O ataque de segunda-feira (1/4) ao consulado iraniano em Damasco, na Síria — que vários governos atribuem a Israel — deixou pelo menos sete mortos, incluindo uma importante figura militar do regime dos aiatolás.
Trata-se de Mohamed Reza Zahedi, um general de 63 anos com um longo histórico de serviços prestados ao Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica (IRGC, na sigla em inglês), o poderoso exército paralelo do Irã — e o mais numeroso dentro das suas Forças Armadas.
Zahedi era um alto comandante da Força Quds, o braço paramilitar de elite da Guarda Revolucionária, responsável pelo relacionamento com governos e grupos aliados de Teerã.
O braço direito dele, o general Mohamed Hadi Haji-Rahimi, também morreu no ataque surpresa que aviões israelenses provenientes das Colinas de Golã — segundo informou o Ministério das Relações Exteriores da Síria — teriam realizado contra o consulado iraniano no distrito de Mezzeh, em Damasco.
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O ataque destruiu o prédio de vários andares do consulado próximo à embaixada iraniana, que não foi danificada.
O general assassinado era o comandante da Força Quds na Síria e no Líbano, onde desempenhou um papel crucial na prestação de ajuda militar tanto ao regime de Bashar al-Assad quanto à organização político-militar Hezbollah.
A seguir, analisamos como esta temida organização opera — e qual era o papel de Zahedi.
Fundamental na política externa iraniana
A Força Quds é um importante instrumento da política externa iraniana que muitos especialistas descrevem como uma combinação das forças de operações especiais e da agência de inteligência americana (CIA, na sigla em inglês).
Ela surgiu de fato como o braço das relações exteriores durante a expansão do Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica.
Seu nome significa Jerusalém em farsi e árabe, cidade que seus combatentes prometeram “libertar”.
A organização opera secretamente e, às vezes, abertamente em várias partes do mundo.
Está ligada ao grupo Hezbollah, no Líbano, e às milícias xiitas, no Iraque e no Afeganistão.
A Força Quds foi apontada como autora intelectual de vários ataques mortais, como o atentado contra os quartéis em Beirute em 1983, no qual morreram 241 fuzileiros navais americanos, 58 soldados franceses e seis civis libaneses.
Tanto os EUA como a União Europeia (UE) acusaram a mesma de distribuir armas na Síria para ajudar o regime de Bashar al-Assad a reprimir rebeldes no país árabe.
Washington também apontou a Força Quds como responsável ??por armar e treinar o Talebã no Oriente Médio.
Esta organização se concentra em apoiar e assessorar, em vez de participar diretamente das incursões militares.
Isso permite ao Irã negar qualquer participação em operações militares e insurgentes, evitando assim um conflito direto com os EUA.
Entre 5 mil e 10 mil membros
Devido à forma como opera, é impossível obter números exatos sobre o tamanho de suas tropas. Há, no entanto, estimativas que variam de 5 mil a mais de 10 mil membros.
Eles são recrutados de acordo com suas habilidades e por seu grau de lealdade à República Islâmica.
Mas, uma vez que a principal função da Força Quds é ajudar a estabelecer milícias aliadas e forças de combate em outros países, o número de recrutados não reflete sua enorme capacidade de influência e ação.
Desde 1979, seu objetivo tem sido combater os inimigos do Irã e ampliar a influência do país na região.
Para tentar combater seu crescente poder de ação, o governo do ex-presidente americano, Donald Trump, classificou este braço paramilitar como uma Organização Terrorista Estrangeira (FTO, na sigla em inglês).
Na época, Trump afirmou que a Força Quds era o “principal mecanismo do Irã para cultivar e apoiar” grupos terroristas no Oriente Médio.
O governo iraniano negou, por sua vez, em diversas ocasiões apoiar organizações criminosas — e acusa os EUA de serem os culpados pelas turbulências que abalam atualmente o Oriente Médio .
Em janeiro de 2020, os EUA assassinaram o então comandante-chefe da Força Quds, o influente general iraniano Qasem Soleimani, em um ataque preciso e direcionado com drones.
O assassinato de Soleimani foi um duro golpe para o regime do aiatolá Ali Khamenei, que respondeu com ataques às bases americanas no vizinho Iraque, aumentando a tensão militar entre os dois países.
Soleimani foi substituído pelo general Esmail Qaani, de 66 anos, que é o atual líder da Força Quds.
Mohamed Reza Zahedi
O assassinato de Zahedi é o de maior escalão na Força Quds e na Guarda Revolucionária desde o de Soleimani em 2020.
O general desempenhou um papel fundamental ao ser o principal interlocutor entre o Irã e o Hezbollah, a organização político-militar libanesa considerada terrorista pela União Europeia, pelos EUA e parte da comunidade internacional.
Nascido em 2 de novembro de 1960, ele ingressou na Guarda Revolucionária em 1980, durante a guerra Irã-Iraque (1980-1988), da qual participou ativamente.
Ele comandou a 44ª Divisão Qamar Bani Hashem entre 1983 e 1986, e a 14ª Divisão Imam Hussein até 1991.
Entre 1998 e 2002, comandou pela primeira vez a Força Quds no Líbano, onde prestou todo tipo de assistência ao Hezbollah.
Mais tarde, entre 2005 e 2008, liderou as forças terrestres do Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica — e foi responsável pela base Thar-Allah em Teerã, encarregada da segurança na capital iraniana.
Em 2008, Zahedi regressou à Força Quds e, até seu assassinato na segunda-feira, esteve à frente desta organização na Síria e no Líbano.
De acordo com especialistas, ele desempenhou um papel crucial no fornecimento de armas e conhecimentos técnicos ao Hezbollah, assim como na coordenação de operações contra as forças israelenses no sul do Líbano.
Além disso, coordenava a ajuda militar que o braço estrangeiro do Exército iraniano presta ao regime de Bashar al Assad — e liderava a Unidade 18000 do Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica, que opera na Síria em colaboração com o Exército local para contrabandear armas, munições e equipamento militar.
Desde 2010, Zahedi estava na lista de terroristas e seus financiadores sujeitos a sanções do Departamento do Tesouro americano por atuar como um “link com o Hezbollah e os serviços de inteligência sírios” e “garantir o envio de armas” para a organização islâmica radical do Líbano.
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