A retirada das tropas israelenses de Khan Younis, anunciada no domingo (7/4), foi recebida com surpresa generalizada, embora o exército e o governo israelense tenham se esforçado por frisar que a decisão não tem grande significado.
Mas para um mundo que assistiu à intensidade dos bombardeios de Israel, a ideia de que resta agora apenas uma brigada em todo o enclave parece significar uma grande mudança na guerra.
E o anúncio foi feito em uma data marcante – no mesmo dia do marco sombrio de seis meses desde que o ataque liderado pelo Hamas a Israel desencadeou esta sangrenta fase do conflito entre Israel e os palestinos.
“Não dê muita importância a isso”, disse um porta-voz do gabinete do primeiro-ministro israelense aos jornalistas no dia seguinte.
Avi Hyman sublinhou quão pequenas são as distâncias na região e que as Forças de Defesa de Israel (IDF, por suas siglas em inglês) continuariam, portanto, sendo capazes de tomar todas as medidas que considerassem necessárias, com ou sem tropas dentro de Gaza.
Como se quisessem provar isso, poucas horas mais tarde, o exército israelense disse que "eliminou" um importante agente do Hamas, Hatem al-Ghamri, num ataque aéreo.
A mídia israelense, no entanto, respondeu de forma muito diferente.
O correspondente Ariel Kahana, do amplamente acessado e direitista jornal Israel Hayom, vinculou a retirada das tropas à pressão sobre o governo israelense para chegar a um acordo de cessar-fogo com o Hamas.
"As razões formais apresentadas pelos porta-vozes israelenses para parar a guerra eram de natureza operacional, mas qualquer pessoa inteligente pode ver que o momento dificilmente é uma coincidência. Antes de conversas críticas, a decisão israelense foi concebida - sem dizer explicitamente - para sinalizar ao Hamas que Israel está sendo muito aberto."
Ben Caspit, do jornal mais centrista Maariv, foi ainda mais contundente na sua interpretação da medida.
“Se você fosse perguntar a Netanyahu (e ele foi questionado), isso foi feito como preparação para a prometida operação em Rafah… Há uma segunda explicação, que foi relatada em todo o mundo em todos os idiomas possíveis. A retirada da 98ª Divisão de Khan Yunis está ligada às negociações para um acordo de cessar-fogo."
“Os meios de comunicação sérios em todo o mundo dizem que a conversa entre o presidente Biden [dos EUA] e o primeiro-ministro Netanyahu [de Israel] foi dramática. Biden levou Netanyahu a entender que ele não está a um passo de vitória, mas a um passo de destruição final da aliança entre Israel e os Estados Unidos."
Pelo menos em público, Netanyahu continuou escalando a retórica sobre Rafah, dizendo que uma data foi marcada para a operação. Mas o seu ministro da Defesa, Yoav Gallant, foi mais pacificador, dizendo aos recrutas do exército que agora é um momento "oportuno" para fazer um acordo com o Hamas.
Entretanto, Gallant sublinhou que um cessar-fogo não representaria o fim da guerra: “Haverá decisões difíceis e teremos que pagar o preço para recuperar os reféns e depois voltar aos combates”.
É provável que os combates continuem, como afirma Gallant, mas a forma que assumirão poderão mudar.
Com as críticas à forma como a guerra tem sido liderada crescendo por parte do aliado mais poderoso de Israel, os EUA, a retirada das forças no sul de Gaza parece provavelmente ter como objetivo, em parte, mostrar à administração Biden que Israel está ouvindo suas preocupações sobre as mortes de civis e a escassez de ajuda que ameaçam a vida em Gaza.
O fim dos bombardeios que reduziram cidades a escombros, como foi visto nas últimas imagens de Khan Younis, pode contribuir de alguma forma para restaurar o habitual apoio de Washington a Israel.
Porém, isso será sem dúvida testado novamente caso as "operações futuras" – que justificam, segundo o exército israelense, o descanso e a preparação que muitos soldados estão tendo no momento – signifiquem uma ofensiva total a Rafah, onde Israel acredita que as forças militares remanescentes do Hamas estão baseadas, entre milhões de palestinos desalojados.
Pode haver uma crença no governo e nas forças israelenses de que um número significativo dessa população, espremida em abrigos que mal funcionam, pode começar a voltar às suas casas agora que a maior parte das tropas israelenses deixou a região.
Mas o que os palestinos encontram ao voltar para Khan Younis é uma devastação em massa, com muitas das casas reduzidas a escombros.
Os moradores têm descrito que a segunda maior cidade de Gaza agora é inabitável. Alguns dizem que ela não é adequada nem mesmo para animais.
O chefe da agência das Nações Unidas para os refugiados palestinos, a UNRWA, alertou os palestinos que estavam considerando ir para Khan Younis sobre os riscos de munições não detonadas estarem ali.
Philippe Lazzarini disse à BBC que pode haver milhares de dispositivos nos escombros.
Portanto, um grande êxodo de Rafah, que tornaria qualquer operação israelense contra o Hamas menos provável de causar mais um número catastrófico de vítimas civis, pode estar fora de cogitação para muitas pessoas.
Mas as “novas operações” também podem estar relacionadas com o conflito na fronteira norte de Israel contra o Hezbollah, no Líbano.
Esse confronto tem aumentado continuamente desde 7 de outubro. E há receios de que possa se tornar muito mais intenso na sequência do suposto ataque israelense em Damasco, que matou vários comandantes da poderosa Guarda Revolucionária do Irã, na semana passada.
O Hezbollah é um aliado próximo do Irã e tem correspondido à retórica vinda de Teerã, prometendo vingança. O exército israelense afirmou recentemente que reforçou substancialmente o seu comando do norte. Portanto, isso também pode ter desempenhado um papel na retirada das tropas de Gaza.
Quaisquer que tenham sido os verdadeiros motivos - e é provável que haja uma série de fatores interligados -, é improvável que o envolvimento militar de Israel em Gaza esteja perto de chegar ao fim, com os combatentes do Hamas já tendo mostrado a capacidade de se reagruparem em áreas que foram submetidas aos ataques mais pesados das IDF.
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