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As lições de Japão e Nova Zelândia para reconstrução após desastre no Rio Grande do Sul

Exemplo internacionais demonstram como um planejamento estratégico e visionário podem não apenas reconstruir, mas transformar uma cidade, aproveitando uma crise como catalisadora para um desenvolvimento mais inteligente e sustentável, defende pesquisadora neste artigo

Tóquio adotou sistemas de construção altamente resistentes a terremotos, utilizando engenharia de ponta para garantir a segurança dos edifícios e infraestruturas -  (crédito: Getty Images)
Tóquio adotou sistemas de construção altamente resistentes a terremotos, utilizando engenharia de ponta para garantir a segurança dos edifícios e infraestruturas - (crédito: Getty Images)

Em tempos de mudanças climáticas cada vez mais radicais e perigosas, o planejamento urbano e regional é uma estratégia essencial para o desenvolvimento sustentável e a resiliência de territórios.

No Rio Grande do Sul, os impactos devastadores das inundações ainda são sentidos pela população, demonstrando fragilidades estruturais, falta de preparo adequado e a urgência de um planejamento que vá além da resposta emergencial.

A saída para isso é complexa, mas exemplos não faltam, vindos de países e cidades que se desenvolveram sobre terrenos historicamente sujeitos a desastres naturais.

Tóquio e Christchurch, onde planejamento é a palavra-chave

A importância do planejamento reside na sua capacidade de orientar o crescimento ordenado das cidades, integrar diferentes setores econômicos e sociais e promover a inclusão e a equidade.

No contexto atual do Rio Grande do Sul, onde a reconstrução é inevitável, o planejamento deve ser visto como um processo para transformar a crise em uma oportunidade de inovação e sustentabilidade.

Tóquio, por exemplo, devido à sua localização geopolítica em uma região altamente sísmica e densamente povoada, poderia facilmente ter enfrentado enormes desafios de desenvolvimento urbano.

No entanto, a cidade transformou essas potenciais fraquezas em forças por meio de um planejamento urbano estratégico e do uso de tecnologias avançadas.

Com uma abordagem que integra resiliência e inovação, Tóquio adotou sistemas de construção altamente resistentes a terremotos, utilizando engenharia de ponta para garantir a segurança dos edifícios e infraestruturas.

Além disso, a cidade investiu em soluções tecnológicas para melhorar a mobilidade urbana, a gestão de energia e a segurança pública, tornando-se um exemplo de como a combinação de planejamento rigoroso e tecnologia pode criar um ambiente urbano eficiente, seguro e preparado para enfrentar futuros desafios.

Pessoas caminham em rua de Tóquio em dia ensolarado
Getty Images
Tóquio adotou sistemas de construção altamente resistentes a terremotos, utilizando engenharia de ponta para garantir a segurança dos edifícios e infraestruturas

Outro exemplo notável é a cidade de Christchurch, na Nova Zelândia.

Após o devastador terremoto de 2011, a cidade enfrentou a tarefa monumental de se reconstruir quase do zero. Em vez de simplesmente restaurar a cidade como era antes, Christchurch adotou uma abordagem inovadora, focada na inteligência tecnológica e na sustentabilidade.

O novo plano urbano incluiu a criação de espaços verdes, infraestrutura de energia renovável e a implementação de tecnologias que tornaram a cidade mais preparada para enfrentar futuros desastres naturais.

Este exemplo demonstra como um planejamento estratégico e visionário pode não apenas reconstruir, mas transformar uma cidade, aproveitando uma crise como catalisadora para um desenvolvimento mais inteligente e sustentável.

Em um planeta em constante mutação, a proatividade se torna a chave-mestra.

Ao invés do histórico brasileiro em procrastinar o planejamento, é crucial que seja elaborado, urgentemente, o planejamento urbano e regional do Rio Grande do Sul, com equipes especializadas, para a construção e/ou reconstrução dos territórios atingidos, abordando uma série de problemas críticos que historicamente têm sido negligenciados.

Primeiramente, a infraestrutura de drenagem urbana precisa ser reavaliada e modernizada, especialmente em áreas vulneráveis a inundações, como os municípios mais afetados pelas chuvas torrenciais recentes.

Isso inclui a implementação de sistemas de drenagem eficientes, a recuperação de áreas verdes que atuam como zonas de retenção natural de água e a promoção do conceito de "cidade esponja', onde a água da chuva é coletada e reutilizada localmente para mitigar os impactos das enchentes.

Novos projetos urbanos devem também ser pensados desde o início com critérios de sustentabilidade, priorizando a mobilidade urbana eficiente, o uso de energias renováveis e a construção de moradias adaptadas às mudanças climáticas.

A implementação de tecnologias inteligentes, como redes elétricas inteligentes e sistemas de monitoramento ambiental em tempo real, também deve ser uma prioridade.

