Nas redes sociais, moradores do Quênia comemoravam o que seria "o maior protesto da história do país". Centenas de milhares de pessoas saíram às ruas da capital, Nairóbi, para se manifestar contra um projeto de aumento de impostos. A multidão rompeu o cordão de isolamento policial e invadiu as instalações do Parlamento, pouco depois de os deputados aprovarem emendas ao texto, que deve ser votado antes de domingo. O presidente do país, William Ruto, prometeu reprimir com "firmeza" a "violência e a anarquia". Pelo menos cinco quenianos morreram nos confrontos com as forças de segurança. Testemunhas relataram a ação de franco-atiradores.
À noite, o governo de Ruto anunciou que pediu a mobilização do Exército queniano para lidar com a situação. "Daremos uma resposta completa, eficaz e rápida aos acontecimentos de traição de hoje (ontem)", declarou o presidente. "Não é normal, nem concebível, que criminosos que fingem ser manifestantes pacíficos possam desatar o terror contra o povo (...) e esperar ficar impunes", acrescentou, alertando também "os planejadores, financiadores, orquestradores e cúmplices da violência e anarquia!".
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Auma Obama, irmã do ex-presidente dos Estados Unidos Barack Obama, foi atingida pro gás lacrimogêneo enquanto participava dos protestos, em Nairóbi. "Eu não consigo enxergar mais...", disse à emissora de tevê CNN, sem controlar a tosse. Mais tarde, Auma apareceu com o rosto coberto com um pano branco. "Eu apenas vim defender os direitos das pessoas. Temos apenas cartazes e bandeiras, e fomos atingidos com gás", criticou a ativista.
Os incidentes ocorreram no centro financeiro da capital, palco da terceira manifestação em oito dias do movimento "Occupy Parliament" (Ocupar o Parlamento), que se opõe a um projeto de orçamento para 2024-2025 que prevê a instituição de novos impostos. Várias organizações não governamentais, entre elas a Anistia Internacional Quênia, afirmaram que, além dos cinco mortos, 31 pessoas ficaram feridas, sem especificar as cidades com registro de baixas.
Jornalistas da agência de notícias France-Presse (AFP) viram três corpos inertes no chão em meio a poças de sangue nas proximidades do Parlamento, onde um edifício foi incendiado. A principal coalizão de oposição, Azimio, acusou o governo de "desencadear sua força bruta contra os filhos de nosso país".
Os Estados Unidos; mais de uma dezena de países europeus; o chefe da Comissão da União Africana —Moussa Faki Mahamat —; e o secretário-geral da ONU, António Guterres, afirmaram estar "profundamente preocupados" com a situação. A mídia local divulgou que outras manifestações ocorreram em diferentes cidades do Quênia. Além disso, a conexão de internet sofreu "importantes" perturbações no país, indicou a NetBlocks, entidade de vigilância da rede de telecomunicações no mundo.
Moody Kimwele, de 51 anos, foi às ruas com o filho de 15 anos para denunciar a carga crescente de impostos desde o início da presidência de Ruto, em setembro de 2022. "O que fizeram com o dinheiro? (...) Não vemos nada do que arrecadaram", criticou. "Ruto nunca cumpriu suas promessas (...) Estamos cansados. Que ele vá embora", declarou Stephanie Wangari, desempregada de 24 anos.
Saiba Mais
Mobilização contra o governo
O movimento "Occupy Parliament" surgiu nas redes sociais após a apresentaçã, em 13 de junho, do projeto de orçamento para 2024-2025, que prevê a instituição de novos impostos, incluindo um IVA de 16% sobre o pão e uma taxa anual de 2,5% para veículos particulares. Para o governo do Quênia, os impostos são necessários para dar margem de manobra ao país, muito endividado. Inicialmente liderado pela "Geração Z" (pessoas nascidas após 1997), o movimento se transformou em um protesto mais amplo contra a política do presidente William Ruto, que se mostrou disposto a dialogar.
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