O regime sírio perdeu o controle total de Aleppo, a segunda maior cidade do país, pela primeira vez desde o início da guerra civil em 2011, após uma ofensiva relâmpago realizada por uma coalizão de grupos rebeldes dominados por facções islamistas, informou uma ONG neste domingo (1º).
O presidente da Síria, Bashar al Assad, prometeu reprimir duramente a ofensiva "terrorista", que, segundo o Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH), deixou mais de 370 mortos desde que teve início na quarta-feira.
"O terrorismo só entende a linguagem da força e é com esta linguagem que vamos acabar com ele e eliminá-lo, quaisquer que sejam seus apoiadores e promotores", disse Assad.
O grupo Hayat Tahrir al Sham (HTS) e outras facções rebeldes aliadas "controlam Aleppo, com exceção dos bairros sob o controle das forças curdas", declarou à AFP Rami Abdel Rahman, diretor do OSDH, uma ONG com sede no Reino Unido e que conta com uma extensa rede de informantes no terreno.
Estes são os maiores confrontos em vários anos na Síria, onde a guerra civil eclodiu em 2011 depois que o governo Assad reprimiu brutalmente protestos pacíficos.
A revolta popular se transformou em uma guerra aberta envolvendo potências regionais e mundiais, bem como grupos rebeldes, o que deixou meio milhão de mortos, milhões de deslocados e um país fragmentado.
Os insurgentes liderados pelo HTS controlam grandes extensões de território na província de Idlib (noroeste) e partes de Aleppo, Hama (centro) e Latakia, esta última com saída para o Mediterrâneo.
Os curdos sírios estabeleceram, por sua vez, uma autoridade autônoma apoiada por uma força militar em áreas do noroeste.
O regime sírio, com apoio de Rússia e Irã, iniciou uma contraofensiva em 2015 que lhe permitiu recuperar gradualmente o controle de grande parte do país.
'As paredes caíram sobre nós'
A campanha militar insurgente teve início na quarta-feira, quando um frágil cessar-fogo no Líbano entre Israel e o movimento islamista Hezbollah, apoiado pelo Irã, entrou em vigor após dois meses de guerra.
Os rebeldes tomaram dezenas de cidades em sua marcha em direção a Aleppo, cuja rica história está incorporada em sua imponente cidadela na cidade velha, inscrita pela Unesco na lista de patrimônios mundiais em perigo.
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A Rússia — cuja aviação foi crucial para a recuperação do governo sírio no conflito — voltou a bombardear Aleppo pela primeira vez desde 2016, de acordo com o OSDH.
Em Idlib, pelo menos oito civis foram mortos neste domingo, incluindo duas crianças, em um bombardeio russo, segundo a organização.
"Ouvimos uma explosão e as paredes caíram sobre nós. Vi dois de meus netos perto de mim e os levei embora", disse Um Mohammad à AFP de sua cama de hospital. A mulher perdeu sua nora, que era mãe de cinco filhos.
'Sem resistência'
O OSDH informou no sábado que os rebeldes avançaram para as províncias de Hama e Idlib e tomaram "dezenas de cidades estratégicas sem encontrar resistência".
Os rebeldes entraram em Aleppo na sexta-feira e, no dia seguinte, tomaram a maior parte da cidade, desfilando pelas ruas, colocando sua bandeira em frente a uma delegacia de polícia e derrubando um retrato de Assad, de acordo com imagens da AFP.
O Exército sírio confirmou a presença de insurgentes em grande parte de Aleppo e lamentou que esta ofensiva tenha deixado "dezenas" de mortos e feridos.
O Irã "apoia firmemente o Exército e o governo" sírios, disse o ministro das Relações Exteriores do Irã, Abbas Araghchi, antes de viajar para Damasco no domingo.
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O chanceler iraniano telefonou para o seu par russo, Sergei Lavrov, no sábado e enfatizou a "necessidade de vigilância e coordenação" entre os dois países.
Araghchi disse na sexta-feira que a situação em desenvolvimento na Síria era parte de "um plano americano-sionista para interromper a estabilidade e a segurança na região".
O Oriente Médio tem sido abalado desde outubro de 2023 pela guerra entre Israel e o movimento palestino Hamas em Gaza, e agora está no limite com o frágil cessar-fogo acordado esta semana entre Israel e o Hezbollah.
A Casa Branca declarou no sábado que o governo de Assad perdeu o controle de Aleppo devido à sua dependência da Rússia e do Irã, combinada com sua recusa em prosseguir com um processo de paz delineado em 2015 pela ONU.
O noroeste da Síria permaneceu em uma calma inquietante nos últimos anos, possibilitada por um cessar-fogo estabelecido após uma ofensiva do regime em março de 2020, que foi intermediado por Rússia e Turquia.
"As linhas do regime entraram em colapso em uma velocidade incrível, pegando todos de surpresa", afirmou Dareen Khalifa, especialista do International Crisis Group.