O reformista Masoud Pezeshkian foi eleito novo presidente do Irã ao superar seu oponente conservador de linha dura, Saeed Jalili.
Pezeshkian, de 70 anos, foi declarado vencedor ao receber 53,3% dos mais de 30 milhões de votos contados no segundo turno do pleito presidencial. Já Jalili recebeu 44,3%.
O segundo turno aconteceu depois que nenhum dos candidatos recebeu a maioria dos votos no primeiro turno realizado em 28 de junho — que teve comparecimento às urnas de 40% do eleitorado, o mais baixo desde a fundação da República Islâmica do Irã em 1979.
O pleito foi convocado depois que o presidente anterior, Ebrahim Raisi, morreu em um acidente de helicóptero em maio. Outras sete pessoas morreram na queda.
Ao saber dos resultados, Pezeshkian agradeceu a seus partidários e pediu a todos os iranianos que o acompanhem na dura tarefa que tem pela frente.
"As eleições terminaram e este é só o começo da nossa aliança", escreveu em sua conta na rede social X.
"O difícil caminho que temos pela frente não será fácil exceto pela companhia, empatia e confiança de vocês. Eu estendo minha mão a vocês e juro que não os abandonarei", disse.
Vídeos publicados nas redes sociais mostraram festas de rua pela vitória de Pezeshkian em Teerã e em várias outras cidades do país.
As imagens mostravam muitos jovens dançando e balançando a bandeira verde, que é característica de sua campanha, entre carros que buzinavam.
Reforma sem ruptura
Pezeshkian, que é cirurgião cardíaco e parlamentar, criticiou a polêmica polícia moral do Irã e chamou atenção por prometer tentar acabar com o fim do isolamento iraniano no mundo.
O presidente eleito pediu "negociações construtivas" com as potências ocidentais sobre a renovação do acordo nuclear de 2015 — no qual o Irã acordou frear seu programa nuclear em troca por um alívio de sanções ocidentais.
No entanto, Pezeshkian não pode ser considerado uma pessoa que defende uma ruptura. Pelo contrário, sua carreira deixa claro o seu apego pelo líder supremo do país, o aiatolá Ali Khamenei.
"Sou um 'principista' (pessoa que defende os conceitos que sustentam a República Islâmica) e a partir destes princípios é que buscamos reformas", disse ele, durante a campanha.
Pezeshkian também não é novato na política, pois já foi parlamentar durante cinco legislaturas.
Em sua passagem pelo Parlamento, ele gerou polêmica por defender a descriminalização das drogas.
"Desde que o governo não se transforme no provedor das drogas, não conseguimos frear o vício", disse.
Entre 2001 e 2005, ele foi ministro da Saúde durante o segundo governo de Mohammad Khatami (1997-2005), que é considerado o primeiro presidente reformista da República Islâmica.
Khatami apoiou a candidatura de seu antigo ministro, assim como fez Mehdi Karrubi, um clérigo dissidente que em 2009 tentou chegar à Presidência do Irã nas questionadas eleições daquele ano, e que desde então está em prisão domiciliar, segundo o serviço de notícias em farsi da BBC.
Terceira tentativa
Pezeshkian já tentou se eleger presidente em 2013 e 2021. Na primeira tentativa, retirou sua candidatura para apoiar outro candidato. Na segunda, ele foi desqualificado da disputa pelo Conselho dos Guardiões, um órgão formado por 12 clérigos e juristas.
O motivo foi seu apoio aos protestos que estouraram contra os resultados do pleito de 2009.
Além de reduzir as tensões com o Ocidente e buscar a reinserção do Irã no palco internacional, o presidente eleito prometeu a seus compatriotas que buscará implementar "reformas estruturais" que permitam o país atingir um desenvolvimento mais justo e equilibrado.
Já seu rival, Saeed Jalili, defende a continuidade do status quo e considera que as propostas do vencedor fazem parte de um modelo falido. Ele fez parte da equipe de negociadores nucleares do Irã e tem forte apoio das comunidades mais religiosas do país.
Jalili é conhecido por sua postura anti-Ocidente de linha dura e oposição a restaurar o acordo nuclear, que segundo ele viola as "linhas vermelhas" do Irã.
Mais pessoas votaram no segundo turno, realizado na sexta-feira (5/7), do que no primeiro turno, quando a participação havia sido a mais baixa desde a Revolução Islâmica de 1979, em meio a um descontentamento generalizado.
Até agora a participação em urnas está em 49% — nove pontos a mais do que no primeiro turno, segundo autoridades eleitorais.
Alguns que se abstiveram no primeiro turno votaram em favor de Pezeshkian agora, para evitar que Jalili ganhasse.
Eles temem que uma vitória de Jalili pudesse levar a maior tensão com o Ocidente, algo que provocaria mais isolamento e novas sanções.
Ambos os candidatos se submeteram a investigações do Conselho de Guardiões para poderem seguir com suas campanhas.
Esse processo eliminou 74 candidatos da corrida — incluindo diversas mulheres.
O Conselho é criticado por grupos de direitos humanos por desqualificar candidatos que não são suficientemente leais ao regime.
Desconfiança
Após anos de distúrbios civis que culminaram em protestos contra o governo em 2022 e 2023, muitos jovens iranianos de classe média desconfiam profundamente do establishment. No passado, eles se negaram a votar.
Nas redes sociais iranianas, a hashtag "minoria traidora" viralizou — com grupos pedindo que eleitores não votem em nenhum dos candidatos.
Mas o aiatolá Ali Khamenei rejeitou as acusações de que a baixa participação nas urnas seja uma rejeição ao modelo teocrático do Irã vigente desde 1979.
"Há motivos [pela baixa participação nas urnas] e os políticos e sociólogos examinarão eles, mas se alguém pensa que quem não votou está contra o establishment, está totalmente equivocado", disse.
Em uma declaração incomum, Khamenei reconheceu que alguns iranianos não aceitam a situação atual.
"Estamos escutando e sabemos o que nos dizem, e não é como se estivessem escondidos e não fossem vistos", diz o aiatolá.
No Irã, os meios de comunicação estimularam as pessoas a votar.
O jornal reformista Sazandegi disse: "O futuro está ligado aos seus votos". O Hamminah disse: "Agora é a sua hora".
O Hamshahri, dirigido pelo governo de Teerã, publicou um artigo com o título "Cem motivos para se votar". O jornal da emissora Jaam-e Jam disse que o Irã estava "aguardando seu povo".
* Com reportagem do serviço persa da BBC.
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