Kamala Harris chega à Convenção Nacional Democrata, que começa hoje, em Chicago, na condição de estrela. A adversária de Donald Trump subirá ao palco do centro de convenções United Center na próxima quinta-feira para energizar uma campanha marcada pelo atraso — um dia antes, na quarta-feira, completa-se um mês da desistência do presidente Joe Biden de disputar a reeleição. Durante a convenção, os principais nomes do Partido Democrata discursarão (veja quadro) para alavancar a candidatura da ex-senadora, vista por muitos como um fenômeno, depois de um papel considerado modesto na condição de vice-presidente. Kamala deverá aceitar oficialmente a indicação do partido na próxima quinta-feira, quando encerrará o evento.
Uma pesquisa publicada nove dias atrás mostrou que Kamala tem a vantagem sobre Trump em três estados-chave na corrida à Casa Branca. Em Michigan, Pensilvânia e Wisconsin, a candidata democrata aparece com 50% das intenções de voto contra 46% para o republicano, segundo a sondagem do The New York Times e do Siena College. Assim que assumiu a posição de escolhida de Biden para concorrer à eleição, em 21 de julho, Kamala adotou um discurso agressivo contra Trump, associando o rival a um comportamento criminoso. Na quinta-feira passada, Biden se uniu à campanha e participou de um comício ao lado dela em Largo, no estado de Maryland. "Ela pode ser uma grande presidente", avisou o presidente dos Estados Unidos.
Professor de estudos de comunicação da Universidade do Kansas e especialista em retórica presidencial, Robert C. Rowland confirmou ao Correio que Kamala Harris energizou a base do Partido Democrata. "Isso ocorre principalmente entre os negros e os eleitores jovens, muitos dos quais não estavam entusiasmados com a ideia de um segundo mandato para Biden. Kamala aproveitou o mesmo sentimento de esperança de mudança que o ex-presidente Barack Obama utilizou para energizar os democratas", comentou.
"Grande momento"
De acordo com Rowland, a campanha de Kamala vive "um grande momento". "Seu discurso firme traz forte acusação contra Trump como alguém que não se importa com o cidadão comum. Ela também apresentou um plano econômico voltado a apoiar sua alegação de que a expansão das políticas do governo Biden levará a uma vida melhor para os americanos comuns", disse. O estudioso também considerou que o comício realizado ao lado de Biden, em Largo (Maryland), na última quinta-feira, teve simbolismo importante. "É como se fosse a passagem da tocha do presidente para a vice." Parte da agenda econômica de Kamala, divulgada na sexta-feira, busca preservar o poder de compra dos norte-americanos, a "devolver dinheiro aos americanos trabalhadores e de classe média" e a combater a crise habitacional no país.
Sally Nuamah — professora de ciência política, desenvolvimento humano e políticas sociais da Northwestern University (em Chicago) — admitiu ao Correio não ter dúvidas de que o anúncio de Kamala como candidata a presidente forneceu um impulso muito necessário à campanha democrata, depois do desgaste de Biden causado pela performance ruim no debate televisivo.
"De fato, Kamala virou a corrida eleitoral de cabeça para baixo. Ela injetou o entusiasmo e a esperança que faltavam na eleição", avaliou Nuamah. "Felizmente, sua campanha está tomando os passos para anunciar políticas importantes em relação ao aumento de preços e ao apoio à habitação. É provável que isso amplie ainda mais o entusiasmo em torno de uma perspectiva de vitória da chapa Kamala-Walz. Eles estão em uma boa posição para assegurar uma vitória em 5 de novembro", acrescentou. Antes de a desistência de Biden causar a reviravolta na disputa, Trump liderava em quase todas as pesquisas. Nem o atentado sofrido pelo republicano, em 13 de julho, parece ter provocado comoção suficiente a ponto de galvanizar apoio ao magnata e fazê-lo disparar nas sondagens.
A unidade do Partido Democrata em torno do nome de Kamala — com o aval dos ex-presidentes Barack Obama e Bill Clinton, e da ex-líder da Câmara, Nancy Pelosi — também ajudaram a vice de Biden em seu discurso de que a eleição deste ano é crucial para o futuro dos Estados Unidos. Os norte-americanos escolherão seu próximo presidente daqui a 78 dias. Antes, em 10 de setembro, Kamala e Trump vão protagonizar um momento histórico: o primeiro debate na televisão entre duas forças políticas antagônicas. Outros dois duelos ao vivo devem ocorrer, também em setembro. Será a chance de a democrata atestar sua popularidade e se aproximar do cargo mais importante do planeta.