Do kibbutz de Kfar Aza, a apenas 2km da Faixa de Gaza, Alon Lulu Shamriz, 26 anos, enviou uma mensagem para o irmão, Jonathan, às 9h59 daquele 7 de outubro. "O Hamas está entrando em minha casa. Por favor, avise a todos", escreveu. Jonathan respondeu: "Fique quieto, amamos você". Mais de 150 extremistas do grupo palestino Hamas invadiram a residência de Alon e o levaram como refém. Também em Kfar Aza, Yotam Haim, 28, um músico aficcionado pela banda de rock Megadeth, conversou com os pais 45 minutos depois de Alon e contou-lhes que a casa tinha sido queimada. Ao abrir a janela para tomar ar, foi capturado pelo Hamas. Samer Fouad Al-Talalka, 25, trabalhava com o pai em uma granja de frangos quando acabou ferido pelo Hamas. Os destinos de Alon, Yotam e Samer tiveram um desfecho trágico e inesperado na Faixa de Gaza. Os três foram mortos, por engano, pelos soldados de seu próprio país.
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Em comunicado à imprensa, as Forças de Defesa de Israel (IDF) confirmaram que, durante combate em Shejaiya, na Cidade de Gaza, os soldados "erroneamente identificaram três reféns israelenses como uma ameaça". "Como resultado, as tropas dispararam contra o trio e eles morreram. (...) Os seus corpos foram transferidos para território israelense para exame, quando confirmou tratarem-se de três reféns israelenses", afirma a nota. Os restos mortais foram levados para o Centro Hatzvi, no acampamento militar Shura, no centro de Israel, onde tiveram as identidades confirmadas.
"As IDF começaram a revisar o incidente imediatamente e enfatizam que essa é uma zona de combate ativo, na qual ocorreram combates contínuos nos últimos dias. Lições imediatas foram aprendidas do evento e transmitidas a todas as tropas no terreno", acrescentou o comunicado. O Exército de Israel também expressou "profundo remorso" pelo "trágico incidente" e enviou "as mais sinceras condolências" aos familiares. "Nossa missão nacional é localizar os desaparecidos e trazer todos os reféns para casa", conclui o texto. O Correio entrou em contato com dois porta-vozes das IDF, mas eles não quiseram se pronunciar.
Por meio da rede social X, o premiê Benjamin Netanyahu comentou o incidente e classificou-o de "tragédia insuportável". "Com toda a nação de Israel, inclino minha cabeça, em profunda tristeza, e lamento a queda de três dos nossos queridos filhos que foram raptados. Essa é uma tragédia insuportável. Todo o Estado de Israel lamentará esta noite. Meu coração está com as famílias enlutadas em seus momentos difíceis", escreveu. "Enalteço os nossos bravos guerreiros, na sagrada missão de devolver nossos sequestrados, mesmo ao custo de suas vidas. Nessa noite difícil, curaremos as nossas feridas, aprenderemos as lições e seguiremos no esforço supremo de devolver os nossos sequestrados para casa, em segurança."
Em 5 de novembro passado, Avraham Lulu Shamriz, 61, pai de Alon Shamriz, concedeu uma entrevista ao Correio. "Alon é um cara duro. Ele confiava que as IDF viriam em minutos para resgatá-lo. Eu tenho a mesma confiança nas IDF", disse, na ocasião. A Casa Branca afirmou que a morte dos três reféns é um "erro trágico". "Não temos uma visibilidade perfeita de como exatamente essa operação ocorreu e como esse erro trágico foi cometido", disse o porta-voz John Kirby.
Efeitos políticos
Ely Karmon — pesquisador do Instituto Internacional para Contraterrorismo (ICR), em Herzlyia — descarta consequências políticas imediatas, além da intensificação dos protestos por parte das famílias e do pedido por uma rápida investigação sobre o caso. "Isso colocará pressão sobre o gabinete de Netanyahu para encontrar novas formas de se chegar a um acordo com o Hamas para liberar mais reféns. Mas, não vai deter as operações militares, à medida que a opinião pública está ciente de que as coisas ocorrem em condições difíceis da guerra urbana em Gaza", explicou à reportagem.
Nesta sexta-feira (15/12), um jornalista da emissora Al-Jazeera, do Catar, morreu em um bombardeio em Gaza e outro ficou ferido. "Compartilhamos com grande pesar a devastadora notícia da perda de nosso dedicado cinegrafista da Al-Jazeera Samer Abu Daqa", escreveu Mohamed Moawad, redator-chefe da emissora. A Al Jazeera havia informado que o chefe de sua sucursal em Gaza, Wael Dahdouh, e Abu Daqa, tinham ficado feridos em uma escola de Khan Yunis (sul). "Acreditamos ter sido um ataque israelense com drone."