O debate entre candidatos a vice-presidente na noite de terça-feira (1/10) entre o republicano J.D. Vance e o democrata Tim Walz foi um embate civilizado e relativamente contido sobre as questões que estão nas mentes dos eleitores americanos antes da eleição de 5 de novembro.
Nisso, foi diferente dos dois debates presidenciais que ocorreram anteriormente neste ano.
Os dois candidatos passaram muito mais tempo atacando o companheiro de chapa do outro do que um ao outro durante mais de 90 minutos no palco da emissora CBS News em Nova York.
Walz teve um começo instável, mas acertou em cheio ao falar sobre aborto e a invasão do Capitólio.
Mas o debate equilibrado e focado em políticas, com poucos golpes políticos, provavelmente serviu melhor a Vance — um hábil orador público — no final das contas.
Se Vance foi escolhido porque ele coloca carne ideológica nos ossos do populismo conservador de Trump, na terça à noite, ele também colocou um rosto educado e humilde neles.
"Algo que esses caras fazem é fazer muitas afirmações sobre, se Donald Trump se tornar presidente, todas essas consequências terríveis acontecerão", disse ele.
"Mas, na realidade, quando Donald Trump era presidente, a inflação era baixa, a renda líquida [dos americanos] era maior."
Houve momentos em que o candidato republicano se irritou com o que ele considerou uma checagem de fatos injusta dos dois moderadores da CBS, e, em determinado momento, os microfones de ambos os candidatos foram temporariamente silenciados.
Mas, na maior parte do tempo, as interações no palco foram tranquilas.
E houve vários momentos em que os dois candidatos concordaram — e disseram isso abertamente.
"Há muita coisa em comum aqui", afirmou Walz no final da noite.
Quando Walz falou sobre seu filho de 17 anos testemunhando um tiroteio em um centro comunitário, Vance pareceu genuinamente preocupado.
"Sinto muito por isso e espero que ele esteja bem", disse o republicano. "Que Cristo tenha misericórdia, é horrível."
Um debate cordial, mas com alguns conflitos
As discordâncias mais vigorosas ocorreram no final do debate, sobre as repetidas e falsas alegações de Trump de que a eleição de 2020 foi fraudada para que ele fosse derrotado.
Vance, quando questionado se Trump perdeu a última eleição presidencial, desviou da pergunta e criticou o que ele disse ser uma censura de Kamala Harris.
Walz rapidamente observou que era uma "não resposta reprovável".
"Negar o que aconteceu em 6 de janeiro, a primeira vez que um presidente americano ou qualquer pessoa tentou anular uma eleição, isso tem de parar", disse Walz. "Está destruindo nosso país."
Walz prosseguiu dizendo que a única razão pela qual Mike Pence, o ex-vice-presidente de Trump, não estava ali no palco foi porque ele certificou a vitória do presidente Joe Biden.
Vance não teve resposta para isso, destacando que, apesar de seu comportamento amigável e simpatia, ele não contraria a posição de Trump.
Dois estilos diferentes
Vance e Walz entraram neste debate com diferentes conjuntos de habilidades.
Vance brigou com jornalistas na televisão em discussões acaloradas. Walz sente-se em casa em um palanque de campanha, usando seu estilo casual como um contraste em relação políticos mais polidos.
Na parte inicial do debate, com ambos os candidatos de pé atrás de pódios em um estúdio de televisão da cidade de Nova York, Vance parecia muito mais confortável.
Suas respostas foram suaves e se mantiveram implacavelmente na mensagem que ele desejava passar, lembrando constantemente ao público que, apesar de todas as promessas da vice-presidente Harris, os democratas estiveram no comando da Casa Branca nos últimos três anos e meio.
"Se Kamala Harris tem planos tão bons sobre como lidar com os problemas da classe média, então, ela deveria fazer tudo isso agora", disse Vance.
