Conflitos na Ásia

Oriente Médio: Paquistão ataca o Irã, e Estados Unidos temem escalada

Em retaliação a ofensiva de Teerã, forças paquistanesas bombardeiam "esconderijos de terroristas" em território iraniano e deixam nove mortos. ONU manifesta preocupação e pede contenção. Casa Branca monitora tensão

Morador da província do Baluchistão, no sudoeste do Paquistão, mostra montanhas onde o Irã lançou mísseis
 -  (crédito: Banaras Khan/AFP)
Morador da província do Baluchistão, no sudoeste do Paquistão, mostra montanhas onde o Irã lançou mísseis - (crédito: Banaras Khan/AFP)

Bombardeios realizados pelo Paquistão — único país muçulmano detentor de armamentos nucleares — contra supostos "esconderijos terroristas" na província do Sistão-Baluchistão, no leste do Irã, deixaram nove mortos e elevaram a tensão no Oriente Médio e na Ásia Central. A operação militar ocorreu dois dias depois de ataques perpetrados pelo Irã contra o grupo extremista Jaish Al-Adl, que operava em território paquistanês. Ela acontece no contexto da guerra travada entre Israel e o movimento fundamentalista palestino Hamas, na Faixa de Gaza, e dos atentados cometidos pelos rebeldes separatistas xiitas huthis contra embarcações no Mar Vermelho.

Ao longo da semana, o Irã também disparou mísseis e usou drones em bombardeios na região do Curdistão iraquiano e na Síria. Nesta quinta-feira (18), 10 civis também morreram em ofensivas aéreas travadas pela Jordânia na Síria — os alvos seriam traficantes de drogas.

O Ministério das Relações Exteriores do Paquistão confirmou o lançamento de "uma série de ataques militares coordenados" e "com precisão contra esconderijos terroristas na província do Sistão-Baluchistão, no Irã". "Vários extremistas morreram", acrescentou o comunicado da chancelaria, segundo o qual as forças de Islamabad agiram "à luz de informações confiáveis que permitiram impedir atividades terroristas em grande escala".

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, fez rápido comentário sobre a tensão entre Islamabad e Teerã. "Como vocês podem ver, o Irã não é particularmente querido na região", declarou. "Para onde — para onde isso vai, estamos trabalhando agora. Eu não sei aonde isso vai."

Morador da província do Baluchistão, no sudoeste do Paquistão, mostra montanhas onde o Irã lançou mísseis
Morador da província do Baluchistão, no sudoeste do Paquistão, mostra montanhas onde o Irã lançou mísseis (foto: Banaras Khan/AFP)

O secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, externou "profunda preocupação" pelos ataques e instou o Irã e o Paquistão a "evitarem uma escalada". "O secretário-geral está profundamente preocupado com a recente troca de ataques militares entre Irã e Paquistão", disse, em nota, Stéphane Dujarric, porta-voz de Guterres. "O chefe da ONU urge ambos os países a praticarem contenção máxima para evitar uma escalada maior das tensões."

Trocas diplomáticas

De acordo com o paquistanês Hasan-Askari Rizvi, estrategista militar da Universidade do Punjab (em Lahore), os ataques de Teerã com mísseis e drones a um vilarejo próximo da fronteira entre Irã e Paquistão surpreenderam a todos, principalmente pelo fato de os canais diplomáticos entre os países estarem sempre abertos. Teerã e Islamabad têm trocado informações sobre grupos terroristas que se movem em ambas direções por meio da fronteira porosa.

"Parece-me que o establishment militar iraniano, especialmente o 'Pasdaran' (Exército dos Guardiães da Revolução Islâmica), tomou a decisão de empreender ações militares na Síria, no Iraque e no Paquistão para responder a pressões iranianas causadas pelo atentado em Kerman, no aniversário de morte do general Qasem Soleimani. Eles querem mostrar à opinião pública que os terroristas vêm de fora do país e que o Irã tem capacidade de lidar com eles tanto internamente quanto no exterior", explicou Rizvi ao Correio.  

