A carta foi enviada à mesa diretora do Knesset (Parlamento israelense) e ao governo de Benjamin Netanyahu no domingo (21/1). "Nós, familiares dos reféns em Gaza, imploramos a vocês: não negociem algo que não seja o retorno dos sequestrados. Não abandonem os reféns, que são executados diariamente", afirmava a mensagem. Ante a falta de resposta das autoridades israelenses, 20 parentes de israelenses mantidos sob a mira do grupo extremista palestino Hamas invadiram o Palácio do Knesset, em Jerusalém, e interromperam a sessão do Comitê de Finanças, aos gritos: "Libertem-os agora, agora, agora!". Alguns dos manifestantes vestiam camisas pretas com a frase em hebraico "Vocês não se sentarão aqui enquanto nossos filhos morrem!".
Também nesta segunda-feira (22/1), um protesto diante da residência do primeiro-ministro terminou com o derramamento de um líquido vermelho imitando sangue dos reféns. O Fórum de Famílias de Reféns e Desaparecidos, entidade que tem organizado uma série de manifestações desde o massacre de 7 de outubro, buscou se distanciar do ato. "Essa exibição foi realizada de forma independente e não coordenada com os familiares dos reféns", afirmou, em nota recebida pelo Correio por meio do WhatsApp. O Hamas ainda mantém em seu poder 130 civis e militares israelenses. Entre eles, está o brasileiro Michel Nisembaum, 59 anos, capturado pelos extremistas enquanto dirigia de Sderot ao kibutz de Mefalsim, na manhã do atentado.
As Forças de Defesa de Israel (IDF) anunciaram a morte de 200 soldados na Faixa de Gaza, nos últimos 85 dias, desde o início da invasão por terra. As tropas do Exército judeu intensificaram os bombardeios à região sul do enclave palestino, com ataques letais em Khan Yunis, onde ocuparam o hospital Al-Khair. Famílias inteiras fugiram da cidade, a segunda maior de Gaza, em carros, carroças e caminhões.
Em um vídeo divulgado no domingo, Netanyahu revelou que, em troca da libertação dos reféns israelenses, o Hamas exige o fim da guerra, a retirada das tropas de Gaza, a soltura dos prisioneiros palestinos e garantias de que o grupo prossiga no comando do enclave. "Se aceitarmos isso, nossos soldados terão caído em vão", reagiu o chefe de governo. O jornal britânico The Guardian divulgou que o ministro das Relações Exteriores israelense, Israel Katz, sugeriu a remoção dos moradores da Faixa de Gaza e o confinamento deles em uma ilha artificial no Mar Mediterrâneo. Ante a repercussão negativa das declarações, a chancelaria de Netanyahu desmentiu a proposta, que teria sido feita durante reunião com representantes da União Europeia (UE).
Ministros das Relações Exteriores da UE pressionaram Katz e a delegação israelense por uma solução baseada em dois Estados independentes e soberanos para o conflito no Oriente Médio — uma medida descartada por Netanyahu. "Paz e estabilidade não podem ser construídas apenas por meios militares (...) Qual outra solução vocês consideram? Fazer todos os palestinos partirem? Matá-los?", questionou Josep Borrell, chefe da diplomacia do bloco, antes de se encontrar com Katz e com o chanceler palestino, Riyad al Maliki.
Sequestrados
Professor de ciência política da Universidade Bar-Ilan (em Ramat Gan, subúrbio de Tel Aviv), Eytan Gilboa lembrou ao Correio que, pela primeira vez, o governo de Netanyahu formulou um plano para a libertação de todos os reféns israelenses em etapas: dois meses de trégua, redistribuição limitada de tropas e libertação de integrantes do Hamas. "É improvável que o Hamas aceite essa proposta. O grupo usa muitos civis de Gaza como escudos humanos para sua própria sobrevivência. Israel rejeitou as demandas do Hamas para encerrar a guerra e retirar suas forças de Gaza, em troca da libertação de todos os reféns israelenses. Isso jamais ocorrerá", admitiu.
No entanto, Gilboa entende que a troca de propostas entre Israel e Hamas pode pavimentar o caminho para negociações sérias, com a ajuda dos governos dos Estados Unidos, do Egito e do Catar. "Netanyahu esteve preocupado com os danos políticos causados pela demora no resgate dos reféns. Foi por isso que ele apresentou essa nova iniciativa", disse o especialista.
Segundo Gilboa, a eliminação do poder e do governo do Hamas sobre Gaza não era algo compatível com as concessões feitas por Israel para a libertação de todos os reféns. "O objetivo mais importante vinha sendo o desmantelamento da capacidade militar do Hamas, enquanto a libertação dos sequestrados estava relegada ao segundo plano. Com a nova proposta de Netanyahu, parece que o objetivo da libertação se equivaleu ao da eliminação do Hamas", avaliou.