A invasão em larga escala da Ucrânia pela Rússia foi planejada pelo Kremlin para ser uma operação militar curta e rápida.
A expectativa era que levaria alguns dias, algumas semanas no máximo, para a Rússia estabelecer o controle sobre o país vizinho.
Isso foi há quase dois anos e meio.
A guerra na Ucrânia continua. Não aconteceu como Moscou pretendia.
Mas aqui está a questão. Nos últimos 29 meses, ouvimos muitas vezes altos funcionários russos alegando que a operação está indo "conforme o planejado".
O presidente russo Vladimir Putin disse isso pela última vez em maio de 2024, apesar de tudo o que aconteceu nos dois anos anteriores: as pesadas baixas russas no campo de batalha, a destruição de vários navios de guerra russos no Mar Negro, ataques de drones feitos no interior da Rússia (até mesmo no próprio Kremlin), o bombardeio de cidades e aldeias russas perto da fronteira com a Ucrânia e o motim dos mercenários do Grupo Wagner que marcharam sobre Moscou.
Agora, há um novo elemento na lista: o ataque ucraniano transfronteiriço desta semana na região russa de Kursk.
Primeiro, um aviso: é difícil saber exatamente o que está acontecendo agora no distrito de Sudzha, na região de Kursk. Não está claro quantos soldados ucranianos estão lá, quanto território eles tomaram e qual pode ser seu objetivo final.
A edição de hoje do jornal russo Nezavisimaya Gazeta declarou: "Os eventos na região de Kursk estão envoltos na notória névoa da guerra."
Mas, mesmo na névoa, algumas coisas estão claras.
É evidente que o que está se desenrolando na região de Kursk é mais uma prova de que a guerra da Rússia na Ucrânia não ocorreu "conforme o planejado". Os eventos parecem ter pego a liderança política e militar da Rússia completamente de surpresa.
Não espere que Moscou admita isso.
Mais provavelmente, as autoridades russas usarão o ataque ucraniano para tentar unir o público russo em torno do governo e reforçar a narrativa oficial do Kremlin de que neste conflito a Rússia não é o agressor e que o país é uma fortaleza sitiada cercada por inimigos que estão conspirando para invadir e destruí-la.
Na realidade, foi a Rússia que lançou uma invasão em grande escala contra seu vizinho.
Há claramente uma grande diferença na linguagem. Quando a Rússia enviou suas tropas através da fronteira para a Ucrânia em fevereiro de 2022, o Kremlin chamou isso de "operação militar especial" e afirmou que a Rússia estava "libertando" cidades e vilas.
Moscou descreveu as tropas ucranianas avançando contra a Rússia como "um ataque terrorista" e "uma provocação".
O ataque das forças ucranianas na região de Kursk e os combates ferozes na região são um sinal de que as hostilidades estão se aproximando de casa. Mas isso vai virar a opinião pública russa contra a guerra?
Não necessariamente.
No ano passado, visitei Belgorod, uma região russa que, como Kursk, faz fronteira com a Ucrânia. O local estava sendo bombardeado do outro lado da fronteira. Todos que conheci me disseram que nada parecido havia acontecido antes da invasão em larga escala da Ucrânia pela Rússia: antes de fevereiro de 2022, tudo era paz e tranquilidade na região de Belgorod.
Mas, em vez de concluir que a "operação militar especial" havia sido um erro, a maioria das pessoas com quem conversei pediu que a Rússia intensificasse sua ação militar e avançasse mais profundamente no território ucraniano.
O ex-presidente russo Dmitry Medvedev está pedindo exatamente isso. Em uma publicação nas redes sociais nesta quinta-feira (8/8), ele escreveu:
"Podemos e devemos pegar mais terras da Ucrânia que ainda existem. (Devemos ir para) Odesa, para Kharkiv, para Dnipro, Mykolaiv. Para Kiev e em diante."
Mas Dmitry Medvedev não dá ordens. Vladimir Putin, sim. Agora, é esperar para ver como ele responde ao que têm sido dias dramáticos no sul da Rússia.
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