Venezuela

Sem atas, Maduro fecha fronteiras e toma posse na Venezuela

Ditador presta juramento ante a Assembleia Nacional, de maioria chavista, para mais seis anos de governo. Oposição denuncia golpe de Estado e promete libertar país. EUA oferecem US$ 25 milhões de recompensa por captura de chavista

Antes de tomar posse para mais seis anos à frente do Palácio de Miraflores, Nicolás Maduro ordenou o fechamento das fronteiras com a Colômbia e o Brasil e denunciou uma "conspiração internacional". Por volta de meio-dia (13h em Brasília) desta sexta-feira (10/1), o ditador prestou juramento diante de Jorge Rodríguez, presidente da Assembleia Nacional (chavista), mesmo sem exibir as atas das eleições de 28 de julho. "Digam o que quiserem dizer, façam o que quiserem fazer, mas essa posse constitucional (...) não poderia ser impedida e é uma grande vitória para a democracia venezuelana (...). Paz, paz, paz. Não conseguiram e não conseguirão", declarou Maduro, que disse ser alvo de uma "conspiração" dos EUA e seus satélites e escravos na América Latina e no mundo".

Maduro fechou a fronteira entre Venezuela e Brasil, em Pacaraima (RR), na manhã desta sexta-feira, e deve mantê-la intransitável até segunda-feira (13/1). A oposição denunciou um "golpe de Estado" e descartou o retorno imediato a Caracas de Edmundo González Urrutia, ex-diplomata que reivindica a vitória nas urnas.

A comunidade internacional reagiu com a imposição de sanções e o aumento de recompensa pela captura de Maduro. Os Estados Unidos decidiram pagar US$ 25 milhões (cerca de R$ 152 milhões) a quem fornecer informações que levem à prisão de Maduro e do ministro do Interior, Diosdado Cabello. O governo de Joe Biden prorrogou por 18 meses a proteção migratória que concede residência e permissão de trabalho aos venezuelanos nos Estados Unidos.

Ao chamar a posse de "farsa", impôs sanções a oito altos funcionários venezuelanos, incluindo o presidente da petrolífera PDVSA, o ministro dos Transportes e o chefe da Conviasa, a companhia aérea estatal. O Reino Unido considera "fraudulenta" a reivindicação de poder por parte de Maduro. "O resultado das eleições de julho não foi livre nem justo e seu regime não representa a vontade do povo venezuelano", reagiu a chancelaria britânica, ao anunciar sanções contra 15 funcionários de alto escalão do regime da Venezuela.

A posse de Maduro contou com a presença de representantes do Partido dos Trabalhadores (PT) e do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), e dos presidentes Daniel Ortega (Nicarágua) e Miguel Díaz-Canel (Cuba). Em nota conjunta, os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva (Brasil) e Emmanuel Macron (França) instaram Maduro a "retomar o diálogo". 

Autocoroação

Edmundo González fez um pronunciamento à nação às 19h desta sexta-feira. "Hoje, em Caracas, Maduro violentou a Constituição e a vontade soberana dos venezuelanos. (...) Consuma um golpe de Estado e se autocoroa um ditador. O povo não o acompanha, nem nenhum governo que se respeite como democrático", afirmou o ex-diplomata. Ele reafirmou que representa a vontade de quase 8 milhões de venezuelanos. "Muito em breve, conseguiremos entrar na Venezuela e colocaremos fim a essa tragédia", prometeu.

Ele revelou estar "muito perto" da Venezuela e pronto para a entrada segura no território e enviou um recado às Forças Armadas. "Como comandante-em-chefe, ordeno ao Alto Comando Militar desconhecer ordens ilegais dadas pelos que confiscam o poder e preparar as condições de segurança para assumir o cargo de presidente da República", acrescentou Urrutia.

X/Reprodução - María Corina Machado: "Maduro não poderá governar pela força uma Venezuela que decidiu ser livre"

Também em vídeo, cuja divulgação foi atrasada pela interrupção das redes sociais na Venezuela, a líder opositora María Corina Machado declarou que "a liberdade está próxima" e condenou a posse de Maduro. "Hoje, Maduro consolida um golpe de Estado. Frente aos venezuelanos e ao mundo, decidiram cruzar a linha vermelha que oficializa a violação da Constituição Nacional", afirmou. Ela disse que, com o ato de ontem, Maduro colocou um grilhão no próprio tornozelo, que será apertado cada vez mais. "A partir de hoje, a pressão se intensificará, até fazermos Maduro entender que isso acabou." A opositora denunciou a detenção de mais de 20 aliados, na quinta-feira (9/1). 

María Corina descartou um retorno imediato a Caracas de Edmundo González Urrutia, o ex-diplomata que reivindica vitória nas eleições de 28 de julho passado. "Ele virá à Venezuela para tomar posse como presidente constitucional da Venezuela no momento certo, quando as condições forem adequadas", esclareceu. "Não é conveniente que Edmundo entre hoje na Venezuela, pedi que ele não o faça porque sua integridade é fundamental para a derrota final do regime e a transição para a democracia."

