Um urso — famoso por gostar de cerveja, cigarro e boxe — lutou ao lado das tropas aliadas na Segunda Guerra Mundial.
Wojtek foi "adotado" pelo 2º Corpo do Exército polonês em 1943, depois que sua mãe foi baleada por caçadores.
O urso pardo sírio, encontrado no Oriente Médio, viajou com os soldados quando eles foram enviados para a Itália. Membros das forças aliadas já descreveram seu choque ao ver Wojtek carregando projéteis de artilharia durante a Batalha de Monte Cassino.
Esta história de amizade e coragem foi adaptada agora para uma produção teatral em Coventry, na Inglaterra, pelo escritor Alan Pollock, autor do livro infantil The Bear Who Went To War ("O urso que foi para a guerra", em tradução livre).
O pai de Sue Butler foi um dos soldados que lutou na guerra ao lado de Wojtek.
"Meu pai disse que ele era um símbolo que unia os soldados. Ele era muito mais do que um urso, e pensava que era um deles", diz Butler, falando com a reportagem a de Solihull, na Inglaterra.
Assim como muitos veteranos, o cabo Andrzej Gasior não costumava falar muito sobre suas experiências de guerra, conta Butler.
"Quando ele começou a me contar histórias sobre esse soldado que, na verdade, era um urso, eu não acreditei nele no começo. Pensei que ele estava me provocando."
"Mas eu estava em um clube polonês local, quando um amigo dele trouxe uma foto de Wojtek para me mostrar."
O pai de Butler havia sido enviado para um campo de trabalho forçado na Sibéria aos 16 anos, depois de ser flagrado cruzando a fronteira polonesa para negociar botas e alimentos.
Ele ficou doente e disse que a guerra salvou sua vida, uma vez que a invasão da Polônia fez com que a União Soviética libertasse os poloneses.
Foi então que ele se juntou ao Exército Livre Polonês, como ele chamava, e conheceu Wojtek enquanto estava no Oriente Médio.
Wojtek ficou conhecido como um urso que gostava de cerveja e cigarros, mas a verdade pode ser um pouco mais prosaica.
Ele gostava especialmente de tâmaras — que o pai de Butler costumava carregar no bolso como um agrado para ele.
"Ele me disse que outros soldados lutavam com o urso. E, embora às vezes ele [Wojtek] seja visto [em fotos] tomando garrafas de cerveja, meu pai falou que a cerveja, às vezes, era cara demais e, com frequência, o que havia na garrafa era apenas água."
O urso também pedia cigarros, que ele comia.
Butler afirma que os soldados eram muito protetores com seu companheiro urso, que servia como um grande incentivo moral à tropa.
"Ele era um urso desalojado, e eles eram pessoas desalojadas. Ambos estavam sem suas famílias", ela observa.
O animal era "muito engraçado e bastante travesso", ela acrescenta, mas no fim das contas, o urso "achava que era um deles [dos homens]".
"Todos eles saíram fracos [da Sibéria], e foram oprimidos pelo Estado russo por muito tempo. Esse urso, que está sem a mãe, de repente entra em suas vidas", explica.
Quando as forças polonesas foram enviadas para lutar em outros países europeus, a única maneira de levar o urso com elas era "alistá-lo".
Ele recebeu então um nome, uma patente e um número de registro — e participou da campanha italiana.
Em uma entrevista, um veterano britânico contou que ficou surpreso ao ver o urso de 1,82 metro carregando projéteis durante a Batalha de Monte Cassino.
O emblema do batalhão se tornou uma imagem de Wojtek carregando um projétil.
Butler contou que seu pai disse a ela: "Tenho certeza de que ele nos manteve firmes" durante a batalha.
"O urso demonstrou claramente que estava assustado com as explosões, mas se acostumou, e carregava caixas enormes com artilharia pelo local", ela relata.
'Chorou como um bebê'
Quando os soldados poloneses foram desmobilizados, Wojtek foi viver em Berwickshire, na Escócia, antes de ser levado para o Zoológico de Edimburgo, onde acabou morrendo em 1963.
Gasior foi para a Inglaterra, primeiro para trabalhar em uma mina de carvão em Preston, e depois entrou para um circo e acabou na região de West Midlands.
Ele se casou com Johanna O'Connel, funcionária de uma cantina que conheceu na base aérea de Gaydon, em Warwickshire. O casal se estabeleceu posteriormente em Birmingham.
Butler contou que seu pai visitou Wojtek em Edimburgo, antes de se mudar para o sul.
"Os homens poloneses da época dele eram ensinados a não chorar, porque isso era visto como um sinal de fraqueza", diz ela.
"Mas ele me falou que quando viu Wojtek no zoológico, chorou como um bebê."
O dramaturgo Alan Pollock conta que ficou sabendo da história do urso por meio de uma mulher de 90 anos, enquanto fazia uma pesquisa no Clube Polonês de Coventry.
"Eu tive que interrompê-la e dizer: 'Desculpa, você pode repetir isso? Um urso era um soldado raso no Exército polonês?'", ele relembra.
"Ela me contou a história e, a partir daquele momento, fiquei fascinado. Acho que nunca ouvi uma história que eu soubesse tão imediatamente que queria contar."
Segundo ele, muitos dos soldados acabaram se estabelecendo no Reino Unido.
"Eles achavam que, uma vez a batalha sendo vencida, poderiam voltar para casa. Mas a Polônia está ocupada pela União Soviética, e eles não podiam voltar", diz o dramaturgo.
"A maioria deles saiu de casa em 1939 ou 1940, e muitos deles nunca mais viram suas casas ou suas famílias novamente."
Butler contou que só recentemente ouviu falar da produção teatral por meio de sua nora, que trabalha com teatro.
"Acho que a Julia comentou com meu filho, Tom, e ele disse: 'Tenho certeza absoluta de que meu avô conheceu aquele urso', mas acho que ela não acreditou nele no começo."
"O mundo é pequeno e, às vezes, as coisas se alinham, não é mesmo?", acrescenta.
O pai dela viveu até os 92 anos, e morreu em 2014.
"Ele é meu herói, meu pai. Ele era um homem incrível, e eu tenho muito orgulho de ser filha dele."