Walz, por sua vez, parecia hesitante e inseguro sobre o assunto que abriu o debate, o ataque de mísseis iranianos de terça-feira a Israel e a questão de se os candidatos apoiariam um ataque preventivo israelense ao Irã.
O governador de Minnesota raramente fala sobre política externa, e seu desconforto sobre o assunto ficou aparente.
O democrata ficou cada vez mais confortável conforme o debate avançou, e, durante suas trocas com Vance sobre o tópico da imigração — que favorece os republicanos — ambos tiveram falas bem afiadas.
Vance desviou acusações de que ele divulgou fake news sobre imigrantes haitianos roubando e comendo animais de estimação em Ohio.
"As pessoas com as quais estou mais preocupado em Springfield, em Ohio, são os cidadãos americanos que tiveram suas vidas arruinadas pelas políticas para a fronteira de Kamala Harris", disse ele.
Vance disse que a imigração sem documentos sobrecarrega os recursos da cidade, aumenta preços e reduz salários.
Walz destacou a oposição de Trump à proposta de legislação bipartidária de imigração no início deste ano.
"Acredito que o senador Vance quer resolver isso, mas, ao ficar ao lado de Donald Trump e não trabalhar junto para encontrar uma solução, isso se torna um ponto de discussão, e quando se torna um ponto de discussão como este, desumanizamos e vilanizamos outros seres humanos."
Quando o assunto se voltou para os direitos ao aborto — que favorece os democratas, de acordo com as pesquisas — foi Vance quem jogou na defesa, reconhecendo que os republicanos tinham que fazer mais para ganhar a confiança dos eleitores americanos.
"Quero que nós, enquanto Partido Republicano, sejamos pró-família no sentido mais amplo da palavra", disse ele.
"Quero que tornemos mais fácil para as mães terem filhos. Há muito que podemos fazer na frente das políticas públicas apenas para dar mais opções às mulheres."
Walz rebateu dizendo que a visão democrata sobre o aborto era simples: "Somos pró-mulheres. Somos pró-liberdade para que as pessoas façam sua própria escolha".
Se Walz foi mais direto sobre o aborto, ele se recusou a fazer ataques quando o assunto se voltou para o controle de armas.
Depois que Vance disse ser importante aumentar a segurança nas escolas, tornando portas e janelas "mais fortes", Walz falou sobre verificações de antecedentes em vez de endossar os apelos democratas por proibições de armas de assalto e outras limitações a armas de fogo.
Como congressista, Walz votou regularmente a favor dos direitos de armas e contra muitas medidas de controle de armas, ganhando elogios da NRA, principal grupo pró-armas dos EUA.
Durante o debate, ele disse que suas opiniões sobre o controle de armas mudaram após o massacre na escola Sandy Hook em 2012, mas alguns democratas podem ter ficado desapontados por ele não ter pressionado Vance mais sobre o assunto neste debate.
Isso afetará a corrida?
A história política americana sugere que os debates vice-presidenciais não importam geralmente.
Em 1988, o democrata Lloyd Bentsen destruiu o republicano Dan Quayle. Poucos meses depois, Quayle foi empossado como vice-presidente após sua chapa obter uma vitória esmagadora.
Pode ser que esse debate seja similarmente irrelevante para os resultados da eleição em novembro.
A menos que haja um debate de última hora, no entanto, será a última vez em que que ambos os partidos terão um palco para debater antes do dia da eleição.
Walz não prejudicou a chapa democrata e mostrou um pouco do seu charme do Centro-Oeste americano que o tornou a escolha de Harris para seu companheiro na disputa.
Mas o forte desempenho de Vance provavelmente animará os republicanos nos próximos dias.
O impacto duradouro do debate pode convencer os membros de seu partido de que o senador de Ohio — que tem apenas 40 anos — tem um futuro na política conservadora nacional, dada sua capacidade de defender claramente suas prioridades ideológicas nos palcos mais brilhantes.