O governo peruano descartou, nesta sexta-feira (17), revogar o decreto que classifica a transexualidade como um "transtorno mental", apesar do forte protesto de grupos que defendem a diversidade sexual contra o uso oficial de uma antiga classificação da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Grupos LGBTQIAPN+ convocaram um protesto na tarde desta sexta-feira, em Lima, para exigir a revogação de uma norma que, segundo eles, incentiva a discriminação e a violência contra seus membros.
"É um decreto que nos faz retroceder três décadas, quando a homossexualidade foi 'descatalogada' pela OMS (...) Não podemos viver em um país onde somos considerados doentes", disse à AFP Jorge Apolaya, porta-voz do Coletivo Marcha do Orgulho de Lima.
A manifestação coincide com o Dia Internacional contra a Homofobia, Transfobia e Bifobia.
Um porta-voz do ministério da Saúde justificou a validade do decreto e alegou que o seu cancelamento impediria que os afiliados ao sistema de saúde, especialmente o privado, tivessem acesso a mais serviços de saúde mental.
"O decreto será mantido porque não podemos retirar o direito ao cuidado", disse à AFP Carlos Alvarado, diretor do ministério.
"Graves consequências"
Os grupos de diversidade sexual vão contra a norma emitida pelo Ministério da Saúde em 10 de maio basicamente porque ela adota uma antiga classificação de doenças da OMS.
Segundo o porta-voz oficial, "houve uma leitura e uma interpretação erradas" do decreto.
A transexualidade "não é um problema de saúde mental e concordamos com isso, a tal ponto que existem vários documentos ministeriais que o especificam", disse Alvarado.
O decreto atualiza o Plano Essencial de Saúde (PEAS), lista de benefícios mínimos a que tem direito um afiliado de saúde pública, mista ou particular. Porém, utilizou uma classificação antiga da OMS, conhecida como CID-10, com a descrição que colocava os grupos LGBTQIPAN+ em alerta.
A partir de 2022, a organização deixou de caracterizar a transexualidade como um transtorno mental. Alvarado insistiu que a intenção do governo era expandir os cuidados de saúde mental para tratamentos ambulatoriais, psiquiátricos e endocrinológicos derivados da identidade de gênero, que antes do decreto não eram cobertos, principalmente por planos particulares.
"A ideia é fazer a transição para a CID-11 o mais rápido possível", disse Alvarado, sem especificar se isso implicaria a emissão de um novo decreto posteriormente.
Para os grupos LGBTQPIAN+, enquanto a norma permanecer em vigor, os seus membros estão expostos a "graves consequências", como à criticadas terapias de conversão, equiparadas pela ONU à tortura.
"Não devemos esquecer que as terapias reparadoras consistiam em tratamentos (como) eletrochoque, banhos de gelo", comentou o porta-voz do Coletivo Marcha do Orgulho de Lima.
O Peru não reconhece o casamento ou a união civil entre homossexuais, nem permite que pessoas trans incluam a sua identidade de género nos seus documentos.
Em um artigo publicado em seu site, a ONG Human Rights Watch (HRW) também chamou a atenção para os efeitos "deste decreto tendencioso e não científico".
"Patologizar oficialmente as pessoas LGBT (...) pode prejudicar seriamente os esforços para melhorar a proteção dos direitos baseados na orientação sexual e na identidade de gênero", alerta a organização.
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