Ele personificou a própria extrema-direita francesa e não se furtou em dar declarações provocadoras, de viés antissemita e anti-imigratórias. Jean-Marie Le Pen, o fundador do partido Frente Nacional, em 1972, morreu ontem, aos 96 anos. O histórico político estava em uma casa de repouso em Garches, a oeste de Paris, há várias semanas por causa de sua saúde debilitada, e faleceu ao meio-dia desta terça-feira (8/1) (8h em Brasília), cercado por sua família. Em quase um século de vida, jamais demonstrou arrependimento por seus excessos. E eles começaram bem cedo.
No fim da década de 1960, no momento em que a Segunda Guerra Mundial ainda permanecia no imaginário dos franceses, Le Pen foi condenado por apologia a crimes de guerra por ter publicado um disco com músicas do Terceiro Reich de Adolf Hitler. Para justificar a postura antissistema e as afirmações controversas, ele gostaria de afirmar que era "um homem livre". "esde as câmaras de gás descritas como "um detalhe na história da Segunda Guerra Mundial" (1987) até a "desigualdade das raças" (1996), passando pela agressão a uma rival socialista (1997), acumulou diversas condenações.
Em 2002, Le Pen esteve muito perto de chegar ao Palácio do Eliseu e chocou o planeta ao chegar ao segundo turno das eleições presidenciais. O avanço da Frente Nacional esbarrou na derrota para o conservador Jacques Chirac, depois de multitudinárias manifestações contra a extrema-direita naquele ano. Ontem, o presidente Emmanuel Macron afirmou que "corresponde à história julgar" Jean-Marie Le Pen.
Nascido em 20 de junho de 1928, em La Trinité-sur-Mer, no oeste da França, Jean-Marie era filho de um pescador que morreu quando ele tinha 14 anos. Estudou direito em Paris, onde se dedicou ao ativismo. No serviço militar, foi paraquedista da Legião Estrangeira e combateu na então colônia francesa da Indochina. A carreira política iniciou-se em 1956, como o deputado mais jovem da Assembleia Nacional. Dezesseis anos depois, fundou a Frente Nacional.
Populismo
De acordo com Jean-Yves Camus, pesquisador do Observatório das Políticas Radicais da Fundação Jean Jaurès, em Paris, Le Pen será lembrado como "o homem que foi capaz, graças ao talento como orador e populista, de reavivar a extrema-direita francesa". "Isso quando todos os cientistas políticos e historiadores diziam que ela estava morta, por causa da Segunda Guerra Mundial. Ele também será recordado como o homem que compreendeu, no fim dos anos 1970, que a imigração se tornaria um tema quente na política doméstica francesa", disse ao Correio. "Para ele, a imigração era o principal assunto. Le Pen seguia repetindo que tudo o que ocorre de negativo é culpa da imigração, até que, eventualmente, um segmento dos eleitores passou a acreditar nele."
Camus admite que o Reagrupamento Nacional tornou-se uma das forças políticas mais potentes da França. "Isso se deve ao fato de que Marine Le Pen foi esperta o bastante para compreender que declarações antissemitas e racistas de seu pai tornaram impossível ao partido chegar ao poder. Ela mudou a linguagem do partido em muitos assuntos. No entanto, ainda existe uma relutância por parte da maioria dos franceses em elegê-la como presidente", observou o estudioso. Ainda segundo ele, muitos franceses temem que a instabilidade divida o país, caso Marine seja eleita.