Às vésperas da votação da "Lei Ônibus" — texto que prevê uma revolução no sistema econômico argentino e mudanças na legislação trabalhista — na Câmara dos Deputados, o presidente ultralibertário Javier Milei fez uma ameaça aos governadores provinciais, caso não viabilizem a aprovação da medida no Congresso. Durante reunião de gabinete, Milei disparou: "Vou deixá-los sem um peso, vou derreter todos eles". O aviso aos governadores foi feito por meio de uma declaração direcionada ao ministro da Economia, Luis Caputo, de acordo com o jornal Clarín. A expectativa é de que o texto seja votado pelo Congresso na próxima terça-feira (30/1). A imprensa argentina calcula de o projeto de lei precisa de mais 25 votos para ser aprovado.
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Na quarta-feira (24/1), Milei enfrentou sua primeira greve geral e uma manifestação que reuniu dezenas de milhares de pessoas na Plaza Congreso, em Buenos Aires. Ambos movimentos foram convocados pela Confederación General del Trabajo de la República Argentina (CGT). A ameaça de Milei expôs o nervosismo da Casa Rosada ante a dificuldade em negociar os votos necessários na Câmara, onde o governo tem minoria. Com 664 artigos em sua redação original — 141 deles foram revogados ou excluídos por Milei —, a "Lei Ônibus", entre outras coisas, limita o direito de greve, modifica o financiamento sindical, valoriza o livre mercado e cria regulações sobre os aluguéis, além de propor a privatização de estatais.
Em nota publicada na rede social X, a antigo Twitter, Caputo engrossou o coro e também advertiu os governadores: "As dotações às províncias serão imediatamente, caso algum dos artigos (da Lei Ônibus) seja rejeitado". "Não é uma ameaça, é a confirmação que vamos cumprir com o mandato que nos foi concedido pela maioria dos argentinos de equilibrar as contas fiscais para terminar com décadas de inflação e flagelo econômico", explicou. Caputo participou de um encontro com representantes de entidades empresariais, na Casa Rosada, e explicou que o aumento de impostos será uma "decisão passageira", até o país alcançar o "deficit zero". "Estamos tomando medidas que são desagradáveis e que vão contra nossas próprias convicções", declarou o ministro, segundo o jornal La Nación.
Até o fechamento desta edição, Axel Kicillof, governador da província de Buenos Aires, não tinha reagido às palavras de Milei e de Caputo. No entanto, na quarta-feira (24), ele alertou que as medidas do governo federal "colocam em risco o trabalho e a produção, complicando a vida de milhões de argentinos". "Sabemos que esses planos de ajuste sempre são pagos pelos trabalhadores, pelos aposentados e pela classe média. Não aceitaremos nenhum tipo de pressão", avisou Kicillof.
Miguel De Luca, professor de ciência política da Universidad de Buenos Aires (UBA), admitiu que a ameaça de Milei é "a reação de própria de alguém que não tem experiência política". "Os políticos sabem que às vezes ganham, outras vezes perdem. E que, em toda negociação, se perde e se ganha um pouco. Milei não está acostumado a negociar; entende que a lei é imposta 'a tudo ou nada'", comentou. O estudioso alertou que esse tipo de comportamento pode levar a um conflito com os governadores e com o Congresso, além de colocar em risco a governabilidade. "Governar assim tem um custo muito alto", disse. Ele acredita que a Lei Ônibus corre perigo de ser reprovada pelos congressistas, ainda mais em meio a uma atmosfera de tensão e de embate.
Para De Luca, Milei destoa de todos os outros ex-presidentes da Argentina. "Os mandatários anteriores tinham sido governadores, senadores ou deputados. Sabiam negociar e entendiam que podiam perder uma votação. Milei não tem experiência nisso, nem mesmo seu grupo de ministros", ressaltou.
Também ao Correio, Eduardo Belliboni — líder do movimento Polo Obrero e responsável pela organização de piquetes em Buenos Aires — disse nada esperar de Milei. "É um governo contrário aos trabalhadores e antidemocrático. As afirmações de Milei são sempre declarações de guerra contra o povo", afirmou. O líder sindicalista não descarta a aprovação da "Lei Ônibus" no Congresso. "Alguns deputados peronistas estão se vendendo", lamentou.
