Ela esteve ao lado dele em cada momento da campanha presidencial. E neste domingo, quando foi anunciado que Javier Milei havia alcançado uma vitória contundente sobre Sergio Massa no segundo turno, foi ela, sua irmã Karina, quem o apresentou a uma multidão que aguardava ansiosamente para ouvir seu primeiro discurso como presidente eleito.
Visivelmente emocionada, abraçou seu irmão, e ambos saudaram a plateia do palco, onde os seguidores gritavam "liberdade, liberdade, liberdade". Fiel ao seu perfil discreto, ela não disse muito mais. Sabe-se pouco sobre sua vida, e é difícil ter acesso a ela.
Mas aqueles que conhecem Milei dizem que ela é a "grande arquiteta" por trás do projeto do libertário antissistema. Ela é sua principal estrategista, conselheira e a figura central de seu agrupamento político, La Libertad Avanza.
Javier Milei, que é solteiro e namora uma atriz, a chama de "O Chefe" (no masculino) e repetiu várias vezes que "sem ela, nada disso existiria". Na BBC Mundo, contamos três fatos sobre ela.
1. A 'arquiteta' do fenômeno Milei
Karina Milei é a única irmã do economista libertário. Ela é dois anos e meio mais nova que ele (ela tem 50 anos e ele, 53).
Cresceram no bairro de Villa Devoto, na cidade de Buenos Aires, em uma família de classe média.
Seu pai, Norberto, era motorista de ônibus, e sua mãe, Alicia, dona de casa. Frequentaram o ensino fundamental e médio no Instituto Cardenal Copello, uma instituição de ensino católica, e desde crianças tiveram uma relação muito próxima.
Suas vidas se entrelaçaram no ambiente profissional há mais de uma década, quando ela decidiu começar a trabalhar com ele durante suas palestras como economista.
Há quase três anos, Karina Milei está totalmente dedicada à carreira política de seu irmão e ao fortalecimento de La Libertad Avanza, a coalizão fundada em 2021 e com a qual Javier Milei chegou ao poder.
De acordo com Juan Luis González, jornalista e autor de El Loco, la vida desconocida de Javier Milei y su irrupción en la política argentina (O Louco, a vida desconhecida de Javier MJilei e sua irrupção na política argentina), ela é quem está por trás da maioria das decisões tomadas pelo presidente eleito.
"Em qualquer outro partido, os assuntos que Karina monopoliza são divididos entre sete ou oito pessoas. A agenda, as alianças, com qual jornalista Milei fala e com quem não, quem entra no bunker, quem tem acesso à intimidade de Javier Milei e quem não tem", disse à BBC Mundo. "Ela é quem tem a palavra final", acrescenta.
O próprio Javier Milei reconheceu que "presta contas" à irmã. E ela, em uma de suas raras aparições públicas, disse que ele "é muito aplicado e obedece".
Karina Milei também é a mentora de ideias consideradas bem-sucedidas entre os seguidores do próximo presidente, como o sorteio do salário que recebia como deputado ou as aulas públicas de economia que percorreram o país.
"Para ele, Karina é muito importante, é quem o sustenta, conduz e incentiva. E diz a ele o que deve fazer", explica o cientista político argentino José Natanson, autor de Por qué? La rápida agonía de la Argentina kirchnerista y la brutal eficacia de una nueva derecha (Por quê? A rápida agonia da Argentina kirchnerista e a brutal eficácia da noba direita). No entanto, antes de tudo isso acontecer, Karina Milei era uma pessoa alheia à política.
Formada em Relações Públicas pela Universidade Argentina de la Empresa (UADE), ela se dedicava aos seus negócios (teve uma oficina de conserto de pneus e uma confeitaria) e à arte.
"É impressionante o crescimento de Karina Milei. Há 2 anos e 8 meses, ela nunca havia se envolvido com política. Hoje, ela diz a todos: se quiserem fazer parte deste espaço, já sabem a quem ligar", afirma Juan Luis González.
2. Sua protetora na infância
Para os analistas, o papel crucial que Karina Milei desempenha hoje na vida e na carreira política de seu irmão pode ser parcialmente explicado por seu papel de apoio no passado. Javier Milei já compartilhou publicamente que teve uma infância e adolescência muito difíceis, e a companhia de sua irmã foi essencial nesse período.
