GUERRA

Guerra na Ucrânia: as escolas que mudaram para o subterrâneo para continuar funcionando

Com a guerra da Rússia contra a Ucrânia entrando em seu terceiro ano, salas de aula foram construídas junto às plataformas do metrô, no subsolo de Kharkiv.

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Nika, de seis anos, agora frequenta o jardim de infância subterrâneo

A guerra da Rússia transformou tudo na cidade de Kharkiv, incluindo a forma de viver a infância.

Mísseis são disparados contra a segunda principal cidade da Ucrânia desde o outro lado da fronteira russa, que está tão perto que há poucos segundos para detê-los.

Se eles forem direcionados para Kharkiv, a probabilidade de caírem é grande - e são poucas as chances de alcançar um abrigo em tempo.

Os prédios das escolas e dos jardins de infância estão fechados há quase dois anos por medida de segurança, e os playgrounds estão vazios.

Agora, à medida que a guerra em grande escala se aproxima de seu terceiro ano, partes da vida em Kharkiv estão migrando para o subsolo.

No fundo do metrô, salas de aula foram construídas de forma paralela às plataformas em cinco estações.

Autoridades locais começaram a oferecer as aulas subterrâneas há vários meses. Mais recentemente, adicionaram horários para crianças da pré-escola nos fins de semana.

A história de Nika

Para Nika Bondarenko, de 6 anos, é uma oportunidade de estar com outras crianças novamente.

Depois de dois anos estudando online, ela vai saltitante para sua estação de metrô vestindo galochas cor-de-rosa.

O trajeto passa pelas ruínas bombardeadas de escritórios militares, destruídos no início da invasão e localizados em frente à sua casa. Há vidros quebrados e prédios despedaçados por toda parte.

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A família caminha para a escola passando por vidros quebrados e edifícios destruídos

Mas quando Nika está no trem, indo para a aula, sua mãe pode parar de se preocupar.

"Os pais podem ter certeza de que nada vai acontecer com seus filhos e que uma criança pode continuar sua vida mais ou menos normal", explica Olha Bondarenko.

"O inimigo não pode nos pegar aqui."

Ela diz que Nika sentiu muita falta do jardim de infância.

"É tão importante. Do contrário, uma criança não consegue ver nenhuma outra, porque não há qualquer criança nas ruas e (há) sirenes de ataque aéreo o tempo todo."

Kharkiv agora oferece cerca de 700 vagas de jardim de infância no subsolo para crianças de até 6 anos. O total de alunos que frequenta aulas escolares no mesmo espaço é três vezes esse.

Alguns perderam os pais na luta, ou viveram em áreas sob fogo pesado, e precisam de apoio extra dos psicólogos junto aos professores.

No dia em que visitamos, há música, movimento e muitas risadas. Um grupo pré-escolar está vestido como médicos e enfermeiros; outros estão cantando e brincando com tijolos de plástico.

Tentando ser normal

A equipe fez de tudo para tornar as coisas o mais normal possível.

Nas paredes, ao lado de imagens coloridas de flores e lagartas gigantes, há cartazes sobre o perigo das minas. Mas quando as sirenes tocam alertando para mísseis, ninguém precisa se mexer.

A família Bondarenko fugiu de sua cidade no início da guerra, quando as tropas russas estavam pressionando para tomar Kharkiv e o bombardeio era constante.

Milhares de famílias estavam vivendo no metrô naquela época. Em março de 2022, a equipe da BBC reportou a presença de senhoras idosas dormindo em vagões de trem e bebês nas plataformas com seus pais.

Quando as forças russas foram forçadas a recuar, em setembro, a cidade voltou a respirar mais aliviada e Olha e seus filhos voltaram para casa.

O marido dela está no Exército. Para ela, estar em Kharkiv significava ficar perto dele.

Quando pergunto à irmã de Nika se ela tem medo dos ataques aéreos, Viktoria balança a cabeça.

"A sirene significa que um míssil pode atingir, ou não. É 50-50. Você só precisa acreditar que tudo ficará bem."

Ela tem 11 anos.

Os planos

O maior problema de Kharkiv é a localização: a fronteira russa fica a apenas 40 quilômetros.

"Precisamos de sistemas modernos de defesa aérea. Se os mísseis estão atingindo agora, isso significa que não temos o suficiente", argumenta o prefeito Ihor Terekhov.

Mas mesmo os sistemas ocidentais mais atualizados teriam dificuldades com tamanha proximidade.

A intensidade dos ataques aéreos aumentou desde dezembro e a escola no metrô está enchendo de crianças.

