Aos 61 anos, Basem Naim — palestino nascido em Beit Hanoun, no nordeste da Faixa de Gaza — é um dos principais líderes do grupo extremista islâmico Hamas. Chefe do Departamento Político em Gaza e membro do Comitê Político, o médico formado na Alemanha e com pós-doutorado em cirurgia ocupou o posto de ministro da Saúde entre 2007 e 2012. Com inglês fluente, Naim respondeu, por notas de áudio via WhatsApp, a perguntas enviadas pelo Correio. Ele culpou o premiê Benjamin Netanyahu pela dificuldade de chegar a um cessar-fogo e afirmou que os próprios palestinos decidirão se o Hamas formará parte ou não do novo governo de Gaza. "O Hamas é parte do tecido social e político palestino", declarou.
Por que é tão difícil chegar a um cessar-fogo na Faixa de Gaza?
O principal obstáculo para chegarmos a um acordo de cessar-fogo é Benjamin Netanyahu e seu grupo de direita. Netanyahu não planeja alcançar um cessar-fogo, pois sabe que, no dia seguinte à trégua, haverá comitês de investigação e ele poderá ir para a prisão. A carreira política dele acabaria imediatamente. Por isso, ele está muito relutante e utiliza as negociações para prolongar a guerra contra Gaza e enviar delegações sem preparo necessário para tratativas sérias. Apelamos por um cessar-fogo completo e sustentável, pela retirada total das forças israelenses da Faixa de Gaza e pelo retorno das pessoas que foram expulsas de suas casas e vilarejos depois de 7 de outubro. Também pedimos uma grande operação de socorro e de reconstrução da Faixa de Gaza. Ao mesmo tempo, o engajamento em um acordo tácito para a troca de prisioneiros. Infelizmente, Netanyahu tem se recusado a aceitar um cessar-fogo sustentável e duradouro, e a retirar suas forças da Faixa de Gaza. Sem aceitar essas demandas, acho que não há como chegarmos a um cessar-fogo. Não podemos aceitar uma reocupação da Faixa de Gaza nem dar aos israelenses sinal verde para que lancem nova agressão. Não podemos aceitar 1,3 milhão de palestinos desalojados. Não podemos mantê-los em tendas, sem acesso a necessidades básicas.
Em um cenário pós-guerra, o Hamas aceitaria não exercer qualqeur influências sobre o governo palestino e sobre o controle de Gaza?
O dia seguinte à guerra tem que ser um dia dos palestinos. O povo palestino é maduro o bastante para decidir por si mesmo, para escolher sua liderança e sua agenda política. Por que aceitarmos que alguém decida por nós sobre o que fazer ou não? Nós, do Hamas, temos afirmado várias vezes que não insistimos em fazer parte do governo ou em controlar a Faixa de Gaza. Mas, ao mesmo tempo, isso tem que ser decidido pelo povo palestino e pelas facções palestinas, seja por meio de consenso, de referendo ou de eleições. É preciso deixar que o povo palestino escolha. O Hamas não é apenas um grupo militar. O Hamas é um partido político, que representa boa parte dos palestinos. Cerca de 70% dos palestinos ainda apoiam a resistência, apesar da agressão e da destruição. A popularidade do Hamas aumentou depois de 7 de outubro. O Hamas é parte do tecido social e político palestino e deve ser parte do processo decisório no dia seguinte à guerra. Estar ou não no governo é uma decisão que cabe aos palestinos. Estamos prontos a aceitar e a respeitar qualquer vontade palestina.
O que tem a dizer sobre a acusação de violência sexual cometida por integrantes do Hamas?
Nós negamos qualquer agressão sexual a qualquer mulher. As instruções para a operação de 7 de outubro foram claras, dadas pelo chefe de comando das Brigadas Al-Qassam. Esta foi uma operação militar e nossos alvos eram complexos militares e soldados. Nós evitamos civis — mulheres, crianças e homens. Ao mesmo tempo, temos dito que estamos prontos para receber qualquer comitê de investigação da ONU ou internacional, a fim de apurar o que ocorreu em 7 de outubro.
Israel assegura que não suspenderá a guerra até destruir o Hamas...
Israel declara esse objetivo desde o primeiro dia. Depois de seis meses, eles fracassaram em atingir qualquer uma de suas metas. Não destruíram o Hamas nem expulsaram o nosso povo do território palestino nem resgataram os reféns. Eles fracassarão porque o Hamas não é um grupo militar. O Hamas representa a vasta maioria do povo palestino. Isso não é sobre o Hamas. Duas décadas atrás, era sobre o Fatah; 40 anos atrás, sobre a Frente Popular para a Libertação da Palestina. Ísso é sobre o povo palestino, seus sonhos e ambições de liberdade, dignidade e um Estado independente. O Hamas existirá hoje, amanhã e no futuro. Israel falhará em alcançar todas essas metas.
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