Mais de 50 chefes de Estado e de governo participam da Cúpula da Paz convocada pelo presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, neste fim de semana. Próximo à cidade de Lucerna, na Suíça, os representantes iniciaram, ontem, as tratativas sobre pautas de segurança nuclear e alimentar envolvendo o conflito com a Rússia, que completou dois anos em fevereiro.
No início do encontro, Zelensky manifestou esperança de alcançar “uma paz justa o mais breve possível”. “Acredito que testemunharemos a história sendo escrita aqui. Tudo o que for consenso na cúpula fará parte do processo de paz”, declarou o líder da Ucrânia. Porém, o convite para participar do debate não foi enviado a Moscou, o que gerou críticas.
Líderes de alguns países, como Colômbia e China, argumentaram que a reunião parecia mais um alinhamento frente à guerra, formando “blocos”, e optaram por cancelar a presença no evento. Lula também não aceitou o convite, por considerar inviável chegar a um acordo de paz sem a parte russa, mas enviou um representante.
Em contraponto, a Suíça afirma que o objetivo da cúpula é dar os primeiros passos e pavimentar um caminho para a paz que, mais tarde, envolverá também a Rússia. O encontro está sendo realizado no luxuoso resort Burgenstock e se encerra hoje.
Isolamento
Às vésperas da conferência, o presidente russo, Vladimir Putin, surpreendeu ao anunciar condições para autorizar uma ordem de cessar-fogo e negociar. Em discurso televisionado, o líder do Kremlin exigiu a retirada das tropas do disputado leste e sul da Ucrânia e a renúncia da adesão à Otan. Zelensky rejeitou o “ultimato”, comparando o modus operandi de Putin ao do ditador Adolf Hitler, e deu prosseguimento ao plano de paz com outras nações.
Ao Correio, Petro Burkovsky, analista da Fundação de Iniciativas Democráticas Ilko Kucheriv, em Kiev, afirmou que há duas tarefas e uma prioridade na cúpula. “A primeira tarefa é consolidar os poderes que apoiam a Ucrânia a longo prazo, o que se reflete no plano de ação preparado para assinatura.”
Já a segunda tarefa, conforme o especialista, é implementar uma nova forma de trabalho para a maioria dos membros da ONU, que são Estados não nucleares, para se defenderem contra coerção e intimidação por qualquer poder nuclear hostil. “A prioridade é isolar a Rússia como um Estado agressor e impedir que ela arruíne a ordem mundial baseada em regras, transformando a multipolaridade em um mundo dividido em esferas de influência de poderes nucleares e bem armados.”
O presidente ucraniano afirmou, ontem, que irá apresentar propostas de paz à Rússia assim que a comunidade internacional chegar a um consenso. “Quando o plano de ação estiver sobre a mesa, aceito por todos e transparente para o povo, então iremos comunicá-lo aos representantes da Rússia, para que possamos realmente acabar com a guerra”, declarou.
Apoio americano
Depois de quase um ano de estagnação, nos últimos meses, a Ucrânia teve de abandonar dezenas de posições no front diante da ofensiva russa com tropas maiores e mais bem equipadas. Porém, após a redução do avanço da Rússia, Zelensky espera inverter essa tendência a partir da nova cúpula e da reunião concluída na Itália, com líderes do G7, da qual saiu com um empréstimo de 50 bilhões de dólares (R$ 268 bi) a Kiev, financiado com juros dos ativos russos congelados.
Putin descreveu a medida como “roubo” e prometeu justiça. Por outro lado, Zelensky frisou que o empréstimo seria usado “tanto para defesa quanto para reconstrução”. No mesmo fórum, ainda assinou com o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, um acordo bilateral de segurança que implicará o fornecimento de ajuda militar e treinamento às tropas de Kiev.
Devido a compromissos eleitorais, Biden é o único líder do G7 que não planeja viajar da Itália, onde o grupo se reuniu, à vizinha Suíça, para a Cúpula da Paz. A vice-presidente, Kamala Harris, foi em seu lugar e anunciou contribuições significativas em apoio à Ucrânia: 500 milhões de dólares (2,68 bilhões de reais) em novos financiamentos para assistência energética e mais de 379 milhões de dólares (2,3 trilhões de reais) em ajuda humanitária.
América Latina
Apesar da desistência do presidente colombiano, Gustavo Petro, o evento conta com uma grande representação latino-americana, incluindo os presidentes Javier Milei, da Argentina, Gabriel Boric, do Chile, e o equatoriano Daniel Noboa.
Volodymyr Zelensky aproveitou a ocasião para conversar com Milei, entregando uma honraria por sua atuação em defesa da soberania e independência ucraniana. “Agradeci ao presidente Milei por participar na Cúpula da Paz. Agradecemos também a ampla presença dos países latino-americanos. Tenho certeza de que a história se lembrará deste longo caminho para a paz”, publicou no X (antigo Twitter).
Outros aliados da Rússia no grupo Brics, como a África do Sul e a Índia, também enviaram representantes, com exceção da China.