A pouco menos de seis meses das eleições em que tentará retornar à Casa Branca, o republicano Donald Trump se tornou, ontem, o primeiro ex-presidente dos Estados Unidos a enfrentar um julgamento criminal. O magnata está no banco dos réus em um processo no qual é acusado de esconder um suborno à ex-atriz pornô Stormy Daniels para comprar seu silêncio sobre uma relação extraconjugal e, assim, proteger sua campanha de 2016, em que derrotou Hillary Clinton. A ação penal é uma das quatro a que Trump responde e pode influenciar seu destino político.
"Isso é um ataque aos Estados Unidos. Nunca aconteceu nada parecido", disse o milionário conservador ao chegar à Suprema Corte de Manhattan, em Nova York, dando ao primeiro dia de julgamento contornos políticos. Lá, Trump foi saudado por simpatizantes, que foram prestar apoio com cartazes e bandeiras. Também estavam no local manifestantes contrários ao ex-presidente.
Ainda nos corredores do tribunal, o ex-presidente, candidato único do Partido Republicano nas eleições de 5 de novembro, declarou-se alvo de uma "perseguição política". "O país é comandado por um homem incompetente, que se envolveu muito neste assunto. É um ataque contra um adversário político. Por isso, me sinto muito honrado de estar aqui", enfatizou.
Eram 9h30 quando Donald Trump entrou na sala 1530 do tribunal com um rosto tenso e sério. Vestindo terno azul, camisa branca e gravata vermelha, e com pequeno broche da bandeira americana posicionado em sua lapela, o 45º presidente dos Estados Unidos se levantou, em silêncio, quando o juiz de origem colombiana Juan Merchan declarou o início da sessão.
"Queremos que seja feita justiça, é tudo o que queremos", declarou Merchan, em tom sereno. Trump manteve o olhar fixo no magistrado, que classificou como "corrupto" repetidamente nos últimos dias em sua rede Truth Social, após ver rejeitado o pedido de afastamento de Merchan do processo.
Avisos
Após um debate sobre as provas a serem apresentadas, o juiz se dirigiu ao ex-presidente para informá-lo de que "tem o direito de estar presente no julgamento, compreende?". Trump assentiu com a cabeça. Merchan também advertiu o magnata de que ele poderá ser acusado por desacato e ser preso se interromper os debates. O julgamento deve durar entre seis e oito semanas.
Aos 77 anos, o republicano terá seu destino decidido por 12 jurados e seis suplentes, que começaram a ser selecionados, ontem, entre 500 candidatos. Dos primeiros 96 que entraram na sala de julgamento, mais de 50 disseram que não seriam imparciais e foram dispensados antes do fim do primeiro dia.
Escolhidos por sorteio, os postulantes são identificados por um número para ocultar seus nomes por razões de segurança e devem completar um questionário minucioso sobre suas preferências políticas, os meios pelos quais se informam, e sua imparcialidade e capacidade para definir o destino de um dos políticos mais influentes dos últimos tempos, tanto para os Estados Unidos quanto para o resto do mundo. A seleção deve durar vários dias.
Segundo a acusação, Trump ocultou o pagamento US$ 130 mil (em torno de R$ 674 mil) a Stormy Daniels. O magnata não foi denunciado pelo repasse do dinheiro em si, mas por disfarçá-lo como despesas legais da Trump Organization, a empresa da família, o que pode resultar em uma pena de até quatro anos de prisão.
No processo, intitulado "O povo do estado de Nova York contra Donald J. Trump", o milionário enfrenta 34 acusações por supostamente falsificar documentos que, segundo os promotores, foram usados para ocultar os pagamentos. O ex-presidente nega não só que tenha tido relações sexuais com Daniels como também qualquer acordo fraudulento de confidencialidade com a ex-atriz de filmes adultos.
A sentença, no entanto, não seria um obstáculo para sua candidatura nas corrida à Casa Branca, quando enfrentará pela segunda vez o democrata Joe Biden, nem para que exerça a presidência, caso seja eleito. "Nossos inimigos querem tirar minha liberdade porque nunca permitirei que tirem a de vocês", declarou a seus eleitores no sábado, em um comício na Pensilvânia.
Fora do tribunal, isolados pela polícia, alguns apoiadores se manifestaram a favor do político cujos problemas legais, longe de afetar sua corrida pela presidência, parecem reforçá-la ainda mais. Shawn, um dos simpatizantes que compareceram, afirmou: "Estamos chegando a um ponto realmente ridículo. Estão tentando impedir que um oponente político ganhe", afirmou à AFP.
Já Jamie Bauer, uma crítica ao ex-presidente, argumentou, pelo contrário, que a "interferência eleitoral" ocorreu no pagamento pelo silêncio "para encobrir informações que ele considerava prejudiciais para sua campanha".
Outros processos
Trump responde ainda a outros três processos criminais pendentes, que totalizam 91 acusações. Ele deve enfrentar dois julgamentos — um na Geórgia e outro em um tribunal federal em Washington, pelas supostas tentativas ilegais de reverter os resultados das eleições presidenciais de 2020. A terceira ação está relacionada com a posse de documentos confidenciais quando deixou a Casa Branca, em 2021.
A realização dos julgamentos desses casos antes das eleições presidenciais é incerta, após vários adiamentos devido a recursos apresentados pelos advogados do republicano.
No início deste mês, o ex-presidente pagou uma fiança de US$ 175 milhões (R$ 884 milhões) perante a Justiça dos Estados Unidos, para evitar o embargo de suas propriedades após ter sido condenado em um caso de fraude financeira, segundo documentos judiciais.
Em meados de fevereiro, Donald Trump foi multado em US$ 454 milhões (R$ 2,29 bilhões) com seus filhos Eric e Don Jr. por irregularidades dentro de seu império imobiliário, a Trump Organization.
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