O governo da Guiana disse que permanecerá "atento" depois que os venezuelanos votaram, em um referendo no último domingo (3/12), a favor da reivindicação da região de Essequibo.
Essequibo — também conhecido como Guiana Essequiba — é um território a oeste do rio Essequibo, no norte da América do Sul, que compreende 159 mil quilômetros quadrados. A área é rica em recursos naturais e florestais e disputada entre a Venezuela e a Guiana.
"Devemos permanecer sempre atentos", disse o ministro das Relações Exteriores da Guiana, Hugh Todd, à agência de notícias AFP após o referendo.
“É claro que nosso monitoramento deve ser sempre de alto nível. Embora não acreditemos que o presidente (Nicolás) Maduro ordene uma invasão, ele pode fazer algo que é imprevisível”, acrescentou.
Anteriormente, no dia da votação, o presidente da Guiana, Irfaan Ali, explicou em entrevista ao programa Newshour da BBC que leva a sério a retórica e a atitude das autoridades venezuelanas sobre o assunto - que, segundo ele, não tem sido positiva.
“A segunda questão tem a ver com comportamento imprudente e aventureiro. Este tipo de retórica e o referendo podem levar a muitas circunstâncias, pessoas agindo por conta própria, alimentando sentimentos públicos sobre uma questão em torno da qual se está tentando criar um conflito”, disse.
Irfaan Ali também pediu a Cuba que exorte a Venezuela a garantir que a região continue sendo uma zona de paz, segundo reportagens do jornal local Stabroek News.
O Conselho Nacional Eleitoral (CNE) havia afirmado inicialmente que foram contabilizados 10.554.320 votos, sem esclarecer se correspondiam ao mesmo número de eleitores ou se eram contados como 5 votos por eleitor em referência às 5 diferentes perguntas.
Mas nesta segunda-feira (4/12), o presidente da CNE, Elvis Amoroso, explicou que mais de 10,4 milhões dos 20,7 milhões de eleitores elegíveis votaram na consulta popular.
Após reações negativas de outros países, incluindo os EUA, Maduro declarou que o assunto deve ser resolvido sem interferência externa.
"Estados Unidos, eu aconselho, (fiquem) longe daqui. Deixem que a Guiana e a Venezuela resolvam este assunto em paz", declarou.
A disputa legal
A Venezuela defende há décadas a sua reivindicação territorial sobre Essequibo, uma área onde vivem 125 mil dos 800 mil habitantes da Guiana.
Há uma disputa em curso entre os dois países perante o Tribunal Internacional de Justiça (CIJ) em Haia para definir as fronteiras bilaterais nessa área.
A Guiana, uma antiga colônia britânica e holandesa, insiste que as fronteiras foram estabelecidas pela chamada Sentença Arbitral de Paris em 1899.
No entanto, a Venezuela não reconhece a jurisdição da CIJ na matéria e sustenta que o rio Essequibo, a leste da região, forma uma fronteira natural historicamente reconhecida.
A disputa se intensificou desde que a petroleira ExxonMobil descobriu petróleo em Essequibo em 2015.
Caracas convocou o referendo depois que o governo de Georgetown começou a leiloar contratos de exploração em Essequibo em agosto.
Todd disse à AFP que a Guiana manterá a cooperação em defesa com os Estados Unidos e outros parceiros estratégicos e continuará os esforços diplomáticos para persuadir a Venezuela a permitir que a CIJ tome a decisão final.
“Já deixamos claro que cumpriremos a decisão do tribunal”, disse o ministro guianense. A Guiana já havia solicitado à CIJ que bloqueasse a votação.
Embora o tribunal tenha instado Caracas a não tomar quaisquer medidas que pudessem afetar o território disputado, não atendeu ao pedido de intervenção urgente de Georgetown.
A Guiana disse que o referendo representa uma ameaça “existencial” ao país, pois pode abrir caminho para a Venezuela assumir o controle “unilateral e ilegal” da região.
Sobre o que era o referendo?
Os eleitores venezuelanos foram questionados sobre cinco questões no referendo, incluindo se a Venezuela deveria ou não rejeitar a decisão de arbitragem de 1899 e a jurisdição da CIJ.
Eles também foram consultados sobre se a cidadania venezuelana deveria ou não ser concedida ao povo (atualmente guianense) do novo “Estado Guiana Essequiba”.
O governo Maduro lançou uma campanha massiva para fazer com que os venezuelanos votassem a favor, ainda que não tivesse opositores na questão.
Porém, a contagem inicial dos resultados foi questionada por políticos e analistas da oposição, que alertaram para a possibilidade de as respostas dos eleitores a cada uma das cinco questões do referendo serem contadas como votos expressos separadamente.
A baixa participação dos eleitores nas assembleias de voto em Caracas e outras cidades gerou dúvidas.
A cifra de 10,5 milhões anunciada por Amoroso é a maior participação já registada em uma eleição venezuelana. O presidente classificou o feito como uma “vitória esmagadora”.
“Demos os primeiros passos de uma nova etapa histórica na luta pelo que nos pertence, para recuperar o que os libertadores nos deixaram”, afirmou.