Secretário-geral do Sindicato Único dos Trabalhadores nas Indústrias de Artefatos de Borracha da Argentina, Alejandro Crespo somou-se aos protestos e à greve geral da última quarta-feira. Na opinião dele, as ameaças de Caputo e de Milei aos governadores são "a expressão dos métodos deste governo para tentar aprovar a legislação antitrabalhadores e descarregar a crise sobre toda a população argentina". Ao mesmo tempo, ele explica que os governadores desejam a volta da imposição de um imposto sobre o salário, a fim de retirar os ganhos dos trabalhadores. "O governo passa por um momento de crise e recorre a tudo para impor um ajuste macabro e eliminar diretos conquistas por nossos pais e avós. A atual geração de trabalhadores argentinos não será aquela que abrirá mão de todos os seus direitos para deixar os filhos expostos às piores condições de vida. Nós lutaremos por novas conquistas", disse à reportagem.
EU ACHO...
"Javier Milei não construiu um 'governo de coalizão', não somou outros partidos ao seu governo. Por esse motivo, sua base de apoio legislativo é baixíssima. Se suas medidas não forem negociadas com o Congresso, em breve o seu governo sofrerá uma paralisia. E, se a situação econômica não melhorar, dificilmente ele terminará o mandato."
Miguel De Luca, professor de ciência política da Universidad de Buenos Aires (UBA)
"O governo de Javier Milei ataca os governadores com uma extorsão, porque sua 'Lei Ônibus' enfrenta uma crise e ele fracassou em impedir a mobilização enorme da classe trabalhadora, na quarta-feira. É um governo débil, o qual parte para a ofensiva por estar muito preocupado. Apenas 45 dias depois da posse, uniu a oposição contra seu plano. Na próxima terça-feira, 30, voltaremos a nos mobilizar, enquanto o Congresso apreciar a lei."
Eduardo Belliboni, líder do movimento Polo Obrero e responsável pela organização de piquetes em Buenos Aires
Encontro com o papa Francisco
O presidente Javier Milei será recebido, na manhã de 12 de fevereiro, segunda-feira, pelo papa Francisco no Vaticano. A informação foi divulgada pelo jornal argentino Clarín, citando fontes envolvidas na viagem do ultralibertário. O encontro ocorrerá no Palácio Apostólico. Fernanda Silva, embaixadora da Argentina no Vaticano, solicitou a reunião à Santa Sé. Depois de fazer duras críticas ao papa, Milei escreveu uma carta, de próprio punho, ao pontífice, na qual convidou Francisco a Buenos Aires.
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Eu acho...
"Javier Milei não construiu um 'governo de coalizão', não somou outros partidos ao seu governo. Por esse motivo, sua base de apoio legislativo é baixíssima. Se suas medidas não forem negociadas com o Congresso, em breve o seu governo sofrerá uma paralisa. E, se a situação econômica não melhorar, dificilmente ele terminará o mandato."
Miguel De Luca, professor de ciência política da Universidad de Buenos Aires (UBA)
"O governo de Javier Milei ataca os governadores com uma extortsão, porque sua 'Lei Ônibus' enfrenta uma crise e ele fracassou em impedir a mobilização enorme da classe trabalhadora, na quarta-feira. É um governo débil, o qual parte para a ofensiva por estar muito preocupado. Apenas 45 dias depois da posse, uniu a oposição contra seu plano. Na próxima terça-feira, 30, voltaremos a nos mobilizar, enquanto o Congresso apreciar a lei."
Eduardo Belliboni, líder do movimento Polo Obrero e responsável pela organização de piquetes em Buenos Aires
Encontro com o papa Francisco
O presidente Javier Milei será recebido, na manhã de 12 de fevereiro, segunda-feira, pelo papa Francisco no Vaticano. A informação foi divulgada pelo jornal argentino Clarín, citando fontes envolvidas na viagem do ultralibertário. O encontro ocorrerá no Palácio Apostólico. Fernanda Silva, embaixadora da Argentina no Vaticano, solicitou a reunião à Santa Sé. Depois de fazer duras críticas ao papa, Milei escreveu uma carta, de próprio punho, ao pontífice, na qual convidou Francisco a Buenos Aires.
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