INVESTIGAÇÃO

Mauro Cid: de braço-direito de Bolsonaro à delação usada em operação da PF

Ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL) na Presidência da República, Mauro Cid fez acordo de delação premiada com a Polícia Federal – conteúdo foi usado na operação desta quinta-feira.

Antônio Cruz/Agência Brasil

A operação da Polícia Federal que mira o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e aliados em investigação sobre tentativa de golpe tem, entre seus elementos, conteúdo da delação premiada feita por Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro.

Bolsonaro é alvo da operação Tempus Veritatis, deflagrada pela PF nesta quinta-feira (8/2).

A operação especial investiga uma organização acusada de "tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito" antes e depois das eleições presidenciais de 2022, em uma tentativa de garantir a "manutenção do então presidente da República (Jair Bolsonaro) no poder".

Foi expedido um pedido para que Bolsonaro entregasse seu passaporte às autoridades e não mantenha contato com outros investigados.

Em um post na rede social X (antigo Twitter), o assessor de Bolsonaro Fabio Wajngarten afirmou que o ex-presidente cumprirá a ordens da PF.

Pelo menos nove aliados e ex-ministros de Bolsonaro também são alvo da operação (veja lista nesta reportagem).

Nesse contexto, como Mauro Cid passou de aliado de Bolsonaro a autor de delação usada em operação da Polícia Federal?

Quem é Mauro Cid

Mauro Cid – oficial do Exército com mais de 20 anos de carreira, que foi afastado de suas funções em 2023, mas manteve salário – ficou quatro meses preso em 2023. Ele é investigado em diferentes apurações relacionadas a Bolsonaro.

Ele deixou a prisão em setembro de 2023, após decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes conceder liberdade provisória ao militar e homologar delação premiada.

Mauro Cid estava preso desde 3 de maio no Batalhão do Exército de Brasília, como parte de uma operação da Polícia Federal cujo alvo de investigação é a inserção de dados falsos de vacinação contra a Covid, no sistema do Ministério da Saúde, de integrantes da família do ex-auxiliar e do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Entre os casos em que Cid é investigado, também estão a investigação que apura um suposto esquema de negociação ilegal de joias dadas por delegações estrangeiras à Presidência, a organização dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro e uma suposta trama para um golpe de Estado após as eleições do ano passado.

Mauro Cid foi apontado como um dos articuladores de uma suposta trama para organizar um golpe de estado no Brasil após a derrota de Bolsonaro para o atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), nas eleições de 2023.

Segundo a PF, foram encontrados no celular de Cid uma minuta para um golpe e um decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO). Um dos documentos no aparelho previam uma espécie de "roteiro do golpe", detalhando um "passo a passo" para a ruptura institucional que beneficiaria Bolsonaro.

O roteiro previa, segundo a PF, a contestação do resultado das eleições, o afastamento de ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), como Alexandre de Moraes e Carmen Lúcia, além da atuação das Forças Armadas para "mediar o conflito institucional" e nomear interventores no TSE com um objetivo de convocar novas eleições.

Em delação, Cid teria narrado à PF que Bolsonaro teria participado de uma suposta reunião com militares do alto escalão, de acordo com reportagens do portal UOL e do jornal O Globo, na qual se teria discutido uma minuta de um ato presidencial para convocar novas eleições e prender adversários.

No segundo semestre de 2023, Mauro Cid foi convocado a depor na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI), que investiga a invasão e depredação de prédios públicos em 8 de janeiro de 2023, em Brasília.

Porém, o tenente-coronel, usando uma farda do Exército, ficou em silêncio durante o depoimento, ancorado em uma decisão do STF que garantia a ele não responder a perguntas que pudessem incriminá-lo.

Reuters
Mauro Cid deixou a prisão em setembro de 2023, após decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes conceder liberdade provisória ao militar e homologar delação premiada

Cid formou-se na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) em 2000 e foi instrutor na instituição.

Seu pai, o general da reserva Mauro Cesar Lourena Cid, foi colega de turma de Bolsonaro na Aman nos anos 1970.

Cid se preparava para assumir um posto nos Estados Unidos quando foi nomeado para ser ajudante de ordens de Bolsonaro, pouco antes da posse do ex-presidente.

Na função, ele era o braço direito do ex-presidente e prestava assistência direta a Bolsonaro, inclusive para assuntos de caráter pessoal.

Operação Tempus Veritatis

Na operação deflagrada pela PF nesta quinta, pelo menos três pessoas já foram presas preventivamente:

  • Filipe Martins, ex-assessor para assuntos internacionais de Bolsonaro;
  • O coronel do Exército Marcelo Câmara, também ex-assessor de Bolsonaro e que era investigado no caso da suposta fraude ao cartão de vacinação do ex-presidente;
  • O major do Exército Rafael Martins de Oliveira

Também há um mandado de prisão contra o coronel do Exército Bernardo Romão Correa Neto, que está no momento no exterior.

E foram alvo de mandados de busca e apreensão:

  • General Augusto Heleno, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI);
  • General Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e da Casa Civil e vice na chapa de Bolsonaro em 2022;
  • Valdemar da Costa Neto, presidente do PL, partido do presidente pelo qual ele disputou a reeleição;
  • Anderson Torres, ex-ministro da Justiça de Bolsonaro;
  • General Paulo Sérgio Nogueira, ex-comandante do Exército e ex-ministro da Defesa de Bolsonaro;
  • Almirante Almir Garnier Santos, ex-comandante-geral da Marinha.

Conforme noticiado por veículos de imprensa, Valdemar da Costa Neto foi preso em flagrante durante a operação por posse ilegal de arma de fogo.

Segundo a polícia, houve uma construção e propagação de suposta fraude nas eleições de 2022, por meio da "disseminação falaciosa de vulnerabilidades do sistema eletrônico de votação, discurso reiterado pelos investigados desde 2019 e que persistiu mesmo após os resultados do segundo turno do pleito em 2022".

Também houve a "prática de atos para subsidiar a abolição do Estado Democrático de Direito, através de um golpe de Estado, com apoio de militares com conhecimentos e táticas de forças especiais no ambiente politicamente sensível".

As apurações apontam que "o grupo investigado se dividiu em núcleos de atuação para disseminar a ocorrência de fraude nas eleições presidenciais de 2022, antes mesmo da realização do pleito, de modo a viabilizar e legitimar uma intervenção militar, em dinâmica de milícia digital".

Os fatos investigados configuram, em tese, os crimes de organização criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado.

Segundo a PF, a mesma organização criminosa também é investigada por: ataques virtuais a opositores; ataques às vacinas contra a covid-19 e às medidas sanitárias na pandemia; uso da estrutura do Estado para obtenção de vantagens (o que inclui o caso das joias).

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