Ex-presidente autoproclamado da Venezuela e ex-líder da Assembleia Nacional, o opositor Juan Guaidó — hoje exilado nos Estados Unidos — lembrou ao Correio que a recompensa prometida pelo governo Biden é "a mais alta da história". "Ela equivale à recompensa anunciada pela captura de Osama bin Laden (líder da Al-Qaeda). Os EUA equiparam Maduro a um terrorista, o que ele é. Isso é parte de medidas diplomáticas passíveis de serem exercidas pelo Estado de direito para responsabilizar a ditadura", avaliou Guaidó. De acordo com ele, a decisão de Washington pode acelerar a mudança de regime. 

Líder político da oposição que acompanhou María Corina Machado no protesto de quinta-feira, em Chacao, Juan Pablo Guanipa destacou as fortes sanções anunciadas pelos EUA, Reino Unido, União Europeia e Canadá. "Houve uma manifestação importante, de distintos setores do mundo, para insistir em que Maduro é um presidente espúrio, um ditador", afirmou ao Correio

Para Guanipa, depois da posse desta sexta-feira, Maduro sairá bastante enfraquecido, e enfrentará o repúdio do povo venezuelano, além do desconhecimento da comunidade internacional."Ao dizer que seu juramentorepresenta um triunfo da democracia, ele se mostra absolutamente cínico e falso. Maduro é um ditador, uma vergonha para a Venezuela e para o mundo democrático. Não tem espírito democrático. Ele sabe que perdeu nas eleições de 28 de julho, apesar de ter feito todo o possível para destruir esse processo. Desconheceu as primárias, impediu que María Corina fosse candidata,proibiu os partidos políticos, impediu que 5 milhões de venezuelanos pudessem votar, torpedeou toda a campanha eleitoral. Apesar de tudo isso, perdeu por 37 pontos percentuais de diferença", acrescentou.

Ainda de acordo com Guanipa, a oposição comprovou o triunfo, ao apresentar 85% das atas eleitorais. "Maduro tomou de assalto o poder, mostrou um boletim falso do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) e uma sentença espúria do Tribunal Supremo de Justiça. A posse dele, hoje, foi uma mentira. É um ato totalitário, o qual será combatido pelo povo", assegurou.

EU ACHO...

Federico Parra/AFP - Juan Pablo Guanipa, líder político da oposição, deputado desde 2015 (atualmente afastado) e ex-primeiro vice-presidente da Assembleia Nacional

"A oposição se declara em resistência pacífica, em luta não violenta, em desobediência civil. Isso é o que a oposição fará a partir de agora. Considero muito difícil que Edmundo González possa chegar ao país nessas circunstâncias, mas o importante é que a nação venezuelana está disposta a lutar para que se reivindique a democracia e a liberdade na Venezuela. Para tanto, temos obrigação de exercer pressão interna e internacional, além de ações que prejudiquem as bases que sustentam Nicolás Maduro no poder. É uma luta dura, mas nós liberaremos a Venezuela."

Juan Pablo Guanipa, líder político da oposição, deputado desde 2015 (atualmente afastado) e ex-primeiro vice-presidente da Assembleia Nacional 

DUAS PERGUNTAS PARA...

Federico Parra/AFP - JUAN GUAIDÓ, líder opositor, ex-presidente autoproclamado da Venezuela e ex-líder da Assembleia Nacional
Maduro disse que sua posse é "a vitória da democracia". Como vê isso?

Nicolás Maduro consolida um golpe de Estado. É um usurpador. É a segunda eleição que rouba em seis anos. Ele o havia feito em 2018. Hoje, necessitamos do apoio da comunidade internacional. Não pode ser uma vitória perder uma eleição; prender mil pessoas; sobrecarregar o continente, com 8 milhões de refugiados. 

 

Quais os próximos planos da oposição?

Temos escutado María Corina Machado exercer com coragem o papel de líder da oposição, assim como Edmundo González Urrutia, o presidente eleito da Venezuela. Ele prometeu regressar à Venezuela de maneira segura, a fim de exercer o seu mandato. Temos que trabalhar com o apoio da comunidade internacional e com a valente mobilização dos venezuelanos, para que Edmundo possa retornar com segurança ao país e não simplesmente se tornar um troféu de uma ditadura, a qual tem demonstrado a possibilidade de detenções, de assassinatos políticos, de censura e de perseguição, entre outras coisas. (RC)

 

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Federico Parra/AFP - Former Deputy of the National Assembly of Venezuela, Tomas Guanipa looks on during a protest called by the opposition on the eve of the presidential inauguration in Caracas on January 9, 2025. Venezuela is on tenterhooks facing demonstrations called by both the opposition and government supporters. Machado emerged from hiding to lead protests in Caracas against the swearing-in of Nicolas Maduro for a highly controversial third term as president. (Photo by Federico PARRA / AFP)
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