Venezuela

Posse de Maduro reforça isolamento da Venezuela

Após os Estados Unidos anunciarem recompensa de US$ 25 milhões pela prisão de Nicolás Maduro, Álvaro Uribe, ex-presidente da Colômbia, pede intervenção militar contra o regime. Países intensificam críticas ao chavista

União Europeia e Reino Unido também se manifestaram contra a reeleição, deixando o presidente com poucos aliados  -  (crédito:  AFP)
União Europeia e Reino Unido também se manifestaram contra a reeleição, deixando o presidente com poucos aliados - (crédito: AFP)

O clima de incerteza prossegue na Venezuela após a posse de Nicolás Maduro, na última sexta-feira, para governar o país por mais seis anos. O chavista assumiu oficialmente o terceiro mandato consecutivo em uma cerimônia marcada pela divisão política interna e forte repercussão no exterior. Com a nação atravessando uma crise política, econômica e social prolongada, a posse gerou uma série de reações tanto de aliados quanto de opositores no cenário internacional.

No poder desde 2013, Maduro foi proclamado vencedor nas eleições presidenciais de 2024 com 51,2% dos votos, segundo a autoridade eleitoral venezuelana. No entanto, a oposição, representada, principalmente, por María Corina Machado e Edmundo González Urrutia, o autoproclamado vencedor, denunciou fraude no processo eleitoral, uma vez que Maduro não apresentou as atas com o resultado das votações. 

Antonio Ledezma, ex-prefeito de Caracas, ex-preso político e coordenador do Conselho Político Internacional de María Corina Machado, afirmou ao Correio que Maduro "enforcou-se com a faixa presidencial". "Edmundo González tem as atas eleitorais que comprovam sua vitória. Maduro sabe que as atas que esconde representam, para ele, a derrota. Ele foi derrotado com ampla vantagem e atropelou não apenas a Constituição nacional, mas a soberania popular, que é algo inegociável", explica. 

Em vídeo divulgado nas redes sociais, González denunciou o "golpe de Estado" e desafiou o presidente a entregar o poder àqueles que, segundo ele, realmente venceram a disputa. "Estou muito perto da Venezuela, pronto para o ingresso seguro e farei valer os votos que representam a recuperação da nossa democracia", afirmou Urrutia, em um apelo claro à intervenção militar.

Apesar das ameaças da oposição, a consumação da posse deixou claro que Maduro ainda detém o poder político no país. "Há indícios de que a oposição tentou negociar com as Forças Armadas e outros setores da sociedade, mas isso claramente fracassou. Inclusive, a tentativa de ingressar com Edmundo González no território venezuelano, como declarou María Corina, não teve sucesso, mostrando como a máquina chavista está em pleno funcionamento", afirma Carolina Silva Pedroso, professora do Departamento de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Nesse contexto, a especialista afirma não haver sinais de uma possível reversão do cenário. "O momento crucial já passou, que foi a posse, e ela não foi impedida. Não vimos nenhum sinal de ruptura das Forças Armadas, e não consigo ver nenhuma mudança nas condições que poderiam permitir que ele fosse destituído e mudasse o jogo. Como houve uma hegemonia do governo nesse momento, não vejo o que poderia levar ao aumento das tensões. Talvez, uma mobilização popular, mas os últimos acontecimentos foram um balde de água fria nessa expectativa", frisa.

Repercussão

A crítica à legitimidade do novo mandato de Maduro também se intensifica na política internacional. A questão tem gerado divisões entre os países da América Latina e potências globais. Os Estados Unidos, por exemplo, chamaram a posse de "farsa" e aumentaram a recompensa por informações sobre Maduro, oferecendo até US$ 25 milhões de dólares por sua captura. Além disso, o governo dos EUA impôs novas sanções, atingindo figuras-chave do regime, incluindo o ministro do Interior, Diosdado Cabello, e o presidente da estatal Petróleos de Venezuela, Héctor Obregón.

A União Europeia também não reconhece a posse, alegando que Maduro não tem legitimidade democrática. O Reino Unido seguiu a mesma linha, qualificando as eleições de 2024 como fraudulentas e impondo sanções a 15 membros do alto escalão do governo venezuelano. As ações demonstram um movimento internacional de pressão sobre o regime de Maduro.

Na contramão, a Rússia, tradicional aliada da Venezuela, expressou apoio incondicional a Maduro. O presidente Vladimir Putin felicitou o líder venezuelano por meio do presidente da Duma, Vyacheslav Volodin, destacando a importância da posse para a "democracia venezuelana".

Já o governo brasileiro, por meio do Itamaraty, expressou preocupação com as denúncias de violações de direitos humanos na Venezuela, especialmente no contexto das eleições de 2024. Embora o país tenha reconhecido os gestos de distensão por parte de Maduro, como a liberação de prisioneiros políticos, também criticou as recentes prisões e perseguições a opositores.

"A repercussão internacional é a continuação dos posicionamentos que os países vêm adotando desde a eleição de julho de 2024, com as alianças que o governo de Nicolás Maduro tinha bem estabelecidas com potências, como China, Rússia e países não ocidentais, como a Turquia e o Irã, que se mantiveram. Inclusive, todos esses países enviaram representantes diplomáticos para a posse, assim como outros regimes na América Latina, com destaque para Cuba e Nicarágua, que foram os únicos chefes de Estado que compareceram à cerimônia", detalha Carolina Pedroso.

Manifesto vizinho

 Seguidores de Uribe apoiaram seu pedido para a derrubada de Maduro do poder
Durante discurso de Álvaro Uribe ontem, em Cúcuta, na Colômbia, multidão levantou cartazes contra Maduro e a favor de María Corina e Edmundo González (foto: AFP)

Em apoio a Edmundo González e María Corina, o ex-presidente da Colômbia Álvaro Uribe acusou, ontem, o regime chavista de ser uma "tirania" e criticou duramente a perseguição a líderes opositores. Em discurso realizado em Cúcuta, cidade colombiana próxima à fronteira com a Venezuela, Uribe se posicionou contra a posse, pedindo enfaticamente uma intervenção militar internacional para "desalojar a ditadura" e restaurar a democracia na Venezuela.

Por outro lado, a falta de ação por parte do atual governo colombiano, presidido por Gustavo Petro, também tem sido criticada. Embora Petro tenha restabelecido as relações diplomáticas com Caracas no início do mandato, ele tem sido acusado de não condenar as ações de Maduro. 

Segundo Carolina Pedroso, uma intervenção externa não seria simples de ser aprovada. "Há uma grande reticência da comunidade internacional em aprovar intervenções desse tipo, já que trazem riscos significativos e não garantem uma solução eficaz para a crise venezuelana", conclui a especialista.

Isabella Almeida
Marina Rodrigues
postado em 12/01/2025 06:01
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