Ela sempre o apoiou e foi sua maior torcedora quando ele era goleiro no Club Atlético Chacarita Juniors, da segunda divisão do futebol argentino.
Além disso, Karina foi fundamental na conturbada relação do presidente eleito com seus pais, a quem ele criticou severamente, alegando ter sofrido abuso físico e psicológico.
Em uma entrevista com o jornalista Agustín Gallardo realizada há cinco anos, Milei lembrou que, aos 11 anos, expressou ao pai que achava "um delírio" a decisão do governo de Leopoldo Galtieri de anunciar o desembarque de tropas argentinas nas Ilhas Malvinas/Falklands, sob controle do Reino Unido.
"Meu pai teve um acesso de fúria. Começou a me bater com socos e pontapés. Ele continuou me chutando por toda a extensão da cozinha", afirmou Milei.
"Quando cresci, ele parou de me bater para infligir violência psicológica", relatou. "Sempre me disse que eu era um lixo, que morreria de fome, que seria um inútil".
Entre 2010 e 2020, Javier Milei rompeu relações com seus pais e, segundo o jornalista Juan Luis González, foi Karina quem conseguiu reconciliá-los antes da pandemia.
"Milei tem uma vida muito complexa, com um pai que o agredia, com uma mãe cruel, sem amigos... a única pessoa que esteve ao seu lado a vida toda é Karina Milei", explica González.
Uma visão semelhante é compartilhada pelo cientista político José Natanson: "Javier Milei é um cara que está muito sozinho, com um círculo social muito pequeno, teve uma vida pessoal difícil. E a irmã sempre o acompanhou".
O economista libertário não escondeu sua admiração por ela e expressou em várias ocasiões que "ela é o ser humano mais maravilhoso do planeta".
Ainda mais: o presidente eleito comparou o vínculo que os une ao do profeta mais importante para o judaísmo, Moisés, e seu irmão Aarão: "Moisés era um grande líder, mas não um grande comunicador. Deus enviou Aarão para se comunicar. Eu sou para a Kari o que Aarão foi para Moisés".
"Tirei a sorte grande com a Kari. Ela é a protetora. É a grande responsável por isso. Eu sou o comunicador", disse em declarações à Crónica TV.
3. Perfil discreto
Embora seja reconhecida como a "alma" do projeto libertário, é bastante difícil saber o que Karina Milei realmente pensa.
A irmã do "leão" - como seus seguidores a chamam devido à sua juba - raramente concede entrevistas ou costuma falar em eventos públicos.
Também não se relaciona com jornalistas e tem um círculo próximo restrito. Um dos poucos lugares onde fez declarações foi no documentário Javier Milei, a revolução liberal.
Nele, a irmã apresenta algumas ideias que foram fundamentais na campanha do presidente eleito. Entre elas, o cansaço com a política tradicional e sua luta contra a "casta".
"Eles não pensam nas pessoas, acredito que só pensam neles mesmos. Não vejo que tenham empatia com as pessoas. Porque realmente não se importam", ela diz no filme.
Ela também afirma que "admira" o irmão e que quanto mais o criticam, mais ele se fortalece. "
Não sei se muitos sabem, mas Javier é um dos melhores alunos da faculdade (...). Eu admiro meu irmão. O que as pessoas veem em Javier é que ele é genuíno", destaca.
Javier Milei disse que quando eram crianças ela era extrovertida e ele introvertido, mas agora "trocam de papéis". Segundo Juan Luis González, seu baixo perfil também se deve ao fato de que "não é uma pessoa muito ligada ao restante do espaço político; mantém distância".
"Ela é a grande incógnita e merece um livro mais do que Javier Milei", disse o jornalista à BBC Mundo.
A pergunta agora é qual será o papel de Karina Milei na presidência de seu irmão. O presidente eleito sugeriu a ideia de que ela poderia assumir o papel de Primeira Dama. No entanto, para Juan Luis González, ela não precisa de nenhum cargo "para continuar sendo a pessoa mais importante na vida de Javier Milei".
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