No centro de Washington DC, um grupo de veteranos ucranianos se reúne para garantir que a guerra em seu país não seja esquecida, enquanto os EUA vão às urnas escolher seu próximo presidente.
Alguns se sentam na grama do National Mall, colocando suas próteses enquanto se preparam para participar de uma corrida de 10 km, vestindo as cores azul e amarelo, da bandeira da Ucrânia.
Todos eles ficaram feridos na guerra — e muitos perderam membros.
Dmytro Kamenschyk ajusta a camiseta — na frente dela, há uma foto em preto e branco do pai dele, Viktor, que foi morto na linha de frente de combate em um ataque russo.
O jovem de 26 anos não tem a mão esquerda nem vários dedos da mão direita, em decorrência dos ferimentos que sofreu enquanto trabalhava como operador de drones perto da cidade de Bakhmut, no leste da Ucrânia.
"Um dos principais motivos pelos quais estou aqui é para homenagear meu falecido pai, para que ele possa ver que todos os seus esforços não foram em vão", afirma.
"O apoio do povo americano, do Estado americano, é muito importante."
Quem vencer a eleição presidencial dos EUA poderá ser vital para decidir o desfecho da guerra na Ucrânia, mas o conflito também está desempenhando um papel importante na corrida pela Casa Branca.
Estado decisivo
Na Filadélfia, a 190 quilômetros a nordeste, um grupo de ativistas se reúne nos degraus de pedra perto do centro da cidade, que ficaram famosos no filme Rocky, um Lutador.
"As questões que estão em jogo para a Ucrânia são existenciais", diz Mary Kalyna, enquanto os manifestantes agitam bandeiras azuis e amarelas.
A cidade fica no Estado da Pensilvânia, considerado um dos Estados decisivos para a corrida eleitoral — e, com a disputa entre Kamala Harris e Donald Trump tão acirrada, pode ser crucial para decidir quem vai comandar a Casa Branca.
Mary, uma ucraniana de segunda geração, é ativista comunitária e está torcendo por uma vitória de Kamala Harris em 5 de novembro. A candidata democrata se comprometeu a "trabalhar para garantir que a Ucrânia prevaleça nessa guerra" — sob o atual governo democrata, os EUA têm sido o maior doador de armas e equipamentos para Kiev, após a invasão em grande escala da Rússia.
Até agora, os EUA forneceram pelo menos US$ 61 bilhões (R$ 352 bilhões) em assistência militar, um pouco mais do que as contribuições combinadas de todos os países europeus que apoiam Kiev.
"Neste Estado, há 120 mil ucranianos-americanos, o que é mais do que o número de pessoas que decidiram as duas últimas eleições", acrescenta Mary.
"Por isso, temos potencial para ser muito influentes."
No passado, muitos ucraniano-americanos votavam tradicionalmente de forma conservadora — gravitando para a direita, após terem fugido da Europa Oriental dominada pelos soviéticos.
Na Pensilvânia, há também mais de 700 mil poloneses-americanos que, historicamente, também votam nos republicanos, mas muitos deles estão preocupados agora com a expansão russa.
Com a disputa na Pensilvânia no fio da navalha, transferir apenas alguns milhares de votos pode ser fundamental.
"Conheço muitas pessoas que votaram nos republicanos a vida toda, e estão aqui hoje para apoiar Harris", conta Roman Strakovsky, analista de dados presente no comício.
Ele nasceu em Kiev, mas se mudou para os EUA ainda criança.
"Acho que há um risco bastante real de que, se Trump for eleito, o apoio à Ucrânia desapareça completamente ou seja significativamente reduzido."
O plano de Trump
O receio de Roman é motivado pela declaração do ex-presidente de que ele "vai ser capaz de fazer um acordo entre o presidente (Vladimir) Putin e o presidente (Volodymyr) Zelensky muito rapidamente".
Trump não deu detalhes claros sobre como faria isso, mas seus comentários aumentaram o temor de que Kiev fosse pressionada a ceder território a Moscou. O ex-presidente também mencionou que há "muitas mortes, muita destruição" na Ucrânia, e que "os Estados Unidos estão pagando pela maior parte disso".
Embora impopular entre alguns membros das comunidades do leste europeu na Pensilvânia, nem todos estão planejando transferir seu apoio para os democratas.
"Muitos poloneses apoiaram Trump anteriormente, e vão continuar a apoiar Trump no futuro", afirma Timothy Kuzma, líder de um grupo comunitário polonês-americano.
"Não acho que muitos poloneses acreditem que Trump vai abandonar a Ucrânia."
"Acho que Putin tinha um pouco de medo de Trump", acrescenta Jolanta Gora, gerente de um consultório médico do condado de Bucks, nos arredores da Pensilvânia.
Fim da guerra
Muitos nos EUA acreditam que a guerra entre a Rússia e a Ucrânia é dispendiosa e sangrenta e não tem fim à vista, a menos que haja uma mudança na política.
A única maneira de a guerra terminar "sem centenas de milhares de novas mortes é um acordo negociado", avalia John Byrnes, diretor estratégico da organização Concerned Veterans for America.
"Isso significa que nenhum dos lados obtém tudo o que deseja, mas ambos os lados obtêm algo que desejam."
Byrnes acrescenta que sua experiência nas Forças Armadas o deixou mais cético em relação à intervenção estrangeira, uma jornada que o Partido Republicano também percorreu com Trump.
"Seja quem for que assuma a presidência, estamos realmente esperando que pressione por esse acordo negociado para forçar condições que acabem com o financiamento dos EUA para a guerra e com as armas e munições dos EUA para a guerra", diz ele.
A Ucrânia espera mobilizar os esforços internacionais para pressionar a Rússia a se retirar de todos os territórios ocupados.
Alguns analistas acham que esta postura significa que há pouca chance de um acordo para acabar com a guerra. "Nenhum dos lados quer negociar", observa Melinda Haring, do think tank Atlantic Council.
"O lado russo não demonstra disposição para negociar, a Rússia acha que está vencendo, e ainda está avançando no campo de batalha", ela acrescenta.
"O lado ucraniano também não está disposto a negociar neste momento. E não tem resposta para sua necessidade legítima de garantias de segurança."
"As únicas garantias de segurança que são duradouras e reais são a adesão à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan)."
Portanto, assim como a Ucrânia está desempenhando um papel nesta disputa incrivelmente acirrada pela Casa Branca, o resultado da eleição também pode ter um efeito significativo no desfecho da guerra em si.