Em relação ao Paquistão, Rizvi afirmou que insurgentes do Baluchistão utilizam o território iraniano como esconderijo e alguns extremistas baseados no Irã também invadem o lado paquistanês. "Depois do último incidente,  Paquistão deu, inicialmente, uma responsa diplomática. Os dois chanceleres conversaram ao telefone. No entanto, as autoridades do regime teocrático islâmico insistiram que a ação era contra terroristas, não contra o Paquistão. Na noite de ontem (quarta-feira), Islamanbad lançou uma operação área contra os insurgentes do Baluchistão dentro do território iraniano", relatou o estrategista militar paquistanês.

Ele acrescentou que o Paquistão chamou o embaixador de volta; e o Iraque retirou seu representante de Teerã, mas não teria condições de responder militarmente. "A Síria ficará quieta. O Paquistão respondeu por meios militares e diplomáticos. Teremos que esperar pela reação do Irã. Nosso país ofereceu, novamente, canais diplomáticos para lidar com a questão do terrorismo", disse Rizvi. "A preferência do Irã é pela diplomacia e pelo diálogo. Se os iranianos insistirem na ação militar, a situação pode se deteriorar."

Especialista em segurança nacional, o paquistanês Ahmed Quraishi lembrou que o regime dos aiatolás tornou-se fonte constante de tensões e danos regionais desde a tomada de poder do xá Reza Pahlavi, em 1979. "Sob os aiatolás, o único papel do Irã é o de ser um 'valentão' regional", ironizou, por e-mail. "A Guarda Revolucionária planejou um grande golpe publicitário, alegando atingir as instalações do serviço de espionagem israelense Mossad no Iraque, na Síria e no Paquistão e angariar simpatia da opinião pública árabe. Calcularam mal a resposta do Paquistão, que estragou a festa."

EU ACHO...

Crédito: Arquivo Pessoal. Hasan Askari-Rizvi, estrategista militar da Universidade do Punjab (em Lahore).
Hasan-Askari Rizvi, estrategista militar da Universidade do Punjab (em Lahore). (foto: Arquivo Pessoal)

"As atividades militares do Irã minam a interação diplomática entre Teerã e Islamabad. A ação iraniana contra os três países isolou ainda mais o Irã. A maioria dos Estados árabes e do Golfo Pérsico têm reservas quanto à política externa iraniana. Paquistão, Iraque e Síria tinham boas relações de trabalho com o Irã. Agora, Bagdá e Islamabad terão restrições, a menos que o Irã mude suas políticas. Estes incidentes mudam o foco da guerra Gaza-Israel, pelo menos temporariamente."

Hasan-Askari Rizvi, estrategista militar da Universidade do Punjab (em Lahore)

 

Eu acho...


"As atividades militares do Irãe minam a interação diplomática normal entre Teerã e Islamabad. A ação iraniana contra os três países isolou ainda mais o Irã no Oriente Médio. A maioria dos Estados árabes e do Golfo Pérsico têm reservas quanto à política externa iraniana. Paquistão, Iraque e Síria tinham boas relações de trabalho com o Irã. Agora, Bagdá e Islamabad terão restrições, a menos que o Irã mude suas políticas. Estes incidentes também mudam o foco da guerra Gaza-Israel, pelo menos temporariamente."

Hasan-Askari Rizvi, estrategista militar da Universidade do Punjab (em Lahore)

  • Ativistas do grupo Muslim Talba Mahaz (MTM) seguram faixa durante protesto contra bombardeio do Irã, em Islamabad
    Ativistas do grupo Muslim Talba Mahaz (MTM) seguram faixa durante protesto contra bombardeio do Irã, em Islamabad Foto: Farooq Naeem/AFP
  • Crédito: Arquivo Pessoal. Hasan Askari-Rizvi, estrategista militar da Universidade do Punjab (em Lahore).
    Hasan-Askari Rizvi, estrategista militar da Universidade do Punjab (em Lahore). Foto: Arquivo pessoal
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postado em 19/01/2024 06:00
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