O presidente francês, Emmanuel Macron, pediu ao seu primeiro-ministro, Gabriel Attal, que permaneça no cargo “por enquanto, para garantir a estabilidade do país”, depois de nenhum partido sair com maioria absoluta na eleição para o parlamento do país.
Attal, que liderou a campanha eleitoral da aliança governista Ensemble! (Juntos!), entregou a sua demissão a Macron nesta segunda-feira (8/7), mas o presidente recusou.
Embora o Ensemble! tenha perdido muitos dos seus assentos nas eleições parlamentares de domingo, o partido ficou em segundo lugar — atrás da aliança de esquerda Nova Frente Popular, mas à frente da direita radical do Reunião Nacional, de Marine Le Pen, que despontava como favorita.
O resultado inesperado deixa a política francesa em um impasse, sem que nenhuma coalizão seja capaz de formar um governo por si só.
A Nova Frente Popular, bloco formado às pressas depois de Macron ter convocado as eleições legsilativas, argumenta que, por ter conseguido o maior número de cadeiras na Assembleia Nacional, possui o direito de escolher o primeiro-ministro.
Eles devem se reunir nesta segunda-feira (8/7) para considerar um nome para o cargo, mas não há nenhum candidato óbvio que satisfaça o bloco, formado pelo partido França Insubmissa (LFI), bem como os socialistas, ecologistas e comunistas.
Attal anunciou que renunciaria no domingo à noite, mas deixou em aberto a possibilidade de permanecer no cargo enquanto fosse necessário.
Era amplamente esperado que a sua demissão fosse rejeitada quando ele visitou o palácio presidencial na manhã de segunda.
O presidente Macron deverá voar para os EUA na terça-feira (9/7) para uma reunião da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan).
Embora ainda não esteja claro por quanto tempo ele precisa que Attal permaneça no cargo, o presidente deixou claro que a França precisa agora de um período de calmaria. Paris acolherá os Jogos Olímpicos a partir de 26 de julho.
O ministro das Finanças, Bruno Le Maire, alertou nesta segunda que o país enfrenta um risco imediato de crise financeira e declínio econômico.
Desde que os resultados foram divulgados, Macron tem procurado se manter afastado da disputa política.
Um comunicado divulgado no domingo à noite dizia que o presidente respeita a “escolha do povo francês” e espera o quadro completo do parlamento para tomar as próximas decisões necessárias.
Esperava-se que o Reunião Nacional (RN), de Marine Le Pen e Jordan Bardella, vencesse as eleições, depois de assumir uma significativa liderança no primeiro turno.
Macron convocou a votação parlamentar antecipada da França em resposta à vitória do RN nas eleições para o Parlamento da União Europeia há apenas um mês.
Mas mesmo que a sua votação tenha se mantido, com mais de 10 milhões de pessoas apoiando o RN e um grupo de aliados conservadores, eles não conseguiram chegar perto do número de assentos sugerido pelas pesquisas de opinião porque o comparecimento às urnas foi o maior em décadas.
Terminaram com 143 assentos, quando tinham como ambição alcançar a maioria absoluta de 289 na Assembleia Nacional de 577 assentos.
Bardella, protegido de Marine Le Pen e que era cotado para ser o novo primeiro-ministro francês em caso de uma vitória do RN, declarou que a união estratégica "não natural" e "desonrosa" entre esquerdistas e a coligação de Macron impediu a vitória de seu partido.
Os centristas e esquerdistas retiraram mais de 200 candidatos do segundo turno da votação para o legislativo para concentrar os votos nos nomes mais bem colocados (fossem do bloco de Macron ou da aliança de esquerda).
Mas nesta segunda-feira, Le Pen e Bardella tentaram olhar para o futuro.
“Em apenas dois anos, o progresso foi incrível e torna a vitória para nós inevitável a curto prazo”, disse Le Pen, agradecendo aos 10 milhões de eleitores que apoiaram o RN e os seus aliados.
Bardella estava determinado a se concentrar no seu futuro papel no Parlamento Europeu.
Ele agora vai liderar um novo grupo do Parlamento Europeu chamado Patriotas pela Europa, formado pelo primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán.
A Hungria assumiu a presidência da UE este mês e Orbán já irritou vários dos seus colegas europeus ao se tornar o primeiro líder da UE a visitar Vladimir Putin, da Rússia, em mais de dois anos.
E agora, quem será o primeiro-ministro?
A coligação de esquerda Nova Frente Popular (NFP) disse que planeja apresentar um candidato para primeiro-ministro antes do final desta semana.
“Por convenção, o presidente de França nomeia um primeiro-ministro vindo da formação parlamentar mais numerosa, e o NFP sinalizou que deveria ser eles”, explica o correspondente Hugh Schofield da BBC.
"E vários nomes estão no páreo", acrescenta. "Jean-Luc Mélenchon é amplamente o líder mais conhecido do NFP, é uma figura divisiva e, se no final for necessário chegar a acordos com o centro, não é o homem indicado para isso."
Além disso, Macron disse em várias ocasiões que não o aceitaria como primeiro-ministro.
Também se plantaram outras possibilidades com os líderes dos outros partidos do NFP, como Marine Tondelier, dos ecologistas, Olivier Faure, dos socialistas, o comunista Fabien Roussel e Raphaël Glucksmann, do pequeno partido Place Publique, que obtiveram bons resultados nos eleições europeias.
O ex-presidente François Hollande, eleito no domingo, poderia ter desempenhado um papel chave na abertura de contatos com o centro, mas disse que não quer ser o primeiro-ministro.
“A dificuldade é que todos esses nomes se juntaram ao programa do NFP há três semanas, quando se uniram para impedir a vitória da extrema direita”, explica o correspondente da BBC.
“Esse programa inclui a revogação das reformas de pensões do presidente Macron e a redistribuição da riqueza por meio de aumentos de impostos para os mais ricos.”
A pergunta agora é se esses compromissos serão abandonados como condição para compartilhar o poder.
Mas também há a possibilidade de alguns membros mais moderados do NFP tentarem separar a coalizão e se unir ao grupo de Macron para formar um governo de centro-esquerda.
Se não conseguir reunir uma liderança que funcione, o presidente Macron poderá pedir a um partido maior que encabece um governo minoritário.
Outra opção é nomear um governo com "nomes técnicos", mas é pouco provável que sobreviva por muito tempo.
Poderia gerar instabilidade política, especialmente porque o presidente não poderia convocar novas eleições parlamentares até dentro de um ano.
Assim, todos os partidos que se uniram para formar a Nova Frente Popular agora deverão decidir como podem e querem governar.
A nova Assembleia Nacional deverá ser realizada em 10 dias, pouco antes do início dos Jogos Olímpicos em 26 de julho. O questionamento agora é: haverá um acordo sobre quem será o novo primeiro-ministro ou levará mais tempo?
O diário de esquerda Libération resumiu o que está ocorrendo com o título: C'est Ouf ("É uma loucura").
*Com informações adicionais da BBC News Mundo, o serviço em espanhol da BBC
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