Oriente Médio

Tensão entre aliados: Estados Unidos criticam Israel por pedido de armas

Por meio de vídeo e de mensagem em rede social, Netanyahu cobra ajuda militar de Washington e critica retenção de munições. Casa Branca reage e afirma que declarações do premiê são "profundamente decepcionantes e irritantes"

Palestino e filhos caminham entre prédios arrasados por bombardeios, em Khan Yunis, no sul da Faixa de Gaza: destruição generalizada        -  (crédito: Eyad Baba/AFP)
Palestino e filhos caminham entre prédios arrasados por bombardeios, em Khan Yunis, no sul da Faixa de Gaza: destruição generalizada - (crédito: Eyad Baba/AFP)

A relação entre Estados Unidos e Israel, dois aliados históricos, sofreu novo desgaste com um vídeo e uma declaração de Benjamin Netanyahu, imediatamente refutados pela Casa Branca. "Estou disposto a sofrer ataques pessoais desde que Israel receba dos Estados Unidos os equipamentos de que precisa na guerra pela sua existência", escreveu, nesta quinta-feira (20/6), o primeiro-ministro israelense na rede social X, o antigo Twitter. Em vídeo divulgado na véspera, Netanyahu fez um pronunciamento em inglês, no qual relatou ter dito ao secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, que julgava "inconcebível" o fato de Washington reter armas e munições para Israel. 

"A verdade é que não sabemos do que ele está falando", reagiu a porta-voz da Casa Branca, Karine Jean-Pierre. Conselheiro de Segurança Nacional do presidente Joe Biden, John Kirby avaliou os comentários de Netanyahu como "profundamente decepcionantes e certamente irritantes" e lembrou a quantidade de apoio oferecida ao Estado judaico. "Meu Deus, este presidente colocou aviões de combate no ar, em meados de abril, para ajudar a derrubar várias centenas de drones e mísseis, (...) disparados do Irã para Israel. Não existe outro país que tenha feito mais, ou continuará a fazer, do que os EUA para ajudar Israel a se defender", declarou Kirby. "A ideia segundo a qual de alguma forma tínhamos parado de auxiliar Israel com suas necessidades de autodefesa é absolutamente imprecisa."

O governo Biden sustenta que estaria apenas revisando um carregamento de bombas de 2 mil libras (907kg), com medo de que Israel as utilize em áreas densamente povoadas da Faixa de Gaza. Nos últimos meses, a Casa Branca tem feito reiteradas críticas ao grande número de baixas civis no enclave palestino. Em 259 dias de guerra, o Ministério da Saúde de Gaza — controlado pelo Hamas — divulgou que 37.431 palestinos morreram, dos quase 75% seriam mulheres e crianças. Mais de 10 mil pessoas ainda estariam sob os escombros. As informações não podem ser verificadas de forma independente. 

Vice-reitor da Universidade de Tel Aviv e especialista em temas do Oriente Médio, Eyal Zisser lembrou ao Correio que Netanyahu joga com a política. "Tudo aqui se trata de política interna. Não é algo real, e os Estados Unidos dão a Israel o que ele necessita", comentou. "O primeiro-ministro quer usar o tema como uma questão doméstica, a fim de se apresentar como um herói que defende Israel, mesmo frente aos norte-americanos. É um político cínico", criticou. Questionado se acredita que Netanyahu terá sucesso nessa estratégia, Zisser disse ser difícil prever. "Assim como no Brasil, líderes populistas israelenses têm apoio básico, não importa o quão ruim eles sejam."

O estudioso não descarta que Biden ceda aos apelos de Netanyahu e envie novos carregamentos de armas. "Estamos a menos de cinco meses das eleições. Biden não precisa criar problemas com apoiadores de Israel nos EUA", disse Zisser. "Mesmo criticado pela esquerda, ele deu munições ao lobby judeu. O establishment militar norte-americano também defende que ele envie armamentos para Israel."

As cobranças de Netanyahu por um papel mais incisivo no fornecimento de armas coincidem com uma afirmação polêmica de Daniel Hagari, porta-voz das Forças de Defesa de Israel (IDF), e com a escalada de tensão com o movimento fundamentalista xiita libanês Hezbollah. Segundo Hagari, o grupo extremista palestino Hamas é "uma ideia". "O Hamas é um partido político, está enraizado nos corações do povo. Qualquer pessoa que pensar que podemos eliminar o Hamas está errada", ressaltou. Ele disse que as autoridades israelenses podem desenvolver algo que seja capaz de substituir o Hamas. Em 14 de dezembro do ano passado, Basem Naim, chefe do Departamento Político do Hamas, concedeu uma entrevista ao Correio e usou o mesmo raciocínio de Hagari. "O Hamas não foi construído para ser destruído. É uma ideia, uma ideologia. Está profundamente enraizado na sociedade palestina", advertiu Naim.

Hezbollah

Israel respondeu, mais uma vez, a fogo de artilharia procedente do Líbano e "eliminou" um comandante do Hezbollah em um "bombardeio direcionado". As IDF também confirmaram o bombardeio contra uma base de "lançamentos de mísseis terra-ar" do movimento libanês financiado pelo Irã. Na quarta-feira, o líder máximo do Hezbollah, xeque Hassan Nasrallah, fez um raro pronunciamento à nação libanesa, no qual advertiu que "nenhum lugar de Israel estará a salvo" dos foguetes. "O inimigo sabe muito bem que nos preparamos para o pior. (...) Israel sabe que temos uma lista de alvos e temos a habilidade de atingi-los."

Calor matou 1.081 fiéis em Meca

Mais de mil muçulmanos morreram durante o hajj, a peregrinação anual a Meca, na Arábia Saudita. Entre os 1.081 mortos, estão 658 egípcios — 630 estavam em situação irregular no reino, que distribui vistos de peregrinação por meio de um sistema de cotas. Vídeos divulgados nas redes sociais mostram corpos cobertos com lenços nas ruas. A temperatura atingiu 51,8 graus Celsius na Grande Mesquita de Meca. 

A indonésia Dajeng Wanna Pute, 25 anos, contou ao Correio que começou o hajj em 28 de maio. "Para me proteger do extremo calor, tenho usado sombrinha, uma toalha pequena, óculos de sol e spray de água, além de protetor solar", afirmou. "Vi muitas pessoas se queixarem de dor de cabeça."

Morador de Medina, a 450km dali, Muhammad Zubair, 30, disse à reportagem que os termômetros marcaram 47 graus. "As pessoas que morreram no hajj entraram no país sem permissão para a peregrinação. Na condição de turistas, não tinham supervisão de nenhuma organização para lhes fornecer alimentos, alojamento e transporte", explicou. (RC)

 

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postado em 21/06/2024 06:00
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