
"Precisamos conversar sobre como restaurar a integridade territorial completa da Ucrânia, com as fronteiras reconhecidas. Com relação ao novo governo dos Estados Unidos, houve uma reunião fechada entre o presidente Zelensky, o presidente Emmanuel Macron e o então candidato Donald Trump, em Paris. O presidente eleito Trump compreende quem é a vítima e quem é o agressor. Também entende que a paz é muito importante. Trump apoia, e repetiu que é necessário termos paz. Estamos aguardando 20 de janeiro. Acredito que a consulta real começará depois da posse. Em breve, teremos uma reunião entre os presidentes Trump e Zelensky. Esperamos uma posição em conjunto sobre como terminar com a guerra."
VLADIMIR PUTIN
"Putin começou essa guerra. É uma pessoa louca, que não respeita o direito internacional, nem os direitos das crianças e das pessoas. É necessário que o Brasil compreenda que eles também não respeitam vocês. Se eles tiverem 1% de possibilidade, vocês verão a face real deste Estado terrorista."
RISCO NUCLEAR
"Todos nós queremos a ordem internacional segura. No mundo com preocupações pelas armas nucleares, existe um risco grande se não se restaura a lei internacional na Ucrânia. Para nós, é importante terminarmos com essa guerra. Mas é importante para vocês também. Se você tem armas nucleares, você tem a segurança real. Isso é muito perigoso. Podemos ter novos conflitos, não apenas na Europa, mas na América do Sul e no Oriente Medio. É importante que as democracias estejam juntas."
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