América do Sul

EUA negam oferta de anistia a Maduro 'desde eleição'

Porta-voz do Departamento de Estado norte-americano desmente tratativas com o regime de Maduro depois de 28 de julho. Especialistas não descartam negociações. Presidente ordena mão de ferro contra oposição

O Departamento de Estado norte-americano negou ter conversado com o regime de Nicolás Maduro, "desde a eleição", para propor uma anistia ao presidente venezuelano. "Não fizemos nenhuma oferta de anistia a Maduro nem a outros desde a eleição", declarou Vedant Patel, porta-voz da chancelaria de Washington, um dia depois de o jornal Wall Street Journal ter publicado uma reportagem exclusiva segundo a qual os EUA mantêm negociações secretas com o Palácio de Miraflores para viabilizar o perdão a Maduro e a altos assessores que enfrentam indiciamentos no Departamento de Justiça.

No entanto, Patel reconheceu que os EUA "estão considerando uma série de opções para pressionar Maduro para que devolva a Venezuela à trajetória democrática, e o continuarão fazendo, mas é responsabilidade de Maduro e das autoridades eleitorais venezuelanas colocarem a limpo os resultados das eleições".

Na segunda-feira (12/8), Maduro sinalizou que está disposto a radicalizar ainda mais, em meio aos rumores sobre a suposta tratativa para anistia. Em reunião com assessores, no Palácio de Miraflores, o presidente ordenou que as forças de segurança utilizem "mão de ferro". "Exijo que todos os poderes do Estado atuem com maior celeridade, maior eficiência e mão de ferro contra o crime, contra a violência, contra os crimes de ódio, mão de ferro e justiça severa, firme, fazer cumprir os princípios constitucionais", declarou.

"Onde estão os autores intelectuais dessa violência? Onde estão os financiadores dessa violência? Onde estão os que a planejaram? (...) Onde está o senhor Edmundo González Urrutia? Por que foge? Por que teme? Por que não dá as caras? Onde está a fascista maior, a senhora (María Corina) Machado, que manda matar, manda assassinar?", questionou, em alusão aos dois líderes da oposição. A coalizão Plataforma Unitária Democrática insiste que Edmundo González venceu as eleições de 28 de julho.

Regulação das redes

Também ontem, a Assembleia Nacional da Venezuela, controlada pelo chavismo, anunciou que impulsionará a regulação das redes sociais por meio da reforma de uma lei contra o ódio usada com frequência para acusar opositores. "Vamos nos dedicar neste período de sessões à tarefa de aprovar um pacote de leis que o senhor (Maduro) solicitou para poder defender a nossa população das expressões de ódio social, do terrorismo e da disseminação de ideias fascistas e de ideias de ódio nas redes sociais", esclareceu Jorge Rodríguez, presidente do Parlamento.

Ángel E. Álvarez, cientista político e um dos coordenadores do Observatório da Democracia na América Latina da Associação de Universidades Confiadas à Companhia de Jesus na América Latina, afirmou à reportagem que a única possibilidade para uma transição democrática envolve um alívio das consequências negativas para Maduro e seus asseclas. "No âmbito das ciências políticas, chamamos isso de diminuição dos custos de tolerância da oposição. Qualquer resultado precisa ser criado com decisões concretas. No passado, depois do alívio de sanções impostas, as eleições transcorreram em condições muito adversas para a oposição."

Diretor do Centro de Estudos Políticos e de Governo da Universidad Católica Andrés Bello (em Caracas), Benigno Alarcon disse ao Correio ser muito difícil saber se houve um equívoco do Wall Street Journal ou se o Departamento de Estado norte-americano nega uma informação correta. "A verdade é que não me estranharia que Washington ofereça um acordo a Maduro que inclua alguma forma de garantia, possivelmente uma anistia. Se, neste momento, o Departamento de Estado nega essa possibilidade, talvez seja porque a conversação ocorra dentro do mais estrito sigilo ou porque tal negociação foi tentada, sem êxito. Pode ser inconveniente revelar essa informação, caso as negociações estejam em processamento", explicou. 

Em relação à ordem de Maduro para que as forças de segurança usem "mão de ferro" contra os protestos, Alarcon ressaltou que, ante a ilegitimidade, um governo somente pode governar pelo uso da força. "Maduro enfrenta uma de suas crises mais importantes. A Venezuela e o mundo questionam o resultado das eleições de 28 de julho. Tudo parece indicar que a oposição venceu, o que provoca muito ruído dentro das instituições do Estado", disse.

De acordo com Alarcon, Maduro tenta semear uma onda de terror, para que ninguém ouse questionar os resultados das urnas, seja por meio das redes sociais, seja em atos públicos ou em conversas privadas. "Ele espera que, dentro de poucas semanas, a situação se normalize e passe a ter pleno controle do poder", observou. O estudioso esclarece que, quando se tem a legitimidade em xeque, um governo tende a se fechar ainda mais em si mesmo. 

EU ACHO...

Arquivo pessoal - Benigno Alarcon, diretor do Centro de Estudos Políticos e de Governo da Universidad Católica Andrés Bello (em Caracas)

"Ante a falta de legitimidade, apesar de uma eleição considerada válida por todo o mundo, um governo somente pode governar pelo uso da força. Maduro enfrenta uma de suas crises mais importantes. A Venezuela e o mundo questionam o resultado do pleito. Tudo parece indicar que a oposição venceu, o que provoca muito ruído dentro das instituições do Estado."

Benigno Alarcon, diretor do Centro de Estudos Políticos e de Governo da Universidad Católica Andrés Bello (em Caracas)

 

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