Venezuela

Venezuela: Oposição inicia 2025 com desafio ao presidente Nicolás Maduro

O ex-diplomata Edmundo González Urrutia pretende retornar a Caracas e ser empossado presidente, em 10 de janeiro, depois de se declarar vitorioso nas eleições de 28 de julho passado. Ex-prefeito de Caracas espera "transição ordenada"

Edmundo González (D) e María Corina (E) esperam iniciar o novo governo nos próximos dias -  (crédito: Gabriela Oraa/AFP)
Edmundo González (D) e María Corina (E) esperam iniciar o novo governo nos próximos dias - (crédito: Gabriela Oraa/AFP)

Se Edmundo González Urrutia, presidente autoproclamado vitorioso nas eleições de 28 de julho, cumprir com a promessa e retornar a Caracas nos próximos dias, 2025 começará de forma conturbada na Venezuela. Exilado em Madri desde 8 de setembro, o ex-diplomata de 75 anos pretende ser empossado em 10 de janeiro, apesar das ameaças de prisão. Urrutia chegou a anunciar que a deputada opositora cassada María Corina Machado ocupará o posto de vice-presidente. O presidente Nicolás Maduro declarou que prestará juramento perante a Assembleia Nacional (Parlamento, de maioria chavista) para mais seis anos de mandato — o afilhado político de Hugo Chávez comanda o Palácio de Miraflores desde 8 de março de 2013.  

"Para 2025, esperamos a recuperação da liberdade na Venezuela. Este tem sido o objetivo dessa longa luta, de 25 anos de resistência, que teve seu capítulo mais importante em 28 de julho", afirmou ao Correio Antonio Ledezma, ex-prefeito de Caracas exilado em Madri e coordenador do Conselho Político Internacional de María Corina.

Ele atribui a suposta vitória de Edmundo González ao povo venezuelano. "A população venezuelana tem que se mobilizar, resistir e se impor, assim como o fez durante as eleições. Esperamos que, no próximo ano, consigamos a liberdade definitiva e que se possa iniciar a transição, encabeçada por Edmundo González e por María Corina. Que essa transição seja ordenada e pacífica."

De acordo com Ledezma, o novo governo respeitará etapas e ciclos para "promover a reconstrução das instituições, da infraestrutura, da economia e do tecido social, que foi rasgado na Venezuela". Ele explicou que 90% dos venezuelanos enfrentam uma situação de pobreza. Ao ser questionado sobre o risco de aumento de repressão após a solenidade de posse de Edmundo González e de María Corina, Ledezma disse que a violência por parte do regime de Nicolás Maduro alcançou o "topo". "Pedimos que a comunidade internacional faça o seu papel para deter a contínua violação dos direitos humanos cometida por Maduro, com o apoio da elite repressiva. Maduro não tem o povo, não conta com respaldo popular. O que ele tem são apenas horas armadas, que utiliza para reprimir os venezuelanos", acrescentou o ex-prefeito.

Guarda Nacional Bolivariana detém adversários do regime, em Caracas, em 30 de julho
Guarda Nacional Bolivariana detém adversários do regime, em Caracas, em 30 de julho (foto: AFP)

"Vamos empossar Maduro"

A Assembleia Nacional (AN), composta em 89% por simpatizantes de Maduro e em 6% de integrantes da oposição, será inaugurada em 5 de janeiro. Deputado do partido opositor Acción Democrática, Juan Carlos Palencia falou ao Correio, de Cúcuta, na Colômbia, e avisou: "Vamos empossar o presidente Nicolás Maduro em 10 de janeiro".

Membro da Comissão de Integração e de Assuntos Fronteiriços da AN, Palencia lembrou que a Venezuela vive sob um regime totalitário, mas explicou que seu partido decidiu avalizar a declaração do Tribunal Supremo de Justiça e reconhecer a vitória de Maduro nas eleições de 28 de julho. "Maduro detém a força do Estado, controla a força pública. Não há meios de Edmundo González regressar a Caracas. Não há nenhuma garantia para a entrada dele no país. Se o fizer será preso e terá declarada a inabilitação política. É impossível ele ser juramentado", admitiu. De acordo com o parlamentar, a Venezuela vive "um momento difícil e terrível" e a oposição se encontra muito dividida em relação ao resultado das urnas.

