Justiça

Licença-paternidade no Brasil é 'limitada' e rever prazo é 'mais urgente do que nunca', diz diretor da OIT

STF decidiu dar prazo para que o Congresso legisle sobre a questão após considerar que houve omissão do Legislativo

STF julga se deve estabelecer um prazo para que o Congresso analise licença-paternidade -  (crédito: Getty Images)
STF julga se deve estabelecer um prazo para que o Congresso analise licença-paternidade - (crédito: Getty Images)
BBC
Laís Alegretti - Da BBC News Brasil em Londres
postado em 14/12/2023 16:50 / atualizado em 15/12/2023 00:47

A licença-paternidade de cinco dias prevista no Brasil é uma regra "limitada" e a revisão desse prazo previsto na Constituição há 35 anos é "mais urgente do que nunca", na avaliação do diretor do escritório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) para o Brasil, Vinicius Pinheiro.

"Comparada aos padrões internacionais, é uma regra muito limitada. As regras de licença-maternidade e paternidade hoje jogam as tarefas de cuidado sobretudo sobre as mulheres, geram um desequilíbrio em relação à distribuição das tarefas de cuidados", disse Pinheiro, em entrevista à BBC News Brasil.

A regra da licença-paternidade foi alvo de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quinta-feira (14/12). Os ministros estabeleceram um prazo para que os parlamentares analisem esse tema.

Uma ação direta de inconstitucionalidade apresentada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS) argumentava que houve omissão do Congresso ao não ter feito uma lei sobre licença-paternidade, embora a Constituição preveja cinco dias de licença até que uma lei específica.

O plenário do STF decidiu dar um prazo de 18 meses para que o Congresso Nacional edite lei sobre a matéria.

Da forma como funciona hoje no Brasil, além do prazo geral de cinco dias para a licença-paternidade, as empresas filiadas ao Programa Empresa Cidadã concedem mais 15 dias, totalizando 20 dias de licença-paternidade – em troca, elas têm benefícios fiscais concedidos pela Receita Federal.

Para Vinicius Pinheiro, as mudanças que ocorreram na sociedade nos últimos 35 anos, "com a necessidade de uma participação maior da mulher no mercado de trabalho, pressionam por uma urgência ainda maior a necessidade de regulação desse tema".

"Vejo isso como mais urgente do que nunca e como mais relevante do que era na Constituição de 1988", disse.

Líder da OIT no Brasil, ele diz que a diferença de participação de mulheres (55%) e de homens (75%, segundo o IBGE) no mercado de trabalho brasileiro é, em grande parte, "explicada pela sobrecarga de trabalho relacionada à economia do cuidado".

Licença-paternidade no mundo: média de nove dias

A duração média de licença-paternidade no mundo é de nove dias, segundo levantamento da OIT. Ao mesmo tempo, a licença para mães tem uma média de 18 semanas.

Os dados, divulgados em 2022, mostram que 115 de 185 países oferecem direito à licença-paternidade. São quatro a cada 10 homens em idade reprodutiva vivendo em países com esse benefício. E apenas um em 10 homens que vivem em países com pelo menos 10 dias de licença.

Pinheiro diz que é observada no mundo uma "tendência de aumento" do prazo de licença para pais. De 2011 a 2021, 16 países com licença-paternidade aumentaram a duração, segundo o mesmo levantamento.

Chile, Zambia, Nicarágua, Timor Leste e Vietnã estão entre os países que aparecem no levantamento junto ao Brasil, ao prever 5 dias de licença-paternidade.

Pinheiro também destaca que, mesmo nos países com o benefício previsto, alguns ficam de fora, como trabalhadores autônomos. A OIT também aponta que um número crescente de países e empresas estão adotando medidas para promover os direitos das pessoas LGBTIQ+.

Nova regra de licença-paternidade?

Pinheiro menciona o prazo de 20 dias, hoje em vigor no Brasil para as empresas que aderiram ao Programa Empresa Cidadã, como base para a eventual discussão sobre um novo prazo de licença.

Ele sugere "começar com 20 dias e com uma perspectiva de aumentar gradualmente".

"Você não pode chegar do dia para noite e esperar que todo mundo vai estar pronto. Seria uma inserção gradual, com base no que já existe."

O desafio, diz ele, é encontrar uma forma equilibrada de financiar o benefício, entre o que seria obrigação da empresa e os financiamentos do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), para que a licença-paternidade seja remunerada, como funciona hoje.

Quando o valor é inferior ao salário, isso "desencoraja" o uso da licença, diz Pinheiro.

"Esse sistema tem que ser desenhado de forma sustentável – sem onerar demasiadamente as empresas, de forma que possam absorver esse tipo de benefício e entender que é um estímulo à produtividade."

"Se você tem uma família bem estruturada, trabalhadores com bom equilíbrio pessoal e profissional, isso pode também ter um impacto positivo em aumento da produtividade, mas isso não é automático."

Ao defender a discussão sobre aumento da licença deve ser feita, Pinheiro destaca que o aumento do prazo "ajuda o maior equilíbrio das responsabilidades familiares e profissionais, não sobrecarregando tanto a mulher e fazendo com que haja divisão do trabalho".

"A mudança que tem que começar em casa – se você quer aumentar a participação da mulher no mercado de trabalho, é importante a presença masculina nas atividades domésticas", disse.

Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Ícone do whatsapp
Ícone do telegram

Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores pelo e-mail sredat.df@dabr.com.br

-->