Após quase uma década à frente do governo canandense, Justin Trudeau anunciou, nesta segunda-feira (6/1), sua renúncia à liderança do Partido Liberal e ao cargo de primeiro-ministro. Aclamado nos primeiros anos de mandato, o premiê, de 53 anos, tornou-se profundamente impopular entre os eleitores ao longo do tempo por uma série de fatores, incluindo o aumento do custo de alimentos e moradia.
A situação se agravou nas últimas semanas, com a proximidade das eleições gerais, que devem ser realizadas até outubro, e com os liberais atingindo os níveis mais baixos nas pesquisas de intenção de votos. "Vou renunciar depois que o partido eleger seu próximo líder", disse Trudeau a jornalistas na capital, Ottawa.
No pronunciamento, o premiê demissionário informou que os trabalhos no Parlamento, que deveriam ser retomados no próximo dia 27, ficarão suspensos até 24 de março. O movimento permitirá uma corrida pela liderança de seu partido
"O Partido Liberal do Canadá é uma instituição importante na história do nosso grande país e democracia. Um novo primeiro-ministro e líder do Partido Liberal levará seus valores e ideais para a próxima eleição", assinalou, acrescentando: "Estou ansioso para ver esse processo se desenrolar nos próximos meses."
Ainda não se sabe por quanto tempo o primeiro-ministro permanecerá no cargo interinamente. Trudeau disse que a disputa pela liderança liberal será "um processo competitivo sólido em nível nacional". Nesse cenário, ele continuará governando o Canadá quando o presidente eleito dos Estados Unidos, o republicano Donald Trump, voltar ao poder, no próximo dia 20.
Fusão
Trump, por sinal, aproveitou a renúncia de Trudeau para insistir em sua insólita proposta de incorporação do Canadá aos Estados Unidos. Poucas horas após Trudeau anunciar a renúncia, o magnata republicano voltou a usar sua conta na Truth Social para reforçar a ideia.
"Se o Canadá se fundisse com os EUA, não haveria tarifas, os impostos cairiam muito e eles, os canadenses, estariam TOTALMENTE SEGUROS da ameaça dos navios russos e chineses que os cercam constantemente. Que nação seríamos juntos!!!!", postou o presidente eleilto.
Nas palavras de Trump, muitas pessoas "amariam" que o Canadá fosse o 51º estado norte-americano. "Os Estados Unidos não podem mais sofrer com os enormes deficits comerciais e subsídios que o Canadá precisa para se manter à tona. Justin Trudeau sabia disso e renunciou", assinalou.
O magnata republicano ameaçou impor tarifas de 25% sobre todos os produtos canadenses se o governo não coibir o que ele chama de fluxo de migrantes e drogas nos EUA. O Canadá é um grande exportador de petróleo e gás natural para os EUA, que também depende de seu vizinho do norte para aço, alumínio e automóveis.
Rejeição
O apoio de Trudeau dentro do Partido Liberal veio diminuindo durante grande parte do ano passado, mas caiu ainda mais após a renúncia surpreendente de sua ex-ministra das Finanças e vice-primeira-ministra Chrystia Freeland.
Em uma dura carta de renúncia, ela acusou o premiê de se concentrar em manobras políticas para apaziguar os eleitores ao invés de estabilizar as finanças do país antes da chegada das tarifas alfandegárias prometidas por Trump.
A imprensa canadense tem apontado Freeland como uma possível candidata a liderar o Partido Liberal ao lado do ex-governador do Banco da Inglaterra, Mark Carney, um canadense que também chefiou anteriormente o Banco do Canadá.
Lori Turnbull, professora de ciência política na Universidade de Dalhousie, disse que tradicionalmente uma disputa pela liderança liberal levaria de quatro a seis meses, mas, desta vez, "tem que ser mais rápidos que isso". "Se não tiverem um novo líder para as próximas eleições, então, não faz sentido", disse Turnbull à agência de notícias France Presse (AFP).
Os liberais de Trudeau estão muito atrás nas pesquisas frente aos conservadores da oposição e sobreviveram por pouco a três moções de censura no Parlamento no fim do ano passado. Nas sondagens, o primeiro-ministro está mais de 20 pontos atrás de seu adversário conservador, Pierre Poilievre.
Aparentemente, não houve surpresas com a decisão de Truedeau. "Tenho a impressão de que é um certo alívio, não só por mim, mas também por ele, porque tinha um grande peso nos ombros", disse Annette Sousa, moradora de Ottawa. Rob Gwett, residente em Toronto, preferiria que Trudeau convocasse eleições e acredita que deveria ter saído há muito tempo "por causa dos escândalos".
Quando assumiu o cargo, no fim de 2015, o premiê era considerado um líder moderno, feminista, progressista e preocupado com os desafios ambientais. Filho do carismático ex-primeiro-ministro Pierre Elliott Trudeau, ele fez do Canadá o segundo país do mundo a legalizar o consumo de maconha, introduziu a eutanásia, impostos à emissão de carbono, entre outros feitos. Também iniciou uma investigação pública sobre mulheres indígenas desaparecidas ou mortas.