O grito ecoa pelo hospital, na Faixa de Gaza. “Meu filho! Eu não quero nada, quero levá-lo para casa!. Não, não, minha alma!”, chora a mãe palestina, suja de poeira. Ahmed não voltará para casa. Morreu em um bombardeio israelense. Em outro vídeo, um homem diante dos escombros da escola mantida pela URWA — a agência das Nações Unidas que presta assistência aos refugiados no Oriente Médio — mostra o dedo arrancado de uma criança, em Nuseirat (centro). O ataque, ocorrido na quinta-feira (6), deixou 35 mortos. Em outra gravação, uma mulher nina um bebê envolto em uma mortalha ensanguentada. Pelo menos 13 mil crianças palestinas foram mortas desde 7 de outubro, segundo o Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo grupo extremista Hamas — 35% do total de vítimas.
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Nesta sexta-feira, a ONU colocou Israel na lista de Estados e grupos armados que cometeram violações contra crianças. Além do Estado judeu, entraram no documento o próprio Hamas e a Jihad Islâmica, outra facção terrorista. O fato de os dois grupos terem sido equiparados a Israel na lista revoltou o governo de Benjamim Netanyahu.
Segundo o jornal The Jerusalem Post, o documento diz respeito aos eventos ocorridos em 2023 e será debatido pelo Conselho de Segurança em 18 dias. "Estou totalmente chocado e enojado por essa decisão vergonhosa e imoral, que somente vai ajudar os terroristas e recompensar o Hamas", advertiu o embaixador de Israel na ONU, Gilad Erdan.
A vida do ortodontista Jamal Naim, 54 anos, mudou por completo às 22h40 de 6 de janeiro. Em questão de segundos, ele perdeu a mãe, Ramsia, 87 anos; três netos — Lara, de 9 meses; Leya, 3 anos; Tayseer, 3 anos e meio — e três filhas (Batul, 16; Samah, 29; e Shaima, 28) durante bombardeio israelense à casa do cunhado, em Deir Al-Balah (centro). Daquela noite, além da ferida aberta no coração, ficaram as sequelas de dedos esmagados e as cicatrizes na cabeça e no ombro. "Desde 1948, Israel matou muitas famílias e crianças, durante todas as guerras. Nas intifadas, vimos isso ocorrer diariamente, com soldados usando menores como escudos humanos. É um modo de punir o povo palestino", disse Naim ao Correio, por telefone.
Ele considera "uma coisa boa" a inclusão de Israel na "lista da vergonha". "Mas não é o bastante. A comunidade internacional precisa fazer algo mais forte para impedir Israel de matar palestinos. Temos cerca de 37 mil mortos, a maioria deles eram inocentes, como minha mãe, minhas três filhas e meus três netos", comentou o cirurgião-dentista. O corpo de Tayseer ainda está sob os escombros da casa. "Eles encontraram apenas as pernas dele. Não sabemos quando o encontraremos. Não podemos cavar os destroços porque é muito perigoso. Além disso, os bombardeios prosseguem", acrescentou. Samah e Shaima também eram dentistas.
Jamal viveu na Alemanha por 17 anos e retornou à Faixa de Gaza em 2006, onde fundou a primeira faculdade de odontologia do território palestino. Hoje, acompanha duas filhas e uma neta, que ficaram feridas e recebem tratamento médico em Doha, capital do Catar. Ele foi submetido a uma cirurgia no ombro, na segunda-feira passada. A filha Jannat, 13, precisará de uma prótese para o quadril. "Aqui, em Doha, há 1.400 palestinos feridos, a maioria crianças. Muitas foram amputadas." Perguntado sobre o futuro de Gaza, ele admite: "É uma questão muito difícil". "O que sei é que, assim que for possível, estarei lá para ajudar a reconstruir Gaza. É nossa terra e não permitiremos à ocupação permanecer, de forma segura, em nossas ruas e casas."
Ataque à escola
Por telefone, Jonathan Fowler, porta-voz da UNRWA em Jerusalém Oriental, afirmou ao Correio que 35 pessoas morreram durante os bombardeios de quinta-feira ao campo de refugiados de Nuseirat, no centro da Faixa de Gaza. "Não temos informações sobre quem morreu e a idade das vítimas. Mas, quero sublinhar algo: havia 6 mil palestinos abrigados na escola da UNRWA. Temos visto repetidas violações do direito humanitário internacional durante a guerra. As instalações da ONU estão sinalizadas com bandeiras e deveriam estar protegidas de ataques ou de serem usadas para propósitos militares", disse. "Desde o início da guerra, 108 prédios das Nações Unidas foram bombardeados."
EU ACHO...
"Repetidamente, na Faixa de Gaza, as crianças representaram uma proporção substancial dos mortos e feridos. Como principal fornecedor de educação para refugiados palestinos, a UNRWA está particularmente preocupada com o destino das crianças nessa guerra. O impacto devastador nas crianças aumenta a necessidade de responsabilização total pelas ações que custaram as suas vidas e, para os sobreviventes, tiveram um impacto sem precedentes no seu bem-estar físico e mental. A inclusão de Israel na lista da ONU é um passo importante rumo a essa responsabilização."
Jonathan Fowler, porta-voz da UNRWA em Jerusalém Oriental
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