Às 6h12 desta terça-feira (17/12) (0h12 em Brasília), o general Igor Kirillov, 54 anos, saiu do prédio onde morava, na Avenida Ryazansky, na região sudeste de Moscou, para encontrar a morte. Uma carga de 300g de trinitroglicerina (TNT) escondida dentro de um patinete elétrico matou o comandante das forças russas de defesa química, radiológica e biológica e o assessor Ilya Polikarpov. O atentado, ocorrido a 7km da Praça Vermelha e do Kremlin, foi reivindicado por uma fonte do Serviço de Segurança da Ucrânia (SBU).
- A série de assassinatos de alvos russos que revela escalada de tática da Ucrânia
- Qual será a resposta de Putin por morte de general que chefiava forças nucleares na Rússia?
Em declarações à agência France-Presse, ela classificou o assassinato como "operação especial" e chamou Kirillov de "criminoso de guerra". A Rússia acusou os aliados ocidentais da Ucrânia de "cumplicidade" pelo crime. "Todos os que celebram esses ataques ou que deliberadamente se calam sobre eles são cúmplices", declarou a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova.
O ex-presidente russo Dmitri Medvedev, vice-presidente do Conselho de Segurança, declarou que "as tentativas de intimidar nosso povo, deter o avanço do Exército russo e semear o medo estão condenados ao fracasso". A Duma, Câmara Baixa do Parlamento, rendeu um minuto de silêncio em homenagem ao general morto.
Konstantin Kosashev, vice-líder do Conselho da Federação (Câmara Alta), avisou que "os assassinos serão punidos, sem nenhuma dúvida e sem piedade". Por sua vez, o site do jornal russo Kommersant referiu-se ao atentado como "um crime sem precedentes" e destacou que Kirillov "não era o comandante mais importante envolvido na operação especial russa" na Ucrânia.
Um vídeo divulgado nas redes sociais mostra o momento da explosão. As imagens exibem o que parece ser o patinete elétrico encostado na parede, ao lado da entrada do prédio. Kirillov dá cinco passos em direção ao carro, quando ocorre a explosão. Na segunda-feira, promotores ucranianos condenaram Kirillov, "in absentia", por ter lançado mão de armas químicas proibidas durante a invasão.
O Ministério das Relações Exteriores do Reino Unido recusou-se a condenar o assassinato do general. "Não vamos lamentar a morte de um indivíduo que participou de uma invasão ilegal e impôs sofrimento e morte ao povo ucraniano", declarou um porta-voz do governo britânico.
"Alvo legítimo"
Para Petro Burkovsky, analista da Fundação de Iniciativas Democráticas Ilko Kucheriv (em Kiev), o fato de Kirillov ter sido um general e o responsável pelas defesas químicas, biológicas e radiológicas de Moscou o tornou um alvo legítimo. "Ele era um tomador de decisões. O ataque atingiu as capacidades defensivas da Rússia e o programa de armas de destruição em massa do Kremlin. Ao mesmo tempo, Kirillov tinha acesso a informações confidenciais sobre os planos russos nessas áreas. A Rússia herdou as capacidades soviéticas no desenvolvimento de armas biológicas e radiológicas. Isso inclui as 'bombas sujas' e as munições termobáricas (que usam o oxigênio para gerar grande pressão interna e potencializar a destruição)", explicou ao Correio.
"Por tudo isso, Kirillov era um alvo legítimo, pois era um dos principais líderes militares a participar da guerra", acrescentou Burkovsky. O especialista disse ter ficado "agradavelmente surpreendido" com o fato de o SBU, a inteligência ucraniana, ter cumprido com o objetivo e atingido o alvo com êxito. "Generais como Kirillov, normalmente, têm a segurança muito reforçada. Foi um erro imenso, uma falha gigantesca da contrainteligência russa. Mostrou que os generais russos do alto escalão estão vulneráveis a esse tipo de ataque, mesmo no coração de Moscou", comentou Burkovsky.
Olexiy Haran, professor de política comparada da Universidade Nacional de Kiyv-Mohyla, lembrou que esta não foi a primeira morte de russos envolvidos em crimes de guerra na Ucrânia. "O general foi o responsável por usar armas químicas. Ele era um alvo legítimo, pois se trata de uma guerra, um criminoso. A inteligência ucraniana mostra que criminosos de guerra serão punidos, mesmo se estiverem na Rússia", disse ao Correio. "É uma mensagem muito importante para aqueles militares russos que participam diretamente da agressão à Ucrânia."
PERSONAGEM DA NOTÍCIA
Mestre da desinformação
Desde 2017, Igor Kirillov ocupava o cargo de chefe as Tropas de Defesa Radioativa, Química e Biológica das Forças Armadas da Rússia. Acusado "in absentia" pelo uso de armas químicas proibidas durante a guerra na Ucrânia, o general teria sido o responsável direto por 4,8 mil casos de utilização dessas munições proibidas na ex-república soviética. Além disso, Kirillov era conhecido como um porta-voz da desinformação do Kremlin, ao disseminar fake news (notícias falsas) alusivas ao conflito entre Moscou e Kiev.
Em outubro de 2022, Kirillov afirmou que a Ucrânia planejava detonar uma "bomba suja" para espalhar material radioativo em seu próprio territorial. Na ocasião, disse que o plano estava em sua "etapa final". Também sem evidências, alegou que os ucranianos pretediam usar "substâncias radioativas retiradas do lixo nuclear produzido pela usina atômica de Chernobyl. No mês passado, declarou que os militares da Ucrânia tinham invadido a região de Kursk, na Rússia, para capturar uma instalação nuclear.
EU ACHO...
"A contrainteligêcia militar russa está em alerta e tenta descobrir os responsáveis pelo ataque. Em resumo, o general Igor Kirillov era um alvo muito importante. Ele poderá ser substituído, mas isso levará tempo. É uma boa notícia para o front ucraniano, com certeza. Isso pode criar um nervosismo e uma tensão dentro das Forças Armadas da Rússia, que gastarão mais recursos na segurança de seus oficiais. Há um efeito psicológico: as forças russas podem ser rastreadas e golpeadas não apenas no front, na Ucrânia, mas também em seu próprio território".
Petro Burkovsky, analista da Fundação de Iniciativas Democráticas Ilko Kucheriv (em Kiev)
"Ao falarmos sobre retaliação de Moscou, acho que a Rússia utilizou todo o tipo de arma contra a Ucrânia, à exceção de arsenal nuclear. Os russos bombardearam todo o território ucraniano. Imagine que todas as noites temos mísseis disparados contra Kiev. Rússia tem matado oficiais ucranianos. Talvez ela tente organizar atentardos terroristas contra nossos militares. Infelizmente, Mosco utilizou até mesmo armas químicas contra a Ucrânia."
Olexiy Haran, professor de política da Universidade Nacional de Kiyv-Mohyla
Saiba Mais