Somos constantemente lembrados de como o exercício beneficia a saúde óssea e muscular ou reduz a gordura. No entanto, há também um interesse crescente num elemento da nossa anatomia que é muitas vezes esquecido: a fáscia.
A fáscia é um invólucro fino de tecido conjuntivo, feito principalmente de colágeno – uma estrutura semelhante a uma corda que fornece força e proteção a muitas áreas do corpo. Ela envolve e mantém no lugar todos os órgãos, vasos sanguíneos, ossos, fibras nervosas e músculos. E os cientistas reconhecem cada vez mais a sua importância na saúde muscular e óssea.
É difícil ver a fáscia no corpo, mas você pode ter uma ideia de como ela é olhando para um bife. São as finas listras brancas na superfície ou entre as camadas da carne.
A fáscia desempenha funções gerais e especiais no corpo e é organizada de diversas maneiras. Mais próxima da superfície, está a fáscia superficial, que fica abaixo da pele, entre camadas de gordura. Depois temos a fáscia profunda, que cobre os músculos, ossos e vasos sanguíneos.
A ligação entre a fáscia, a saúde e a função muscular e óssea é reforçada por estudos recentes que mostram o importante papel que a fáscia tem no trabalho dos músculos, auxiliando a contração das células musculares para gerar força e afetando a rigidez muscular.
Cada músculo está envolto em fáscia. Essas camadas são importantes porque permitem que os músculos que ficam próximos ou em cima uns dos outros se movam livremente sem afetar as funções uns dos outros.
A fáscia também auxilia na transição de força através do sistema músculo-esquelético. Um exemplo disso é nosso tornozelo, onde o tendão de Aquiles transfere força para a fáscia plantar.
Isso faz com que as forças se movam verticalmente para baixo através do tendão de Aquiles e depois sejam transferidas horizontalmente para a planta do pé – a fáscia plantar – durante o movimento.
Uma transição de força semelhante é observada nos músculos do tórax, descendo até grupos de músculos no antebraço. Existem cadeias de conexão pela fáscia semelhantes em outras áreas do corpo.
Quando a fáscia é danificada
Quando a fáscia não funciona adequadamente, como após uma lesão, as camadas tornam-se menos capazes de facilitar o movimento umas sobre as outras ou ajudar a transferir força. A lesão na fáscia leva muito tempo para ser reparada, provavelmente porque possui células semelhantes aos tendões (fibroblastos) e tem suprimento sanguíneo limitado.
Recentemente, foi demonstrado que a fáscia, especialmente as camadas próximas à superfície, tem o segundo maior número de nervos depois da pele. Os revestimentos fasciais dos músculos também têm sido associados à dor causada por cirurgias e a lesões musculoesqueléticas causadas por esportes e pelo envelhecimento. Até 30% das pessoas com dor musculoesquelética podem ser casos que envolvem a fáscia ou em que a fáscia pode ser a causa.
Um tipo de massagem chamada manipulação da fáscia, desenvolvida pelo fisioterapeuta italiano Luigi Stecco na década de 1980, demonstrou melhorar a dor da tendinopatia patelar (dor no tendão abaixo da rótula), tanto a curto como a longo prazo.
A manipulação da fáscia também mostrou resultados positivos no tratamento da dor crônica no ombro.
Uma das tendências crescentes para ajudar nas lesões musculoesqueléticas é a fita Kinesio, muito usada em atletas profissionais. A técnica também está sendo usada para complementar a função da fáscia e para tratar dores lombares crônicas, em que o envolvimento fascial é um fator.
Fáscia doente?
Além de ser danificada, a fáscia também pode fornecer caminhos pelos quais as infecções podem percorrer dentro dos músculos.
Os espaços entre as camadas fasciais geralmente são fechados (pense em uma película aderente dobrada), mas quando ocorre uma infecção, os germes podem se espalhar entre essas camadas. Este é um problema específico no pescoço, onde existem várias camadas de fáscia por onde as infecções podem transitar.
Em casos graves, muitas vezes é necessária cirurgia para remover o tecido morto e salvar o tecido saudável restante.
A queixa comum de fascite plantar, que causa dor ao redor do calcanhar e do arco do pé, é um dos principais exemplos do funcionamento da fáscia na saúde e dos desafios que sua disfunção pode trazer.
Esta doença incrivelmente comum afeta 5-7% das pessoas, e o índice aumenta para 22% nos atletas. É reconhecida como uma lesão por uso excessivo, causando espessamento das faixas fasciais na sola dos pés que ajudam a dar sustentação ao arco.
A fáscia também pode estar ligada a problemas de saúde mais graves, como a fasciíte necrosante. Esta é uma infecção rara, mas grave, que pode se espalhar rapidamente pelo corpo e causar morte.
A condição quase sempre é causada por bactérias, especificamente Streptococcus do grupo A ou Staphylococcus aureus. A infecção inicial vem de um corte ou arranhão, e então a bactéria viaja ao longo da fáscia para áreas distantes do local inicial e se multiplica no ambiente ideal proporcionado pelo calor do corpo.
Podemos ver a fáscia melhor agora
Uma das razões pelas quais a fáscia tem sido negligenciada na saúde e na doença é porque antes era difícil vê-la usando a tecnologia de imagem até então disponível.
Mais recentemente, porém, a ressonância magnética e a ultrassonografia demonstraram ser benéficas na visualização da fáscia, particularmente em condições musculoesqueléticas, como fascite plantar, e alterações patológicas na fáscia do ombro e pescoço.
Com o crescente interesse pela fáscia e a maior compreensão da sua contribuição para a saúde músculoesquelética, é sensato sugerir que cuidemos dela da mesma forma que fazemos com o resto do sistema músculoesquelético – utilizando-a.
Técnicas simples como o uso de rolos de espuma e alongamentos são benéficas para aumentar a mobilidade, mas ainda há muito a aprender sobre a nossa fáscia e o papel que ela desempenha na saúde no dia a dia.
*Adam Taylor é professor e diretor do Centro de Aprendizagem de Anatomia Clínica da Universidade de Lancaster (Inglaterra).
**Este artigo foi publicado no The Conversation e reproduzido aqui sob a licença Creative Commons. Clique aqui para ler a versão original em inglês.