Nicolás Maduro anunciou que será empossado pela Assembleia Nacional em 10 de janeiro
Nicolás Maduro anunciou que será empossado pela Assembleia Nacional em 10 de janeiro (foto: Francisco Batista/Presidência da Venezuela/AFP)

Por sua vez, José Vicente Carrasquero Aumaitre, cientista político da Universidad Simón Bolívar (USB, em Caracas), acredita que, caso Maduro seja empossado, a repressão será a única forma de ele se manter no poder. "Quatro em cada cinco venezuelanos rejeitam Maduro. Ele somente poderá seguir governando através da força", disse ao Correio. Ele prevê que um eventual retorno de Edmundo González à Venezuela surtirá em uma injeção de ânimo popular. "Muitos venezuelanos refugiados no exterior também voltariam ao país e veríamos um aumento nos investimentos da iniciativa privada." Atualmente, cerca de 5,4 milhões, dos 28,4 milhões de venezuelanos, moram em outros países, depois de fugirem da repressão e da crise econômica. 

Diretor do Centro de Estudos Políticos e de Governo da Universidad Católica Andrés Bello (em Caracas), Benigno Alarcon afirmou que o governo de Maduro fará todo o possível para impedir a entrada de Edmundo González no país. "Será praticamente impossível para Edmundo González ser juramentado perante a Assembleia Nacional. Mas o país espera que ele seja presidente. A posse de Maduro, em 10 de janeiro, poderá detonar o descontentamento social e levar o governo de Maduro a reprimir a população", explicou à reportagem. "O conflito é quase inevitável, assim como que Maduro seja empossado. Sete em cada 10 venezuelanos votaram contra Maduro. Se Edmundo González entrar no país, o governo o prenderá imediatamente, e isso poderá desatar mais protestos pelo país, além de uma pressão muito maior da comunidade internacional."

Refugiada venezuelana protesta em Lima, pouco antes de votar nas eleições de 28 de julho
Refugiada venezuelana protesta em Lima, pouco antes de votar nas eleições de 28 de julho (foto: AFP)

Para Alarcon, será interessante ver o comportamento do aparato repressivo ante protestos dotados de legitimidade. "As forças do regime se veem em um dilema: castigar o povo, que reclama seus direitos, ou sustentar o regime de Maduro incondicionalmente, ainda que convencidas de que ele carece de legitiidade mínima para governar."

EU ACHO...

"Como estabelece a Constituição, a posse do novo governo deve ocorrer em 10 de janeiro. Quem tem legitimidade para assumir a Presidência da Venezuela é Edmundo González. Foi isso o que as atas eleitorais demonstraram. Elas funcionam como títulos de propriedade de um imóvel. O título para assumir o poder está nesses documentos. Ante um regime autoritário, precisamos assumir todos os riscos. Esta é uma ditadura implacável, que se apoia na narcorrepressão e na violência dos militares. Estamos desafiando todos esses riscos. Não há como retroceder, mas avançar." 

Antonio Ledezma, ex-prefeito de Caracas exilado em Madri e coordenador do Conselho Político Internacional de María Corina

"Na condição de também matemático, creio que a probabilidade de Edmundo González tomar posse como presidente da Venezuela é baixa, mas não chega a zero. Se isso ocorrer em 10 de janeiro, é um sinal de que Maduro foi derrotado nas eleições de 28 de julho. A única pessoa que não sabe disso é Luiz Inácio Lula da Silva. Acho que, com Edmundo González no poder, haverá uma mudança imediata melhor na economia venezuelana, que ficou estagnada por 25 anos. O novo governo terá as tarefas de aprimorar o fornecimento de energia elétrica e o abastecimento de água."

José Vicente Carrasquero Aumaitre, professor da Universidad Simón Bolívar (USB, em Caracas)

  • Nicolás Maduro anunciou que será empossado pela Assembleia Nacional em 10 de janeiro
    Nicolás Maduro anunciou que será empossado pela Assembleia Nacional em 10 de janeiro Foto: Francisco Batista/Presidência da Venezuela/AFP
  • Guarda Nacional Bolivariana detém adversários do regime, em Caracas, em 30 de julho: risco de intensificação da repressão
    Guarda Nacional Bolivariana detém adversários do regime, em Caracas, em 30 de julho: risco de intensificação da repressão Foto: AFP
  • Refugiada venezuelana protesta em Lima, diante da Embaixada da Venezuela, pouco antes de escolher o próximo presidente: patriotismo
    Refugiada venezuelana protesta em Lima, pouco antes de votar nas eleições de 28 de julho Foto: AFP
  • Policial lança gás lacrimogêneo contra manifestantes, na capital, um dia depois das eleições que a oposição afirma ter vencido
    Policial lança gás lacrimogêneo contra manifestantes, na capital, um dia depois das eleições que a oposição afirma ter vencido Foto: Yuri Cortez/AFP
Rodrigo Craveiro
postado em 31/12/2024 16:00
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