Investigação

Bolsonaro é indiciado por fraude em cartão de vacina; o que acontece agora?

PF vê elementos suficientes de crimes; caberá ao Ministério Público avaliar se denúncia ex-presidente criminalmente

Bolsonaro é indiciado por fraude em cartão de vacina; o que acontece agora? -  (crédito: Reuters)
Bolsonaro é indiciado por fraude em cartão de vacina; o que acontece agora? - (crédito: Reuters)
Mauro Cid e Bolsonaro caminhando
Reuters

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) seu ex-ajudante de ordens Mauro Cid e outros aliados foram indiciados pelos crimes de associação criminosa e inserção de dados falsos em sistema de informações, no inquérito que apura suposta fraude em cartões de vacinação da covid-19.

A informação foi inicialmente revelada pelo portal G1 e confirmada pela BBC News Brasil.

O indiciamento significa que a Polícia Federal (PF), ao concluir a investigação, avaliou que há indícios suficientes de autoria de crimes pelo grupo. Agora, o caso segue para o Ministério Público Federal avaliar se há elementos para denunciar Bolsonaro e os outros indiciados.

Caso isso ocorra, eles poderão responder a um processo criminal. A abertura de eventual processo, porém, caberá ao Supremo Tribunal Federal (STF), já que o caso tem tramitado na corte, sob relatoria do ministro Alexandre de Moraes.

O crime de inserção de dados falsos em sistema de informações tem pena de 2 a 12 anos de prisão, enquanto o de associação criminosa estabelece pena de 1 a 3 anos.

Além de Bolsonaro e seu ex-ajudante de ordens, teriam sido indiciados mais 14 pessoas, segundo o portal G1. Entre elas estão familiares de Mauro Cid e pessoas ligadas à prefeitura de Duque de Caxias (RJ), onde a PF acredita que foi realizada a falsificação dos cartões.

Um deles é o deputado federal Gutemberg Reis de Oliveira (MDB-RJ), irmão do ex-prefeito da cidade Washington Reis (MDB), atual secretário estadual de Transportes do Rio de Janeiro.

Apesar de Bolsonaro não ter mais foro por prerrogativa de função, o chamado foro privilegiado, o caso continuou no STF, em uma decisão considerada controversa no meio jurídico.

O fato de haver um parlamentar federal justificaria a manutenção do caso na mais alta Corte. Além disso, outro argumento da PF para manter a investigação das vacinas, iniciada em 2023, no gabinete de Moraes, foi que o caso teria ligação com o inquérito das Milícias Digitais, também de relatoria do ministro.

Para sustentar isso, a Polícia Federal argumentou, na ocasião, que "seja nas redes sociais, seja na realização de inserções de dados falsos de vacinação contra a covid-19, ou no planejamento de um golpe de Estado, o elemento que une seus integrantes está sempre presente, qual seja, a atuação no sentido de proteger e garantir a permanência no poder das pessoas que representam a ideologia professada".

Relembre o caso

Detalhes do indiciamento ainda não foram divulgados pela PF. Quando a investigação começou, em 2023, a PF suspeitava que Mauro Cid e outros assessores próximos de Bolsonaro teriam colaborado para emitir certificados falsos de imunização contra a covid-19 para o então presidente e sua filha para garantir a entrada de ambos nos Estados Unidos no final de 2022, antes da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Na época, a apresentação desse documento na alfândega americana era uma exigência para a maioria das pessoas, mas, como mostrou uma reportagem da BBC News Brasil, isso não seria necessário para Bolsonaro e sua filha, já que seus casos faziam parte das exceções previstas nas regras do país.

Pessoas com passaporte diplomático, como era o caso do ex-presidente durante seu mandato presidencial, são liberadas de cumprir essa exigência em viagens oficiais. Da mesma forma, sua filha, por ser menor de idade, também estaria isenta, segundo as regras americanas.

Na época, o ex-presidente negou que tivesse conhecimento da falsificação. Já para a PF, registros no aplicativo ConecteSus — sistema do Ministério da Saúde que emite o certificado de vacinação — de que a conta associada ao ex-presidente foi acessada de dentro do Palácio do Planalto por seu ex-ajudante de ordens para a emissão de comprovantes falsos reforçaria a hipótese que Bolsonaro sabia da falsificação.

A investigação mostrou que os certificados de vacinação para Bolsonaro foram emitidos quatro vezes entre dezembro de 2022 e março de 2023, por meio do aplicativo ConecteSUS, e que isso foi feito de um computador de dentro do Palácio do Planalto e do celular de Mauro Cid.

A apuração apontou ainda que era Cid que administrava o acesso de Bolsonaro ao ConecteSUS, já que a conta do presidente estava associada a um email do ex-ajudante de ordens.

Outros envolvidos

O grupo é suspeito de ter inserido dados falsos de vacinação contra a covid-19 no sistema do Ministério da Saúde para forjar os certificados de vacinação também de Mauro Cid, da sua mulher e de três filhas do casal (duas menores de idade); e de mais dois assessores do ex-presidente.

Supostamente, a finalidade das falsificações seria viabilizar a entrada dessas pessoas nos Estados Unidos, país que até 12 de maio de 2023 exigia esse documento para entrada em seu território (salvo exceções, como viagens de autoridades em missão oficial).

Segundo a PF, a inserção dos dados falsos foi realizada por meio da Prefeitura na cidade de Duque de Caxias (RJ). No caso de Bolsonaro, foram colocadas no sistema informações de que o ex-presidente teria sido vacinado naquele município com doses da Pfizer em 13 de agosto e 14 de outubro de 2022.

No entanto, o relatório da PF diz que não há qualquer comprovação que o presidente tenha estado em Duque de Caxias no dia 13 de agosto, quando cumpriu agenda no município do Rio de Janeiro.

Já no dia 14 de outubro, Bolsonaro teve agenda curta em Duque de Caxias, sem registro de que tenha sido vacinado nessa data, apontou a investigação.

Também não há evidências de que a filha de Bolsonaro estivesse naquele município nas datas em que teria sido vacinada (24 de julho e 13 de agosto de 2022), segundo as informações suspeitas registradas no sistema do Ministério da Saúde.

Além disso, a filha de Bolsonaro morava na época com seus pais em Brasília, aponta a PF em um relatório, e, por isso, "não faria sentido" ela ter ido até Duque de Caxias para se vacinar.

O delegado do caso, Fábio Shor, destacou ainda como evidência de fraude o grande tempo transcorrido entre a suposta vacinação de Bolsonaro e sua filha e o registro da aplicação das doses no sistema, realizada em 21 de dezembro.

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BBC Geral
postado em 19/03/2024 09:54 / atualizado em 19/03/2024 10:49
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