Oriente Médio

Guerra na Faixa de Gaza: Indignação por matança de palestinos se espalha

Polícia de Paris expulsa dezenas de estudantes pró-Palestina da principal faculdade de ciências políticas da França. Canadá e Austrália também registram protestos. Hamas decide retomar negociações sobre trégua

Manifestante é escoltado por policiais franceses durante repressão a protesto na Sciences Po, em Paris:  -  (crédito: Miguel Medina/AFP)
Manifestante é escoltado por policiais franceses durante repressão a protesto na Sciences Po, em Paris: - (crédito: Miguel Medina/AFP)

As manifestações pró-palestinos dentro de universidades cruzaram o Oceano Atlântico e chegaram à França, Austrália e Canadá. Nesta sexta-feira  (3), a gendarmeria — força militar francesa encarregada de funções policiais — expulsou estudantes que faziam um protesto pacífico no hall de entrada do prédio da Sciences Po, a faculdade de Ciências Políticas de Paris. Depois de serem removidos, sob aplausos da população, os universitários se dirigiram até a Praça do Panteão, aos gritos de "Longa vida à luta do povo palestino!" e "Estamos aqui pela honra da Palestina e de todos os assassinados".

De acordo com o jornal Le Monde, a União de Estudantes Judeus da França organizou um protesto para contrapor aos atos contrários à guerra na Faixa de Gaza. Desde 17 de abril, atos semelhantes se espalharam por dezenas de instituições de ensino superior nos Estados Unidos. A repressão policial levou 2,3 mil pessoas à prisão. Na quinta-feira (2), forças de segurança desmantelaram um acampamento de manifestantes na Universidade da Califórnia (Ucla) e deteve 230 alunos e funcionários. 

"Somos jovens. Vemos as imagens de Gaza e dói nada podermos fazer", disse ao jornal espanhol El País Warda, estudante de 22 anos da Universidade de Sorbonne. Dez alunos da Sciences Po começaram uma greve de fome em solidariedade aos moradores da Faixa de Gaza. Apesar de menores em escala, em relação aos protestos nos Estados Unidos, as manifestações na França têm forte simbolismo e indicam o potencial de espalhamento do movimento. 

No Canadá, estudantes montaram acampamento na Universidade McGill, em Montreal. Na quarta-feira, a direção do câmpus ordenou o desmantelamento das barracas. Até a manhã de ontem, os protestos continuavam, sem uma intervenção da polícia. A indignação com a guerra na Faixa de Gaza e com as mortes de dezenas de milhares de civis mobilizou grupos pró-palestinos na Universidade de Sydney, na Austrália. 

Diretor do Programa de Estudos do Genocídio da Universidade Yale (em New Haven, Connecticut), o norte-americano David Simon afirmou ao Correio que os protestos estudantis enviaram um sinal ao governo do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, de que o apoio global não é tão sólido como se imaginava nos dias que sucederam o massacre de 7 de outubro. Na ocasião, cerca de 2 mil extremistas do movimento fundamentalista islâmico Hamas invadiram o sul de Israel por terra, mar e ar, mataram mais de mil pessoas e sequestraram centenas. A retaliação israelense em Gaza deixou mais de 34,6 mil palestinos mortos, em sua maioria crianças e mulheres. "Os desdobramentos no Tribunal Penal Internacional (TPI), mesmo que não passem de rumores, mudaram o rumo em termos de levar Israel a negociar", acrescentou Simon. 

Karim Khan — procurador do TPI — advertiu que todas as tentativas de impedir as investigações de sua equipe sobre a ofensiva de Israel em Gaza e as tentativas de intimidação devem cessar imediatamente. Na semana passada, informações não oficiais divulgadas por sites de notícias indicavam que o TPI preparava mandados de prisão contra autoridades de Israel, incluindo Netanyahu. Além das manifestações em universidades no exterior, o premiê israelense enfrenta protestos dentro do próprio país para que o seu governo — uma aliança de partidos judeus nacionalistas, de extrema direita e ultraortodoxos — negocie a libertação dos reféns do Hamas em troca da suspensão dos combates. 

Cessar-fogo

O Hamas enviará, neste sábado (4), uma delegação ao Cairo para retomar as negociações sobre o cessar-fogo na Faixa de Gaza, com um "espírito positivo". "A delegação do Hamas viajará para continuar as negociações. Ressaltamos o espírito positivo com que a liderança do Hamas tratou a proposta de cessar-fogo recebida recentemente e estamos indo ao Cairo com o mesmo espírito para chegar a um acordo", declarou o movimento, por meio de um comunicado. O plano de trégua inclui o fim dos combates por 40 dias e a troca de reféns israelenses mantidos em Gaza desde 7 de outubro por palestinos presos em Israel.

Segundo o comunicado, o Hamas e as "forças de resistência palestinas" estão "determinados a chegarem a um acordo que atenda às demandas do povo para a completa cessação da agressão, a retirada das forças de ocupação, o retorno das pessoas deslocadas, a reconstrução de Gaza e um acordo sério de troca (de reféns por prisioneiros)". Mais cedo, uma autoridade do Hamas acusou Netanyahu de tentar obstruir as negociações, ao ameaçar uma invasão iminente a Rafah (sul). A Organização Mundial da Saúde (OMS) alertou sobre o risco de um banho de sangue na cidade. 

DEPOIMENTO

"Enfrentamos agitadores sionistas"

"Esses protestos visam resistir à cumplicidade das instituições e do governo dos EUA no genocídio israelense contra os palestinos. O Acampamento de Solidariedade Palestina da Universidade da Califórnia (Ucla) apresentou as demandas para que a instituição ponha fim à repressão no câmpus, exija um cessar-fogo permanente e imediato, e acate as diretrizes do boicote acadêmico a Israel. Tais demandas estão alinhadas ao movimento de Boicote, Desinvestimento e Sanções, uma ação não violenta para pressionar Israel a cumprir com o direito internacional.

Benjamin Kersten, estudante da Universidade da Califórnia e líder do movimento Voz Judia pela Paz
Benjamin Kersten, estudante da Universidade da Califórnia e líder do movimento Voz Judia pela Paz (foto: Arquivo pessoal )

O objetivo é parar o envio de armas e dinheiro a Israel, que têm sido usados no genocídio contra os palestinos, resultando em mais de 35 mil mortos; 1,9 milhão de deslocados; 1,5 milhão sob risco de fome iminente; além de danos físicos e psicológicos incalculáveis. O Acampamento de Solidariedade Palestina enfrentou contramanifestantes e agitadores. Não fosse por eles, e pela inação da universidade, o acampamento teria sido pacífico.

Os momentos mais tensos foram quando agitadores sonistas arremessaram projéteis e tentaram derrubar as barricadas, enquanto os estudantes se apegavam aos princípios de não violência. A polícia invadiu o acampamento, lançado incansavelmente granadas de efeito moral, disparando balas de borracha e atacando os estudantes."

Benjamin Kersten, estudante da Universidade da Califórnia (Ucla) e líder do movimento Voz Judia pela Paz

 

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postado em 04/05/2024 06:00
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