De maioria chavista, a Assembleia Nacional da Venezuela atendeu ao apelo do presidente, Nicolás Maduro, e aprovou, de forma unânime e em primeira discussão, o projeto de Lei Orgânica para a criação da província do Essequibo, em território da Guiana rico em petróleo. "Esperamos que o texto seja sancionado em uma semana", declarou Jorge Rodríguez, líder do Parlamento. Na terça-feira (5/12), Maduro exibiu um mapa com a incorporação do Essequibo ao território venezuelano. Os chanceleres Yván Gil (Venezuela) e Hugh Todd (Guiana) conversaram por telefone e acordaram manter "canais de comunicação abertos". O governo de Maduro reiterou que informou à Guiana sobre a "participação esmagadora" no referendo do último domingo sobre a anexação do Essequibo, "gerando um mandato inapelável". Um incidente elevou a tensão, na noite desta quarta-feira (6): um helicóptero do Exército da Guiana com sete pessoas a bordo desapareceu a 30 milhas (45km) da fronteira com a Venezuela. Fontes militares relataram que "o tempo estava ruim" e nada sugere o envolvimento de Caracas.
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Por sua vez, o Exército brasileiro decidiu ampliar o contingente militar na fronteira com os dois países. Na terça-feira, Maduro ordenou à estatal de petróleo PDVSA que inicie a concessão de licenças para exploração de petróleo, gás e minerais no Essequibo. O presidente guianense, Irfaan Ali, denunciou uma "ameaça direta" ao seu país e avisou que levará a crise ao Conselho de Segurança da ONU.
O procurador-geral da Venezuela, Tarek William Saab, emitiu uma ordem de captura contra 13 líderes da oposição, sob a acusação de terem recebido dinheiro de "forças transnacionais", como a petroleira Exxon Mobil, para sabotar o referendo do último domingo. Entre eles, estão Juan Guaidó, Leopoldo López, Carlos Vecchio, Julio Borges e Yon Goicochea, além de três dos principais assessores de María Corina Machado, vencedora das primárias para disputar as eleições de 2024: Henry Alviárez, Claudia Macero e Pedro Urruchurtu.
A Casa Branca informou que os EUA esperam que a disputa entre Venezuela e Guiana não degenere em "violência", nem em "conflito". "Obviamente, não queremos que ocorra violência, nem conflito entre as partes", declarou o porta-voz do Conselho de Segurança Nacional, John Kirby. Cientista político da Universidad Central de Venezuela (UCV), Juan Vicente Carrasquero Aumaitre admitiu à reportagem que "o regime de Maduro entrou em uma fase de ações desesperadas". "Inventar os votos no domingo, aprovar a lei e ordenar a captura de opositores são um laboratório fabricado pelo chavismo para reanimar a base eleitoral, hoje dispersa, e criar uma situação de conflito para forçar concessão da Guiana", explicou.
Distração
Um dos alvos da ordem de captura expedida pelo Ministério Público, o economista Leopoldo López — ex-preso político entre 2014 e 2017 e ex-prefeito do município de Chacao — afirmou ao Correio que o regime de Maduro usa a perseguição a opositores e a crise diplomática com a Guiana para desviar o foco da opinião pública das eleições presidenciais de 2024. "Maduro fez tudo isso para criar condições para a não realização do processo eleitoral. Essa ordem de captura não me surpreende. No meu caso, é a décima. O mais relevante é a inclusão de assessores da candidata María Corina Machado. A ditadura busca desativar a equipe de María Corina e começar uma perseguição", comentou.
López acredita que a manobra do Palácio de Miraflores terá implicações. "A ditadura de Maduro firmou os Acordos de Barbados, comprometendo-se a não fazer mais prisões arbitrárias. Um dos nomes que constam na ordem de captura é o de Léster Toledo, um dos membros da mesa de negociação", lembrou. O líder opositor reconhece que o território de Essequibo é reclamado por Caracas. "Nós temos razões históricas, legais e morais para reclamar o reconhecimento dessa área. É um tema sem solução há mais de um século. No entanto, o impulso dado por Maduro a esse processo nada tem a ver com o Essequibo. Trata-se de uma medida de distração da eleição", salientou López, exilado em Madri.
Outro opositor que teve a prisão solicitada, o advogado e especialista em direito energético Yon Goicochea soube da inclusão de seu nome na lista quando jantava em um restaurante, em Madri. "Tomei conhecimento pelo Twitter. Há risco de que Maduro queira aumentar a tensão com a Guiana para sabotar as eleições. Ele tem muito menos medo de um conflito com a Guiana do que das urnas", disse ao Correio o preso político por 15 meses. "A consulta popular foi o primeiro ato da campanha de Maduro. A crise com a Guiana pode ser a desculpa para suspender as eleições", alertou.
TRÊS PERGUNTAS PARA...
JUAN GUAIDÓ, ex-presidente autoproclamado da Venezuela entre 2019 e 2022. Líder do partido Voluntad Popular
Como vê a ordem de detenção contra o senhor e 12 líderes da oposição?
Mais importante do que a ordem de detenção é a esquemática perseguição à alternativa democrática na Venezuela. Neste caso, aos dirigentes da equipe de María Corina Machado. Isso é um esquema não apenas de propaganda, mas de perseguição sistemática à alternativa democrática na Venezuela. Qualquer outro argumento adicional simplesmente é fazer eco às mentiras da ditadura.
Por qual motivo Maduro tensiona a crise com a Guiana?
Maduro tratar de desviar a atenção com o que tem sido uma crise com a Guiana. A Venezuela tem uma reivindicação histórica sobre o Essequibo. Maduro aproveitou-se disso para tentar mudar o foco. Ele ataca neste momento devido ao êxito das primárias da oposição e ao pracasso de sua convocação de um suposto referendo no domingo.
Há o risco real de Maduro perder as eleições de 2024?
Ele sabe bem que não tem nenhum tipo de respaldo popular. Sabe da insatisfação que existe, inclusive, dentro das Forças Armadas. Por isso, ele fará o possível para se aferrar ao poder, inclusive escalar um conflito com a Guiana, mesmo entendendo que a Venezuela encontra-se em situação muito vulnerável. (RC)
EU ACHO...
"Maduro busca criar as condições para suspender as eleições de 2024 e incitar um conflito internacional que lhe permita impôr restrições às garantias constitucionais. Temos insistido que a justa reclamação pelo território de Essequibo tem que ser feita de acordo com o direito internacional. Vale lembrar que Hugo Chávez foi o primeiro presidente, em mais de 100 anos, a conceder à Guiana o reconhecimento do Essequibo. Em 2004, influeciado por Fidel Castro, Chávez deu luz verde à Guiana para que desenvolvesse atividades econômicas em Essequibo. Durante toda a sua presidência, Maduro foi negligente e irresponsável na defesa desse território."
Leopoldo López, ex-preso político, líder do partido Voluntad Popular e alvo da ordem de captura
"Maduro traz o tema do Essequibo, nesse nomento, sem nenhuma justificativa, quando foi ele quem mais deu passos para prejudicar a posição da Venezuela em relação à província. Tem muito mais medo de perder o poder pelas vias eleitorais do que de uma escaramuça com a Guiana. Ao lançar um discurso patriótico e criar um inimigo externo, tenta resolver um problema interno que o aflige. O chavismo cumpriu um papel muito triste na defesa do Essequibo. As acusações da Procuradoria-Geral são ridículos e um despropósito. O regime emitiu a ordem de prisão porque somos os poucos que se pronunciaram contra o referendo."
Yon Goicochea, líder opositor, ex-preso político e advogado especialista em direito energético