Depois de 842 dias de guerra e de dezenas de milhares de soldados russos mortos — segundo o Estado-Maior da Ucrânia —, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, anunciou as condições para uma paz negociada na ex-república soviética. "As tropas da Ucrânia devem se retirar completamente das regiões da República Popular de Donetsk, da República Popular de Luhansk, Kherson e Zaporizhzhia", declarou o chefe do Kremlin, em discurso a funcionários de alto escalão do Ministério das Relações Exteriores da Rússia.
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"Assim que Kiev (...) começar a retirada efetiva das tropas (das regiões anexadas), e assim que notificar que está abandonando seu planos de adesão à Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), daremos imediatamente, no mesmo minuto, a ordem de cessar-fogo e iniciaremos negociações", acrescentou, ao prometer uma saída "segura e desimpedida" das forças ucranianas. O pronunciamento de Putin ocorreu na véspera da abertura da Cúpula Global da Paz, com a presença de dezenas de líderes mundiais, no resort de Bürgenstock, na Suíça.
A Ucrânia rejeitou as exigências de Putin, comparou-as ao estilo do líder nazista, Adolf Hitler, e as classificou como "ultimato". "Hitler fez a mesma coisa quando disse 'Dê-me uma parte da Tchecoslováquia e ficaremos aqui', mas são mentiras", disse o presidente Volodymyr Zelensky ao canal de notícias italiano SkyTG24, à margem da cúpula do G7 na Itália, antes de embarcar rumo à Suíça.
Putin criticou a cúpula deste fim de semana como uma "estratégia para desviar a atenção" dos culpados pela guerra, que, segundo ele, seriam o Ocidente e Kiev. "Sem a participação da Rússia e sem um diálogo honesto e responsável conosco, é impossível chegar a uma solução pacífica na Ucrânia", alertou. O líder russo garantiu que 700 mil soldados de seu país combatem na Ucrânia.
A Cúpula Global da Paz contará com 57 chefes de Estado e de governo. Entre os mandatários, confirmaram presença o próprio Zelensky, os presidentes Javier Milei (Argentina), Gabriel Boric (Chile), Gustavo Petro (Colômbia), Daniel Noboa (Equador), Emmanuel Macron (França), Marcelo Rebelo de Sousa (Portugal), e os premiês Justin Trudeau (Canadá), Rishi Sunak (Reino Unido), Pedro Sánchez (Espanha), além do chanceler Olaf Scholz. Os EUA enviarão à Suíça a vice-presidente Kamala Harris. O Brasil estará representado pela embaixadora do Brasil na Suíça e em Liechtenstein, Cláudia Fonseca Buzzi.
Hipocrisia
Olexiy Haran, professor de política comparativa da Universidade Nacional de Kiev-Mohyla, afirmou que é preciso compreender o nível de hipocrisia de Putin. "Basicamente, ele proclamou a anexação de quatro regiões da Ucrânia, mas não as controla totalmente. Por isso, o presidente russo exige a retirada das tropas ucranianas de Kherson, que foi reconquistada pelos nossos soldados; e de Zaporizhizhia, que nunca esteve totalmente sob posse da Rússia. Não se trata de uma proposta de Putin para pôr fim à guerra; ele apenas repete suas ideias sobre a anexação da Ucrânia. As condições de Putin são um reflexo de seu desejo de destruir o Estado ucraniano", disse ao Correio.
Em relação à demanda para que a Ucrânia abandone suas aspirações de se tornar membro da Otan, Haran lembra que Putin atacou a ex-república soviética mesmo quando ela era um Estado neutro a anexou a Península da Crimeia, em 2014. "Naquela época, os ucranianos não queriam ser parte da aliança militar ocidental. Se a Ucrânia, futuramente, recusar a adesão à Otan e permanecer neutra, Putin voltará a atacar o nosso país", advertiu. "Nós éramos um Estado neutro e, mesmo assim, fomos atacados."
Para o estudioso de Kiev, o fracasso da Rússia na invasão se explica pelo fato de que os ucranianos sacrificam a própria vida para defender o país. "O Exército russo demonstrou não ser eficiente e começou a bombardear civis e a infraestrutura energética, além de sitiar centrais nucleares", comentou. Haran destaca a importância da Cúpula Global da Paz, na Suíça. "Ela trará diferentes Estados à mesa para intensificar a pressão sobre a Rússia."
Ex-Conselheiro do presidente do Comitê do Parlamento da Ucrânia e chefe da ONG Primeira Fundação Ucraniana Internacional para o Desenvolvimento, Mykola Volkivskyi disse à reportagem que o discurso de Putin foi construído como uma resposta aos acordos de segurança assinados durante a cúpula do G7, na Itália. "Putin também aproveitou a última chance de assustar os participantes da Cúpula Global da Paz. Também lançou um aviso antes da cúpula da Otan, que ocorrerá em Washington, entre 9 e 11 de julho."
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