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Com a guerra chegando ao seu terceiro ano, Kharkiv construi escolas subterrâneas mais permanentes

Assim, a cidade começou a preparar estruturas subterrâneas mais permanentes.

No distrito de Industrialny, gravemente danificado por ataques de mísseis, uma nova escola inteira ganha forma debaixo de uma quadra esportiva.

As salas de aula serão instaladas cinco metros abaixo da superfície, com capacidade para 900 alunos em dois turnos.

Por enquanto, é uma estrutura que ainda passar por reforma, com construtores soldando, rebocando e martelando por todos os lados.

O chefe da construção me contou que, antes da invasão, sua empresa construiu um novo zoológico e redesenhou um parque central. "Agora estamos fazendo isso", diz, dando de ombros.

A construção da escola subterrânea o lembra dos bunkers nucleares construídos nas fábricas soviéticas durante a Guerra Fria.

"Eu realmente não quero que nos mudemos para o subsolo. Essa é uma medida de segurança forçada", explica o prefeito, durante uma inspeção no local.

A escola deve estar pronta até o final de março, embora o prazo pareça otimista.

O prefeito planeja estruturas semelhantes em todos os distritos. É um grande investimento.

"Os mísseis usados com mais frequência para arruinar nossa cidade levam 40 segundos para chegar aqui", aponta Terekhov. Não é tempo suficiente para evacuar uma escola normal.

"Esta guerra vai acabar quando vencermos. Mas, enquanto isso, as crianças têm o direito de estudar. Então estamos construindo essas escolas."

A história de Maryna

Pouco antes de viajarmos para Kharkiv, uma enxurrada de mísseis atingiu áreas residenciais da cidade. Onze pessoas foram mortas.

Um míssil atingiu o conjunto de prédios de Maryna Ovcharenko, destruindo todos os apartamentos da seção final.

A jovem de 18 anos e seus pais haviam saído de casa apenas dois minutos antes. Maryna diz que viu o míssil chegando. Ela foi arremessada pela onda de choque, mas não se machucou.

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Maryna (à direita) e a mãe tiveram a sorte de terem saído de casa minutos antes de o prédio onde moravam ser atingido

A adolescente ainda não consegue acreditar que está viva quando tantos de seus vizinhos morreram, incluindo uma criança.

Procurando pelas ruínas de seu próprio apartamento, Maryna tenta recuperar pertences pessoais. Ela encontrou sua certidão de nascimento. Sua mãe, Anastasia, encontrou uma mala contendo vestidos de festa.

De alguma forma, a família ainda está sorrindo.

"Nós temos um ao outro, estamos vivos - e não estamos feridos!", diz Anastasia, puxando sua filha para perto. "É um milagre."

No dia seguinte ao ataque de míssil, o pai de Maryna subiu nas ruínas do prédio e colocou uma bandeira ucraniana no telhado.

"Estamos aqui e seguimos, não importa o que a Rússia faça conosco. Eles podem nos matar e assassinar, mas estamos de pé", diz Maryna. "Nós seguimos em frente."

Os professores

Do outro lado da cidade, na escola no metrô, Olha Bondarenko também fala muito sobre desafio e resiliência. Eles chamam Kharkiv de 'cidade inquebrável'.

"Em Kharkiv acontece um ataque aéreo, você se estressa um pouco, depois enxuga suas lágrimas e continua. É assim que todo mundo vive aqui", diz a mãe de dois filhos.

Mas a diferença entre a vida e a morte pode ser uma questão de segundos ou metros.

Olha tem pesadelos em que fica presa sob as ruínas de sua casa com os filhos. "Tenho muito medo disso. Eu tenho ataques de pânico de estar debaixo dos escombros."

As escolas subterrâneas contam uma história de adaptação - e sobrevivência.

"Claro que é estranho, mas o que mais podemos fazer? Queremos que nossos filhos cresçam em nosso país. Na Ucrânia", me diz Natalia Bilohryshchenko.

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O prefeito de Kharkiv planeja estruturas semelhantes em todos os distritos

Ela dirige o departamento de educação pré-escolar no conselho da cidade e diz que os professores estavam "pulando de alegria" por voltarem ao trabalho.

"Os olhos deles brilhavam. Eles sentiram falta das crianças."

De repente, Natalia começa a chorar.

"Quando houver paz, venha visitar e mostraremos nossos jardins de infância normais", ela me diz, em lágrimas.

"É tudo tão triste... Mas está tudo bem. Tudo ficará bem."

Com pesquisas e reportagem adicional de Hanna Chornous, Paul Pradier e Anastasia Levchenko.

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