Duas crateras abertas no campo de refugiados de Jabalia, pelo menos 50 mortos e cerca de 150 feridos. As Forças de Defesa de Israel (IDF) bombardearam uma das regiões mais densamente povoadas do planeta, onde 49 mil palestinos se amontoam em uma área de apenas 1,4 quilômetro quadrado. "Aviões de guerra, guiados pela inteligência do Shin Bet (serviço de segurança israelense), mataram Ibrahim Biari comandante do batalhão central Jabalia da organização terrorista Hamas. Ele foi um dos líderes do ataque terrorista assassino de 7 de outubro", anunciaram as IDF, por meio da rede social X. O Exército isrelense assegura que operou em uma "fortaleza usada para o treinamento e a execução de atividades terroristas".
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A guerra contra o Hamas abriu uma terceira frente de batalha. Depois de lançamentos de foguetes da milícia xiita libanesa Hezbollah, na fronteira norte israelense, e em meio aos combates na Faixa de Gaza, rebeldes huthis baseados no Iêmen dispararam mísseis contra o balneário de Eilat, às margens do Mar Vermelho, no extremo sul de Israel. Os artefatos foram interceptados pela defesa antiaérea.
No norte de Gaza, enquanto soldados da Shaldag (tropa de elite da Força Aérea de Israel) e da unidade tática 669 avançavam pelo território, dois militares israelenses foram mortos durante combates com o Hamas: os sargentos Roei Wolf, 20 anos, e Lavi Lipshitz, de mesma idade. São as primeiras baixas de Israel no campo de batalha.
Feridos
Em 25 dias de guerra, mais de 8.530 palestinos morreram em Gaza, segundo o Ministério da Saúde controlado pelo Hamas. Do lado israelense, foram 1.402 mortos — 1.400 nos atentados de 7 de outubro e dois soldados, nos combates de ontem. Em um desdobramento importante, as autoridades egípcias se preparam para receber feridos palestinos no sul de Gaza, nesta quarta-feira (31). "Equipes médicas estarão presentes amanhã (hoje) na passagem (de Rafah) para examinar os casos procedentes (de Gaza) desde sua chegada (...) e determinar os hospitais para onde serão enviados", disse à agência de notícias France Presse um encarregado médico da cidade egípcia de Al Arish.
O secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, classificou como "completamente inadequada" a ajuda humanitária que tem entrado no enclave palestino de 2,4 milhões de habitantes. "Eu reitero meu apelo pelo cessar-fogo humanitário imediato e pela concessão de acesso desimpedido, de forma consistente, segura e em grande escala", escreveu na rede social X.
Em novo vídeo divulgado pelas Brigadas Ezzedin Al Qassam, Abu Obeida, porta-voz do braço armado do Hamas, avisou que a Faixa de Gaza se tornará um "cemitério" para o Exército israelense e prometeu impor ao premiê Benjamin Netanyahu uma derrota que "colocará fim à sua carreira política". "Gaza será um cemitério e um atoleiro para o inimigo, seus soldados e sua direção política e militar", avisou. Ao mesmo tempo, Obeida anunciou que o Hamas libertará "nos próximos dias" alguns dos reféns estrangeiros, entre os 239 sequestrados pelos extremistas, em 7 de outubro.
Ali Barakeh, chefe do Departamento de Relações Nacionais do Hamas, acusou Netanyahu de fugir da responsabilidade de libertar os reféns israelenses, ao adiar a conclusão de uma troca por prisioneiros palestinos. "Ele está em busca de uma vitória na ofensiva terrestre, mas fracassou até agora. Dizemos-lhe que a opção militar não trará segurança e liberdade aos prisioneiros, mas poderá até levar ao assassinato de prisioneiros devido a ataques aéreos direcionados. Tudo na Faixa de Gaza", advertiu, em entrevista ao Correio. "Nós queremos esvaziar as prisões israelenses e liberar todos os prisioneiros palestinos, em troca de todos os prisioneiros (reféns) israelenses e estrangeiros em Gaza."
"Solidariedade"
Também por meio de vídeo, Yahya Sari'a, porta-voz dos rebeldes huthis, no Iêmen, admitiu que suas forças armadas "lançaram uma barragem de mísseis balísticos e de cruzeiro, e vários drones, sobre muitas posições israelenses nos territórios ocupados". "Essa operação é a terceira do tipo, em solidariedade com nossos irmãos da Palestina. Nós garantimos a continuação dessas operações, até que a agressão israelense pare."
Especialista em Oriente Médio pela Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, o iemenita Asher Orkaby explicou ao Correio que os huthis estão mais interessados na política de seu país do que em atacar Israel. "O discurso de Sari'a é um esforço de relações públicas voltado para uma parcela da população vocalmente contrária a Israel. Os huthis anunciaram, publicamente ao mundo, que são oficialmente uma milícia iraniana, nos moldes do Hezbollah e do Hamas", disse.
Orkaby acrescentou que a maior ameaça ao Estado israelense e ao Oriente Médio está na habilidade dos huthis de alvejarem navios a partir do Estreito de Bab al-Mandab, que separa a Ásia e a África. "Representantes iranianos em toda a região — a Síria, do presidente Bashar Al-Assad; o Hezbollah; o Hama; os huthis e as milícias xiitas no Iraque — foram armados e apoiados com o único propósito de desestabilizar Estados", advertiu o estudioso de Harvard.
DEPOIMENTO
"Nosso hospital será um túmulo coletivo"
Por Ghassan Abu-Sittah
"Algumas vezes, sinto que o mundo se abriu e engoliu Gaza. Esse pesadelo interminável tem se arrastado por três semanas. Mais de 8 mil pessoas morreram e 2 mil estão sob os escombros. Dos 21 mil feridos, 7 mil são crianças. Do total de mortos, 3.250 são meninos e meninas. O que conhecíamos como vida, em Gaza, parou.
Trabalho no Hospital Al Shifa, na Cidade de Gaza. Cerca de 50 mil pessoas buscaram refúgio no complexo de nosso hospital. Temos capacidade para 600 ou 700 leitos; há mais de 2 mil feridos. Como resultado do tsunami de feridos, tudo está em falta no hospital. Coisas simples, como antissépticos, lâminas e suprimentos médicos.
As pessoas que trabalham no hospital estão esgotadas. Muitos colegas morreram em bombardeios, que ocorrem com uma frequência inexplicável. A habilidade de nos doarmos tem diminuído. Estamos nos aproximando do fim do combustível. Sem eletricidade, o hospital se tornará um túmulo coletivo."
Cirurgião plástico, médico do Médicos sem Fronteiras no Hospital Al Shifa. Depoimento ao Correio, por telefone