Aos 39 anos, J.D. Vance tem uma história de amor e ódio por Donald Trump. O amor aflorou depois de sua eleição ao Senado, representando o estado de Ohio, em 2022. Conquista possível graças ao apoio do magnata republicano à sua candidatura. O ódio surgiu durante os anos em que Trump esteve à frente da Casa Branca (2017-2021). Vance chegou a dizer que era "um cara que nunca estará a favor de Trump", descreveu o agora aliado como "nocivo" e "idiota" e admitiu o temor de que ele pudesse ser o "o Hitler dos Estados Unidos".
Formado em direito na renomada Universidade de Yale, despertou para a carreira política em 2018, quando planejou um assento no Senado. No entanto, a tentativa somente veio, com sucesso, três anos depois. Escolhido por Trump como candidato a vice, o republicano tornou-se o rosto da chamada "nova direita" nos Estados Unidos.
Vance mantém alinhamento com Trump em relação a questões como a imigração ilegal e o gerenciamento da economia. No entanto, defende posições mais ultraconservadoras no que diz respeito ao aborto e se opõe firmemente aos esforços dos EUA em ajudarem a Ucrânia na guerra contra a Rússia.
Em um aguardado discurso, na quarta-feira, durante a Convenção Nacional Republicana, em Milwaukee (Wisconsin), J.D. Vance rasgou elogios à "visão extraordinária" de Trump e rendeu um tributo à avó, que foi proprietária de 19 armas de fogo. Também prometeu valorizar o trabalhador. "Acabou a importação de mão de obra estrangeira. Lutaremos pelos cidadãos americanos, seus empregos e salários", declarou o colega de chapa de Trump. "Protegeremos os salários dos trabalhadores americanos e vamos impedir que o Partido Comunista Chinês construa a sua classe média nas costas dos cidadãos americanos."
Em relação à imigração ilegal, ele acusou o governo de Joe Biden de ter "inundado o país com milhões de imigrantes ilegais". Vance enalteceu a posição do candidato à presidência republicano depois do atentado de 13 de julho, em Butler (Pensilvânia). "Achei que tivéssemos acabado de perder um grande presidente, o que seria terrível para o nosso país (...) Por acaso Trump estava aborrecido? Convocou uma união nacional, pediu calma, mostrou liderança, e a mídia continua dizendo que querem que alguém baixe o tom. Atiraram em Donald Trump e ele baixou o tom. Isso é o que faz um verdadeiro líder", comentou.
Cientistas políticos de Ohio, berço eleitoral de J.D. Vance, avaliaram o impacto de sua nomeação como candidato ao terceiro vice-presidente mais jovem da história dos EUA e um dos menos experientes. Richard Gunther, professor emérito de ciência política da Universidade Estadual de Ohio, vê J.D. Vance como um político jovem e articulado. "Ele é autor de um livro best-seller que apresenta uma crítica ao Estado de bem-estar social. Vance seria um candidato formidável em um debate vice-presidencial e atrairia os eleitores mais jovens", explicou ao Correio.
Logo depois da desistência de Joe Biden, no domingo, Vance partiu para o ataque contra o líder democrata. O republicano disse que Biden é "o pior presidente da história dos Estados Unidos" e responsabilizou a vice Kamala Harris, potencial candidata à Casa Branca, "por todos esses fracassos".
“Distração positiva” na campanha
Diretor do Escritório de Estudos de Comunicação Política da Universidade de Ohio, Jerry Miller disse ao Correio que a escolha de Donald Trump por J.D. Vance pode agradar aos eleitores que apoiam ou estão inclinados a apoiar a candidatura do ex-presidente republicano. “O apoio vocal mais recente de Vance aumentou sua visibilidade. Em comparação com outros candidatos conhecidos, o senador pode ser visto como um político outsider, com laços familiares e as lutas cotidianas reais e vividos por muitos norte-americanos”, observou. Ele acredita que a presença de Vance na chapa republicana poderá funcionar como uma “distração positiva” para Trump, ante os desafios jurídicos e políticos que ele continuar a enfrentar.
Para Jerry Miller, na condição de relativamente novato na política, J.D. Vance pode se beneficiar por ser um outsider. “No entanto, sua experiência militar, sua educação e o livro que escreveu — Hillbilly Elegy: A Memoirof a Family and Culture in Crisis (“Elegia caipira: memórias deuma família e cultura em crise”)—, com uma atraente história desua infância, podem ser benéficos para Trump”, presumiu.
O especialista sustenta que Vance, cuja mãe está sóbria há 10 anos, se destaca pela hábil oratória. “Muitas dessas características, como ser um recém-chegado na política e apresentar uma história familiar que foi criticada por deturpar e depreciar uma região geográfica, podem tornar-se problemáticas para ele.”Por sua vez, Paul Beck — professor emérito de ciências comportamentais e sociais e professor de ciência política da Universidade Estadual de Ohio — disse não ver Vance adicionando ou subtraindo muitos pontos da campanha de Trump.
"Ohio é um estado onde Trump venceria facilmente, mesmo sem Vance como vice. Talvez Vance acrescente um pouco de sua juventude à campanha, o que o coloca na posição de herdeiro do movimento MAGA (“Make America Great Again”). Com certeza, ele surgirá como um importante pré-candidato à nomeação do Partido Republicano para as eleições de 2028”, afirmou, por e-mail. Beck aponta a juventude, a inteligência e o papel como líder da classe trabalhadora, como as qualidades de Vance. E cita a falta de experiência como o principal defeito do senador. Ele não interpreta as críticas do candidato a vice a Trump, anos atrás, como fator comprometedor para a campanha republicana. “Trump parece despreocupado quanto a isso. Vance chegou tão longe no apoio ao magnata republicano, que as críticas anteriores parecem irrelevantes.”
Saiba Mais
EU ACHO...
"A medida extrema com que J.D. Vance mudou suas atitudes em relação a Trump reflete um oportunismo sem princípios, o qual poderia ser usado pelos democratas para atacá-lo, especialmente ao citarem trechos de discursos anteriores, quando era crítico do ex-presidente."
Richard Gunther, professor emérito de ciência política da Universidade Estadual de Ohio
"Vance respondeu aos comentários negativos sobre Trump, mas, provavelmente, precisará continuar esses esforços, à medida que a campanha avança. Em muitos aspectos, o senador Vance é um dos muitos antigos críticos com quem Trump teve de interagir para fins reais e políticos. Esta tensão parece fazer parte dos estilos de gestão do ex-presidente."
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