*CORREÇÃO ÀS 19H40 DE 20/12/2023: Essa reportagem foi atualizada em 13 de dezembro sem levar em conta a troca de comando na Câmara dos EUA. A versão atual reproduz o texto original, publicado em 12 de setembro.
A Câmara dos Estados Unidos abrirá um inquérito formal de impeachment do presidente Joe Biden, disse o presidente da Casa, deputado Kevin McCarthy, nesta terça-feira (12/9).
O republicano McCarthy afirmou que o inquérito se concentrará em "acusações de abuso de poder, obstrução e corrupção" por parte de Biden.
Os republicanos têm investigado o presidente desde que assumiram o controle da Câmara em janeiro.
Mas os jornalistas da BBC em Washington Sean Dilley e Rebecca Hartmann apontam que há três principais razões que tornam praticamente impossível que essa medida prospere.
Segundo os dois especialistas em cobertura política dos Estados Unidos, a primeira razão são os números. Eles apontam que há um ceticismo extremo de que McCarthy consiga encontrar 218 republicanos para apoiar um inquérito formal contra o presidente americano.
Há apenas 11 dias, ele insistiu que não abriria um processo de impeachment sem votação. O anúncio de hoje, dizem os jornalistas, representou uma reviravolta.
Os especialistas avaliam que McCarthy sabe que qualquer tentativa de impeachment de Biden como presidente dos EUA é inútil. Porém, destacam que ele, assim como a sua antecessora no cargo de presidente da Câmara, Nancy Pelosi, do Partido Democrata, ele é um operador altamente partidário.
Ele conta com três subcomitês liderados por republicanos no Congresso para repetir acusações sérias contra Joe Biden: de que o presidente americano sabia dos negócios estrangeiros de seu filho Hunter e que sua família e associados se beneficiaram do valor de US$ 20 milhões (cerca de R$ 100 milhões) por meio de um suposto esquema complexo de pagamentos feitos a empresas de fachada.
Mesmo que a Câmara vote pelo impeachment, o processo irá para o Senado, que é controlado pelos Democratas com uma maioria de 51 a 49. O presidente só será destituído se dois terços do Senado apoiarem a medida.
Os especialistas frisam que isso não deve ocorrer com o atual Senado e nunca aconteceu na história do país americano.
E o segundo ponto que impede que essa medida contra Biden avance, apontam os jornalistas, é que os três subcomitês que investigaram o presidente americano nos últimos nove meses não encontraram provas conclusivas.
Em razão disso, os jornalistas apontam que é praticamente improvável haver qualquer evidência nova e substancial em relação ao caso, já que nada foi encontrado após essas apurações.
O terceiro ponto, destacam os jornalistas, é que três presidentes americanos sofreram impeachment – Andrew Johnson em 1868, Bill Clinton em 1998 e Donald Trump duas vezes – em 2019 e 2021. No entanto, nenhum deles foi alguma vez destituído pelo Senado.
O procedimento contra Biden
Numa breve declaração no Capitólio dos EUA, McCarthy disse que havia acusações "sérias e críveis" envolvendo a conduta do presidente.
"No seu conjunto, essas alegações pintam um quadro de uma cultura de corrupção", disse ele.
A Casa Branca rapidamente condenou a decisão de McCarthy.
"Os republicanos da Câmara estão investigando o presidente há nove meses e não encontraram nenhuma evidência de irregularidade", escreveu o porta-voz da Casa Branca, Ian Sams, em uma postagem nas redes sociais.
"É a extrema política no seu pior", acrescentou.
Hunter Biden atualmente está sob investigação federal por possíveis crimes fiscais relacionados aos seus interesses comerciais estrangeiros.
McCarthy também alegou que a família do presidente recebeu tratamento especial de funcionários do governo Biden que investigam alegações de má conduta.
O anúncio desta terça-feira é o primeiro passo num processo político que poderá resultar numa votação de impeachment na Câmara dos Deputados.
Se for aprovado por maioria simples, poderá ocorrer um julgamento no Senado dos EUA.
Esse inquérito formal dará aos investigadores do Congresso maior autoridade legal para investigar o presidente, inclusive através da emissão de intimações para documentos e testemunhos que possam ser mais facilmente executados em tribunal.
McCarthy, que lidera os republicanos na Câmara dos Representantes, tem estado sob pressão há semanas de membros da direita para abrir um inquérito de impeachment.
O congressista Matt Gaetz, da Flórida, aliado próximo do ex-presidente Donald Trump, planejava fazer comentários no Capitólio na terça-feira, onde ameaçaria forçar uma votação sobre a remoção de McCarthy se um inquérito de impeachment não fosse iniciado.
McCarthy atualmente tenta encaminhar uma série de projetos de lei sobre despesas na Câmara dos Representantes – medidas que devem ser aprovadas pelo Congresso até ao final de Setembro, a fim de evitar uma paralisação parcial do governo dos EUA.
Contudo, a maioria republicana na Câmara é extremamente estreita, o que significa que ele só pode se dar ao luxo de perder alguns votos diante da resistência democrata unificada.
A decisão de McCarthy de apoiar o impeachment pode ser vista como uma tentativa de obter o favor dos republicanos de direita na Câmara, na preparação para as futuras batalhas orçamentais.
Essa estratégia traz riscos, no entanto. Os republicanos centristas em distritos competitivos expressaram desconforto com uma pressão agressiva de impeachment, preocupados com a possibilidade de alienar os eleitores independentes e moderados que os levaram à vitória – e entregaram a maioria na Câmara ao seu partido.
Os democratas apontam que McCarthy criticou duramente a líder democrata Nancy Pelosi em 2019, quando esta anunciou um inquérito de impeachment contra Trump sem realizar uma votação formal.
Ela daria esse passo pouco mais de um mês depois.
Embora McCarthy tenha apenas dito que está aprovando um inquérito de impeachment neste momento, aumentará a pressão para uma votação de autorização formal na Câmara para definir as regras para as audiências de impeachment.
Tal votação colocaria esses centristas em evidência – e forneceria combustível para os ataques democratas durante as eleições gerais de Novembro de 2024.
No entanto, esse será um problema do próximo ano para McCarthy. No momento, ele está tentando impedir que membros conservadores indisciplinados do Congresso se rebelem abertamente – e forçando uma votação sobre a possibilidade de removê-lo de seu cargo de liderança.
Esse movimento relacionado ao impeachment poderia conceder a ele um espaço político para sobreviver aos próximos meses.