Esse planejamento diferenciado exige um rompimento com práticas antiquadas e uma adoção de metodologias inovadoras que privilegiem o bem-estar da população e a sustentabilidade a longo prazo.

Reconstrução com base na ciência

Adiar o planejamento é adiar o desenvolvimento. O Estado e os governos que se recusam a planejar o futuro das cidades nos condenarão à desordem, à ineficiência e à falta de oportunidades.

É hora de conclamar a ciência e os pesquisadores para o planejamento. Exigirá a sinergia e a cooperação de pesquisadores, universidades, governos e a sociedade civil.

A reconstrução das áreas afetadas pelas inundações no Rio Grande do Sul será uma oportunidade para criar novos empregos verdes e impulsionar a economia local de forma justa e inclusiva.

É importante que essa reconstrução seja feita de forma sustentável, utilizando materiais ecológicos e tecnologias inovadoras que contribuam para a mitigação das mudanças climáticas e a geração de renda para as comunidades afetadas.

Ao investir em planejamento urbano e regional de qualidade, poderemos construir cidades sustentáveis e inteligentes, onde a economia floresce, o meio ambiente é preservado e as comunidades prosperam.

Cidades inteligentes

Uma cidade inteligente é uma área urbana que utiliza tecnologias avançadas para melhorar a qualidade de vida de seus habitantes, aumentar a eficiência dos serviços públicos e promover a sustentabilidade.

Essas cidades são caracterizadas pela integração de sistemas de informação, comunicação e tecnologias da Internet das Coisas (IoT) para coletar e analisar dados em tempo real, permitindo uma gestão mais eficaz dos recursos.

Sistemas inteligentes de transporte podem otimizar o fluxo de tráfego e reduzir congestionamentos, enquanto redes elétricas inteligentes podem equilibrar a demanda de energia e promover o uso de fontes renováveis.

Além disso, a participação cidadã é incentivada por meio de plataformas digitais que facilitam a comunicação entre os residentes e o governo local.

As cidades inteligentes se diferenciam das tradicionais por sua abordagem proativa na resolução de problemas urbanos e pela capacidade de se adaptar rapidamente às mudanças e desafios.

Enquanto as cidades tradicionais tendem a responder reativamente às crises, as cidades inteligentes utilizam dados e tecnologia para antecipar e mitigar problemas antes que eles se agravem.

Mudanças na cidade e no campo

Para além das cidades, o planejamento da infraestrutura das áreas rurais é de suma importância, como estradas, pontes, armazenamento de grãos e acesso à internet, para facilitar o escoamento da produção e a integração das áreas rurais com as cidades; bem como o desenvolvimento do turismo rural, valorizando a cultura e a gastronomia local, gerando renda e oportunidades para as comunidades rurais.

Importa um planejamento que fortaleça a agricultura familiar, oferecendo crédito, assistência técnica e infraestrutura para que os pequenos agricultores possam aumentar sua produtividade e renda.

O planejamento e o desenvolvimento sustentável, que respeita o meio ambiente e o bem-estar animal, garantirá a qualidade dos produtos e o aumento da competitividade do mercado agropecuário brasileiro.

É essencial ainda a criação de políticas públicas que promovam a diversificação da produção agrícola, permitindo que os pequenos agricultores explorem novos mercados e se tornem mais adaptáveis às mudanças climáticas e às oscilações do mercado.

Incentivar práticas agroecológicas e a adoção de tecnologias sustentáveis são passos fundamentais para garantir a preservação do solo, da água e da biodiversidade, ao mesmo tempo que se aumenta a produtividade e a qualidade dos alimentos produzidos.

O apoio governamental nesse sentido pode incluir subsídios para a aquisição de tecnologias verdes, programas de capacitação e incentivos fiscais para a adoção de práticas agrícolas sustentáveis.

A criação de redes de cooperação entre agricultores, cooperativas e associações também pode ajudar a compartilhar recursos, conhecimento e a melhorar o acesso a mercados nacionais e internacionais.

Dessa forma, o planejamento urbano e rural se torna um catalisador para o desenvolvimento socioeconômico sustentável, fortalecendo a agricultura familiar e garantindo uma produção mais justa e equilibrada no Brasil.

O eficiente e eficaz planejamento urbano e regional no Rio Grande do Sul poderá ser um exemplo para todo o Brasil e para o mundo ao melhorar ou requalificar os territórios urbanos e rurais. Planejamento para o Rio Grande do Sul, já!

*Maria Alice Nunes Costa é doutora em Planejamento Urbano e professora da Universidade Federal Fluminense (UFF).

Este artigo foi publicado no The Conversation e reproduzido aqui sob a licença Creative Commons. Clique aqui para ler a versão original.

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BBC
Maria Alice Nunes Costa* - The Conversation
postado em 08/09/2024 10:47
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