ORIENTE MÉDIO

Guerra na Síria: Aleppo é tomada por rebeldes contra regime de Bashar al-Assad

Após 13 anos, conflito ganha novo capítulo com jihadistas e rebeldes dominando a maior parte de Aleppo, a segunda maior cidade do país, contra o governo. Toque de recolher foi decretado neste sábado (30/11)

Deflagrada em 2011, a guerra na Síria se intensificou com a tomada de grande parte da cidade de Aleppo, a segunda maior do país, por forças jihadistas e rebeldes. Segundo o Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH), mais de 320 pessoas foram mortas desde o início da ofensiva, na quarta-feira (27/11), vítimas de combates entre as forças do regime de Bashar al-Assad, apoiado pelo Irã e pela Rússia, e grupos da oposição, como o Hayat Tahrir al-Sham (HTS), ex-filial da Al Qaeda, e facções aliadas.

A partir do ataque às províncias de Idlib e Hama, foram tomadas grandes áreas e dezenas de vilarejos estratégicos sem resistência das forças locais. Em Aleppo, às 17h de ontem (11h em Brasília), os rebeldes impuseram toque de recolher de 24 horas "para garantir a segurança dos residentes". "A maioria dos civis permanece em suas casas, e as instituições públicas e privadas estão quase todas fechadas", informou a rádio oficialista Sham FM.

Em meio à ofensiva, o presidente da Síria afirmou neste sábado (30/11) que, com apoio, seu país é capaz de derrotar os terroristas: "A Síria continua defendendo sua estabilidade e integridade territorial contra todos os terroristas e seus apoiadores e é capaz, com a ajuda de seus aliados e amigos, de derrotá-los e eliminá-los, independentemente da intensidade de seus ataques", declarou Assad ao chefe de Estado dos Emirados Árabes Unidos.

O OSDH informou que os militantes do HTS e seus aliados conquistaram prédios governamentais, prisões e até o aeroporto internacional da cidade, após a retirada das forças de Assad. "As linhas do regime colapsaram a uma velocidade impressionante, surpreendendo a todos", afirmou à Agence France-Presse Dareen Khalifa, especialista do International Crisis Group. Os rebeldes desfilaram pela cidade, instalaram sua bandeira em frente a uma delegacia de polícia e rasgaram um retrato do presidente sírio.

AFP - Outdoor com a imagem do presidente sírio Bashar al-Assad e a bandeira nacional foi rasgado por manifestantes contrários ao governo, em Aleppo

Irã reage

A ONG relatou também que, durante a madrugada, aviões de guerra russos bombardearam Aleppo pela primeira vez desde 2016, quando o regime reconquistou a cidade com ajuda militar de Moscou. Ontem à tarde, "pelo menos 16 civis morreram e outros 20 ficaram feridos quando aviões de guerra, provavelmente russos, atacaram veículos civis" em uma rotatória da cidade, publicou a OSDH.

A expansão dos rebeldes também atingiu o Irã, que denunciou o ataque de "elementos terroristas" contra seu consulado em Aleppo. O governo iraniano anunciou que seu ministro das Relações Exteriores, Abbas Araghchi, irá hoje a Damasco, capital da Síria, para conversar com as autoridades locais e coordenar ações de apoio a Assad.

Durante conversa com seu par russo Sergei Lavrov, Araghchi insistiu na "necessidade de vigilância e coordenação" entre os principais aliados do regime de Assad para "neutralizar este perigoso complô e contrapor as ações dos grupos terroristas na Síria e na região", conforme comunicado ministerial em Teerã. O chanceler pediu, ainda, a "coordenação" entre o seu país e a Rússia para ajudar o regime sírio de Bashar al-Assad. A chancelaria russa confirmou a conversa em nota.

Enquanto isso, a Turquia, apoiadora de facções rebeldes no norte da Síria, pediu o fim dos ataques nas regiões de Idlib, que têm gerado grandes tensões. O norte sírio, que vinha se mantendo estável desde um cessar-fogo em 2020, vê agora a intensificação dos confrontos, com risco de nova escalada. O conflito já causou a morte de mais de 500 mil pessoas e deslocou milhões desde 2011. O país permanece dividido em diversas zonas controladas por diferentes facções, o regime de Assad e potências estrangeiras.

Palavra de especialista

Arquivo pessoal - Paulo Hilu, professor de antropologia da UFF: "Momento ideal"

As forças da oposição síria se aproveitaram do fato de que os principais aliados da Síria, como a Rússia e o Hezbollah, estão bastante enfraquecidos e envolvidos em outros conflitos — a Rússia na Ucrânia, o Irã e o Hezbollah no conflito em Israel. Se aproveitaram, também, do fato de que, claramente, não vai ter nenhuma intervenção real das potências ocidentais que basicamente estão quietas, inclusive, ajudando no genocídio que Israel está fazendo em Gaza. Então, essas forças opositoras aproveitam esse cenário para fazer a ofensiva militar. Diante disso, as tropas do regime sírio praticamente se dissolvem. Elas acabam tomando Aleppo de maneira rápida e fácil, o que não era um cenário esperado.

Paulo Hilu, professor de antropologia e coordenador do Núcleo de Estudos do Oriente Médio da Universidade Federal Fluminense (UFF) 

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